As principais tendências do agronegócio moderno, global e sustentável, foram debatidas durantes os dois dias do Fórum de Agricultura da América do Sul, que ocorreu nesta quinta e sexta-feira (6) no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba (PR). Mais de 600 pessoas, de 16 países, acompanharam os 12 painéis, com cerca de 40 palestrantes ao longo do evento. “Tenho certeza que ajudamos com esse fórum a promover um agronegócio moderno e sustentável”, disse Giovani Ferreira, coordenador do Fórum, na cerimônia de encerramento do evento.
A sexta-feira começou com os debates sobre o acordo Mercosul-União Europeia. Para a economista franco-britânica Emily Rees, fundadora da Trade Strategies, o acordo comercial entre os blocos, que ainda precisa ser aprovado pelo Conselho Europeu e pelos parlamentos dos países envolvidos, dará aos países do bloco do Sul, em especial ao Brasil, uma espécie de “passaporte” para outros mercados globais. Segundo a economista, os dois blocos juntos representam 25% do PIB mundial e movimentaram, em 2018, US$ 400 bilhões – somente entre Brasil e Europa.
“A UE é um mercado qualificador, quando você exporta para lá quer dizer que o seu produto tem um ‘selo’ de qualidade e pode ser exportado para o mundo inteiro. É um mercado que abre outros mercados”, sintetizou a economista. Além dela, o painel contou com a participação de Gustavo Cupertino, do Ministério da Agricultura, que mostrou nos últimos anos a participação da Europa na pauta de exportações brasileira vinha sendo reduzida. Por outro lado, reconheceu que as importações do Brasil também devem crescer com o acordo comercial.
Já Maria Noel Ackerman, representante uruguaia do Conselho Agropecuário do Sul (CAS), explicou o papel do Conselho em articular o sistema agropecuário regional e coordenar ações em políticas públicas para o setor. Segundo ela, os países do CAS representam 13% das exportações de base agrária mundial. “Somos importante provedor desses produtos para o mundo”, avaliou. O crescimento das exportações de produtos de base agrária dos países do bloco nos últimos anos se deve principalmente ao crescimento da soja no Brasil. A oleaginosa representa 40% do total exportado pelos membros do CAS.
Agricultura familiar
O mercado exportador de frutas brasileiras deve se ampliar nos próximos anos e o principal beneficiado será o setor de agricultura familiar, segundo Rafael Zavala, representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). “O mercado exigirá menos suco de laranja e mais diversidade, o que vai incluir sucos detox e açaí. Se beneficiam pequenos agricultores e cooperativas”, disse durante sua palestra no 7º Fórum de Agricultura. Zavala ainda ressaltou que a produção de frutas é alta geradora de emprego e que seu desenvolvimento implicará no desenvolvimento do setor no país.
A discussão sobre produção familiar promovida pelo Fórum pautou também o desenvolvimento sustentável. “Segurança e soberania alimentar estão cada vez menos antagônicos, entendeu-se que é preciso aceitar todos os atores dentro do sistema”, reiterou Zavala. Segundo ele, a FAO pretende ampliar o incentivo a alimentos saudáveis em sistemas alimentares sustentáveis para os próximos anos. “Alinhar o comportamento dos consumidores pelas políticas públicas é fundamental. Ainda há muito o que fazer para gerar alimentos sustentáveis em todos os setores”, garantiu.
Também palestrante no painel, o secretário de agricultura e abastecimento de Curitiba, Luiz Gusi, destacou desafios particulares do município e de sua região metropolitana no âmbito da agricultura familiar. O secretário destacou para os próximos anos a construção de polos de produtos regionais, que agreguem valor a produtos que possam promover acesso ao mercado. O principal caso curitibano é a tangerina ponkan, produto que tem apresentado crescimento e vem se firmando como um polo para a pequena produção.
