O leilão milionário do governo Lula realizado através da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a compra de 300 mil toneladas de arroz, na quinta-feira (6), foi vencido por quatro empresas. Dentre elas, apenas uma tem experiência no setor de comércio exterior. As outras três são empresas sem afinidade com a área.
A concorrente que arrematou a maior quantidade de lotes trata-se de uma empresa cuja atividade principal inscrita no CNPJ é “comércio atacadista de leite e laticínio”. A mercearia fica localizada em um bairro de Macapá, capital do Amapá. A empresa especializada na venda de queijos receberá R$ 736,3 milhões do governo para importar 147,3 mil toneladas de arroz.
A mercearia apresenta um capital social de R$ 5 milhões, segundo dados da Receita Federal. Até o dia 24 de maio de 2024, o capital social da empresa era de R$ 80 mil.
A Gazeta do Povo entrou em contato com a empresa questionando a alteração nos dados cadastrais, mas não obteve retorno até o fechamento desta matéria. O jornal permanece aberto para quaisquer manifestações da empresa sobre o tema.
Na Receita Federal, a empresa tem registrado como atividades secundárias: comércio atacadista de frutas, verduras, raízes, tubérculos, hortaliças e legumes frescos; comércio atacadista de carnes bovinas e suínas e derivados; comércio atacadista de artigos de escritório e de papelaria; comércio atacadista de produtos de higiene, limpeza e conservação domiciliar; comércio atacadista de outros equipamentos e artigos de uso pessoal e doméstico não especificados anteriormente e; comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios - minimercados, mercearias e armazéns.
A segunda maior fatia do leilão foi levada por uma empresa que atua na área de comércio exterior desde 2010. A importadora ganhou o direito de vender 73,8 mil toneladas de arroz para o governo a R$ 368,9 milhões.
Em terceiro lugar aparece uma locadora de veículos e máquinas. A empresa ganhará R$ 112,5 milhões com a venda de 22,5 mil toneladas de arroz.
Por último, aparece uma empresa que tem como principal atividade registrada no CNPJ a “fabricação de sucos concentrados de frutas, hortaliças e legumes”. Localizada no município de Tatuí, em São Paulo, a empresa receberá R$ 98,7 milhões pelo repasse de 19,7 mil toneladas de arroz ao governo.
Na Receita Federal, a empresa tem registrado como atividades secundárias: fabricação de conservas de frutas; fabricação de alimentos e pratos prontos; fabricação de sorvetes e outros gelados comestíveis; comércio atacadista de frutas, verduras, raízes, tubérculos, hortaliças e legumes frescos; comércio varejista de produtos alimentícios em geral ou especializado em produtos alimentícios não especificados anteriormente e; comércio atacadista de produtos alimentícios em geral.
Procurada pela Gazeta do Povo, a locadora de veículos e máquinas disse que tem experiência em leilões do governo federal e já cumpriu contrato com a Conab.
"Nossa empresa é de médio porte, classificada pela receita federal como lucro presumido, portanto, não somos microempresa, nem empresa de pequeno porte, com um capital social registrado na junta comercial de R$ 5 milhões. Temos experiência em participar de leilões do governo federal, fomos ganhador do leilão realizado pela Conab em dezembro passado, assinamos contrato vendemos e entregamos para o governo da Bahia, através da CAR, 211 mil sacas de milho. Perfazendo um valor de R$ 19,7 milhões de reais", disse a empresa em nota enviada à Gazeta.
A Gazeta do Povo também entrou em contato com a empresa que ficou em quarto lugar no leilão questionando a sua capacidade de atender a demanda. A empresa não respondeu até o fechamento desta matéria. O jornal permanece aberto para quaisquer manifestações da empresa.
Ao todo, o governo pagará mais de R$ 1,3 bilhão pela importação do arroz. Como justificativa, o governo Lula alega que a compra é necessária para forçar a regularização nos preços dos alimentos.
O governo também anunciou a realização de outros leilões ao longo do ano com o objetivo de importar cerca de 1 milhão de toneladas de arroz.
Em nota, na quinta-feira (6), o presidente da Conab, Edegar Pretto, disse que o leilão foi um “sucesso” e que outro edital será publicado com a compra das 36 mil toneladas que sobraram, com o objetivo de fechar a meta das 300 mil toneladas.
“Estamos comprando essas 300 mil toneladas e vamos avaliar agora o mercado. Se não houver necessidade não faremos mais compras. Mas, enquanto for preciso baratear o preço para os consumidores, nós vamos estar realizando os leilões. Nós queremos garantir um produto bem acessível aos consumidores”, disse Pretto.
De acordo com a Conab, os lotes arrematados foram para os estados da Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco e São Paulo. Já os lotes destinados para o Amazonas, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina e Tocantins não foram comercializados.
“Essa compra não vai servir para a formação de estoque porque nosso objetivo é que esse produto, uma vez internalizado, seja rapidamente disponibilizado para os consumidores. Aqui a questão de abastecimento e de preço já está colocada e o que nós queremos é que esse produto chegue o mais rápido possível à mesa do povo brasileiro”, informou o diretor de Política Agrícola e Informações da Conab, Sílvio Porto.
O leilão chegou a ser suspenso por uma liminar da Justiça Federal de Porto Alegre em atendimento a uma representação de parlamentares do partido Novo. Os parlamentares, bem como produtores de arroz do Rio Grande do Sul, negam risco de desabastecimento do produto.
A liminar foi derrubada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), na quinta-feira (6), em atendimento a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU).
Após a divulgação dos vencedores do leilão, parlamentares da oposição cobraram explicações sobre as empresas que não possuem experiência com o comércio exterior.
Apesar de a Conab ter estabelecido um teto de R$4 por quilo e arroz no leilão, o valor de compra chegou a R$5 por quilo, o que levantou suspeitas sobre a eficácia e a transparência do processo.
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