A falta de água embrutece a vida no Sertão nordestino. Com seca de mais de seis meses todos os anos, o que persiste na Caatinga – ecossistema predominante no Nordeste que corresponde a 10% do território nacional –são cactos e arbustos sem folhas. Mas o semiárido, de um cinza agonizante, agora tem lotes verdes nos dois lados do Rio São Francisco, na Bahia e em Pernambuco. Os projetos de irrigação, idealizados cinco décadas atrás e implantados com mais eficiência nos últimos 20 anos, produzem alimentos tipo exportação apesar de a escassez de chuva já durar três safras. E, se depender das famílias de agricultores que migraram para a região, a produção de frutas para exportação é um caminho sem volta.
Em viagem pelo Nordeste, a Expedição Agricultura Familiar registrou os avanços desses sistemas, bem como a preocupação com a falta de água. Para avançar, é necessário uso de volume menor de água por hectare irrigado, disse o diretor geral da Embrapa Semiárido, Pedro Gama da Silva. “Existem sistemas mais econômicos que os adotados.”
A própria seca levanta o debate sobre a racionalização. Atualmente, é retirada água para produção de alimentos em 120 mil hectares, por meio de bombas e canais. O desafio é ampliar essa área numa época em que o próprio abastecimento das cidades está em risco.
Desde fevereiro as nuvens carregadas atravessam o Vale do São Francisco sem tocar o chão. E isso ocorre também na região da nascente, no Sudoeste de Minas Gerais, colocando em xeque o poder do Velho Chico de levar vida à região mais seca do país. Por enquanto, a irrigação é mantida em frequência suficiente para manter unidades de produção ativas, conferiu a Expedição. E a expectativa é que as chuvas voltem ainda neste ano.
A situação na represa da hidrelétrica de Sobradinho (BA) – a 40 quilômetros de Juazeiro (BA) e de Petrolina (PE), onde estão as principais áreas de produção de frutas irrigadas do Vale do São Francisco – piorou na última semana. O volume de água caiu de 5,6% para 4,5%, conforme o Operador Nacional do Sistema (ONS). É a pior situação registrada no país neste momento. No Rio Iguaçu, esse índice chega a 99%.
Isso torna o desafio de produzir alimentos na região mais difícil. As chuvas se limitam a 400 milímetros por ano, volume que cai em uma única semana chuvosa na Região Sul do país.
“Faz três anos que não chove [expressivamente], mas continuamos investindo”, conta Aldenor de Souza Silva, pernambucano que morou 30 anos no estado de São Paulo e retornou ao Nordeste atraído pela agricultura irrigada. Ele trabalha com a esposa Terezinha e as famílias de seus dois filhos, Cristiano e Adriano, em 5 hectares de mangueiras e 5 de parreiral de uva, ampliado recentemente.
“Agora que estruturamos a produção, a vida melhorou muito. Quando viemos para cá, nossa casa não tinha nem portas”, conta Terezinha.