Em tempos em que o uso de tecnologia 4.0 é tido como um dos principais potencializadores para o agronegócio, estima-se que apenas 6% a 9% da agricultura brasileira tenha algum tipo de conectividade. A necessidade de investimento no setor de inovação foi o principal ponto trazido por Silvana Kumura, coordenadora de serviços tecnológicos do Senai, durante sua palestra. “O Brasil pode chegar a um crescimento de 20% na produção agropecuária nos próximos 10 anos somente pela inovação”, garantiu.
Silvana explicou que o uso de tecnologia 4.0 visa ganhos em produtividade, eficiência, retorno financeiro e competitividade. “Precisamos adotar o que nos torna mais inteligentes. O que traz maior produtividade por meio de decisões mais ágeis e assertivas, dados em tempo real, conexões em todas as dimensões, um ambiente mais fértil para inovar”, sugeriu. A coordenadora do Senai disse, ainda, que o país conta com 90 mil torres de conexão na área urbana. O número é muito menor do que o apresentado em países como os Estados Unidos, com 500 mil, e China, com 2 milhões.
Durante o Fórum, a agricultura digital também foi pauta da fala de Débora Marcondes Pereira, da Embrapa Instrumentação, que destacou a importância das startups no ambiente de inserção tecnológica no campo. “É uma nova revolução verde, mas não está vindo por meio de grandes corporações, ela está acontecendo pelas startups”. Débora ainda chamou atenção para a relevância de se valorizar a pesquisa no Brasil: “A ciência é a base de todo o desenvolvimento. É preciso incentivar isso no país. Inovação não é moda, é questão de sobrevivência.”
Integração eleva produtividade de propriedades
Outro tópico importante abordado durante o fórum foi a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). Além dos 70 milhões de hectares ocupados pela agricultura no Brasil, o país tem outros 165 milhões de hectares que são usados pela pecuária, que na média brasileira é pouco eficiente, conforme explicou Luiz Lourenço, representante da Cocamar. Muitas dessas áreas, segundo ele, podem ser usados para uma agricultura mais eficiente e produtiva, um dos pilares da ILPF. “A ILPF é basicamente o uso intensivo do solo coberto, fazendo várias safras. Isso começou com experiencias da Embrapa em estudos de recuperação de áreas de pastagens, com a consolidação dessas tecnologias por volta de 2005”, diz Lourenço.
Uma integração bem conduzida, segundo ele, pode multiplicar o faturamento por hectare em até 10 vezes. A pecuária tradicional, que produz 4 arrobas por hectare/ano (cerca de 15 kg), que é próximo à média brasileira, no modo ILPF pode chegar a até 40 arrobas por hectare/ano, conforme explicou João Pontes, representante da John Deere, empresa participante da Rede ILPF, que envolve inclusive a Embrapa no objetivo de incentivar formas de tornar a propriedade rural mais produtiva, com aumento do sequestro de carbono, melhora da qualidade do solo e multiplicando a receita das fazendas. Atualmente, cerca de 15 milhões de hectares no Brasil funcionam em sistema de integração.
Um case de sucesso apresentado durante o fórum foi o da Fazenda Santa Brígida, de Ipameri (GO), que adotou a ILPF em 2006, passando de -R$ 200 por hectare de faturamento mensal para R$ 3 mil por hectare hoje, com aumento da qualidade dos pastos, da produtividade, do volume de água no lago da propriedade e reduzindo a erosão e a necessidade de desmatamento, de acordo com a proprietária, Marize Porto Costa. “A grande vantagem é a diluição de risco de clima e de mercado: só isso já vale o sistema”, afirma Marize, que além disso elenca a redução de custos com a integração.
Desafio de startups
Durante o evento, também ocorreu o Desafio das Startups, que apresentaram soluções inovadoras para o campo. A vencedora, escolhida pelo público do evento através de um aplicativo, foi a Metha, que ganhou com 92% dos votos. A startup criou um microgerador de energia elétrica, que pode ser instalada em qualquer curso d´água, inclusive pequenos córregos e fornecer energia para abastecer propriedades rurais. A Microcentral Hidrelétrica (MCH) aposta num futuro onde a demanda por energia será alta, e a geração dela será distribuída. Ao todo, 6 empresas competiram.
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