Na fronteira do Uruguai com a Argentina, o pedágio de R$ 34,00 na ponte Libertador General San Martín é um aviso aos navegantes para preparar o bolso por que, ‘al otro lado del río’, a economia é dolarizada.
A confirmação vem logo em seguida, no posto de combustíveis: gasolina a R$ 7,30 o litro, diesel a R$ 6,00. O engenheiro-agrônomo argentino Axel Fabris, que mora há pouco mais de um ano no Uruguai, dá outros exemplos: “Na Argentina, eu pagava 200 dólares pelo aluguel de um apartamento, aqui, num imóvel parecido, tenho que pagar 600 dólares; o almoço me custava 300 pesos argentinos, enquanto aqui não sai por menos de 600 pesos”.
Na agricultura, algo parecido. “A produção de soja precisa estar sempre acima de 2 mil kg por hectare para cobrir os custos. Como no ano passado, por causa da seca, a média de produção foi de 1200 kg por hectare, a situação dos produtores ficou muito ruim financeiramente. A maioria deles está nas mãos de arrendadores e toma dinheiro no mercado. Da safra atual, boa parte do que deveria cobrir os custos vai para pagar dívidas. Vamos precisar de mais do que um ano bom para superar a situação”, avalia Tomás Mayol, diretor da empresa Solaris, de insumos agropecuários. O sistema de arrendamento de terras predomina em 60% da área de soja plantada no país vizinho, com um custo aproximado de 200 dólares por hectare (contra um custo de produção total de 900 dólares).
O preço alto que se paga para produzir já fez diminuir em 25,9% a área plantada com soja no Uruguai nas últimas cinco temporadas. De 1,33 milhão de hectares em 2014/15 para 989 mil hectares em 2018/19, segundo estatísticas do Ministério da Agricultura do Uruguai (MGAP).
O encolhimento das lavouras é uma tendência que deve continuar no curto prazo, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Depois de uma recuperação na safra 2018/19 – em que se espera uma colheita de 2,7 milhões de toneladas de soja – o USDA prevê que na próxima campanha a produção deverá cair 11%, para 2,4 milhões de toneladas, devido à diminuição de área e de produtividade. Ainda como fatores de desestímulo, estão os preços internacionais da soja mais baixos e o aumento de gastos com fertilizantes e controle de pragas.
Plantio e replantio
No estado de Rio Negro, de vocação agrícola, o administrador da fazenda Maletas, Martin Sellanes, calcula que a soja deverá alcançar nesta temporada uma média de 3 mil kg por hectare, com picos de até 5 mil kg. Ao contrário de algumas regiões do Brasil, que sofreram com a seca na época do plantio, nas terras cultivadas por Sellanes foi a chuva intensa entre outubro e dezembro que causou dificuldades. “Em algumas áreas a rotação com o trigo foi prejudicada, a janela ficou curta porque nós plantamos e tivemos que replantar por causa da chuva. E no fim veio outra chuva forte e cobriu a semente com muita terra”. Apesar das perdas pontuais, o desempenho da safra será bem melhor do que no ano passado. “Em 2017/18, perdemos 700 dólares por hectare. Esperávamos colher pelo menos 2500 kg de soja, mas só colhemos 700 kg por hectare, devido à seca. E o que foi colhido ainda sofreu desconto de 30% porque estava com a qualidade do grão ruim”, aponta Sellanes.
Em relação ao milho, que na fazenda Maletas ocupa um quarto da área de soja no verão e que já foi todo colhido, a produtividade neste ciclo ficou em 7500 kg por hectare. No ano passado tinha sido de apenas 4 mil kg.
Herbicidas, fungicidas e inseticidas, em geral, são mais baratos no Uruguai e aplicados em menor quantidade. Normalmente, os agricultores uruguaios fazem apenas uma aplicação de fungicida, por exemplo, contra uma média de quatro aplicações no Brasil. Mas o controle de pragas daninhas como o Amaranto (Amaranthus palmeri), buva (Conyza bonariensis) e o azevém resistente ao glifosato (Lolium muiltiflorum) está exigindo gastos maiores. “São herbicidas mais novos, desenvolvidos especialmente para combater estas pragas, e por isso acabam saindo mais caro”, sublinha Axel Fabris. O custo atual, por hectare, para controlar as ervas daninhas está em 60 dólares, contra 30 dólares até três ou quatro anos atrás, segundo o USDA.
Quando recebeu a Expedição Safra num campo de soja próximo do município de Fray Bentos, no Departamento de Rio Negro, o engenheiro-agrônomo Sebastián Fernandez assistia a colheitadeira avançar sobre os primeiros talhões desta temporada. Com base no número de plantas e volume de grãos por metro quadrado, ele já estimava uma média de 3500 kg de soja por hectare. Mais do que o dobro dos 1400 kg de média do ano passado. A retomada dos bons índices de produtividade tem também um efeito indesejado. “Hoje a soja do Uruguai está cotada pelo valor de Chicago, menos 32 dólares por tonelada. No Brasil, é Chicago menos 10 dólares por tonelada. Como eles (traders) sabem que a Argentina e o Uruguai vão ter um excedente de produção, estão oferecendo preços baixos”, conclui Fernandez.
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