As chuvas foram embora em fevereiro e só devem voltar daqui dois meses. Mesmo assim, após oito meses de seca, o Sertão continua produzindo alimentos e movimentando pequenas agroindústrias na região de Juazeiro (BA). Na primeira parte da viagem pela região, a Expedição Agricultura Familiar verificou que sistemas que aproveitam ao máximo os recursos da caatinga abrem novas perspectivas ao setor.
Associações são embrião de cooperativas
- José Rocher
Agricultores e pecuaristas familiares do Sertão atuam em dezenas de associações, que organizam o trabalho e o acesso ao crédito rural. As duas associações visitadas pela Expedição em Juazeiro possuem área própria para produção de forragem e extração de frutos. Além da propriedade onde vive, cada família associada atua também numa área comunitária.
Esse sistema, apontado como o embrião de cooperativas, tende a assumir novos papeis. As associações atualmente organizam o setor e se responsabilizam pela venda da produção. E é justamente a comercialização que tem pressionado as comunidades a criarem empresas coletivas.
Uma cooperativa teria maior poder de barganha ante os atravessadores e poderia acessar mais facilmente os programas do governo federal que compram alimentos. Essas aquisições, direcionadas à merenda escolar e a programas sociais, abrem mercado decisivo à estruturação na caatinga. (JR)
Lindomar Pereira produz leite e carne de cabra numa propriedade de 70 hectares de sua família. Ele cultiva palma – cacto forrageiro de origem mexicana comum no Nordeste brasileiro – com água de um poço artesiano. Os cerca de 70 animais exigem o cultivo de dois hectares. O corte de palma é diário e o cuidado com os animais, constante. Sem o poço artesiano, a terra não produziria naturalmente alimento para o rebanho
O pecuarista se especializou a ponto de vencer concurso de produção de leite, com a marca de 4,5 litros numa única ordenha. Faz seleção genética dos animais no próprio sítio. Sua meta é ampliar a ordenha, que hoje alcança 20 litros e rende cerca de R$ 50 ao dia.
Indústria
A extração de frutas da caatinga permite a estruturação de agroindústrias na zona rural. O umbu se transforma em polpa, que vira suco, licor e geleia.
Uma pessoa tira até R$ 50 por dia colhendo umbu no campo natural. A renda se multiplica com processamento da fruta. Uma unidade de beneficiamento produz 2 toneladas de polpa/ano, com uma estrutura que custou R$ 100 mil.
“O umbu dá muito produto. Se a gente se organiza, dá para trabalhar o ano todo sem parar”, afirma Raimundo de Lima. A coleta se concentra entre janeiro e fevereiro. Já está faltando matéria-prima neste ano.
Uma saca de 45 quilos rende R$ 10 a R$ 40, dependendo do interesse dos atravessadores. Beneficiado, o alimento rende R$ 160, conforme os agentes do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), que presta assistência técnica e facilita acesso a recursos de programas que apoiam o agricultura na caatinga.
A região, por outro lado, não ignora a importância da água. A produção e a qualidade de vida seriam bem melhores se houvesse, por exemplo, mais recursos para construção de poços artesianos, que custam cerca de R$ 10 mil. O acesso ao crédito e a novos mercados são desafios na caatinga.
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