Num novo capítulo da guerra comercial entre EUA e China, o governo de Pequim anunciou nesta quarta-feira a imposição de novas tarifas contra produtos americanos, numa lista de mais de 100 itens que irá incluir soja, aviões e carros. Em comunicado, o enviado da China para o comércio alertou que as políticas do presidente dos EUA, Donald Trump, estão colocando “em perigo sem precedentes” a própria Organização Mundial do Comércio (OMC).
As novas medidas chinesas são uma resposta à iniciativa da Casa Branca de impor retaliações por conta da suposta perda que alega ter com violações de propriedade intelectual por parte da China. Trump prometeu barreiras em produtos avaliados em US$ 50 bilhões numa lista que inclui 1,3 mil linhas tarifárias, principalmente no setor de alta tecnologia.
Para os chineses, colocar esses setores como alvo de tarifas demonstra que Washington quer evitar que Pequim se transforme em uma liderança no setor tecnológico.
Agora, Pequim responde com suas próprias medidas. “As apões americanas representam uma violação internacional e grave dos princípios da OMC”, disse Zhang Xiangchen, representante da China na OMC.
A nova iniciativa chinesa impõe tarifas de 25% a um total de 106 produtos dos EUA, também avaliados em US$ 50 bilhões. Além de soja e veículos, as medidas também afetam as vendas de aeronaves, produtos químicos, sorgo e carne bovina. A Boeing tem na China, hoje, um de seus principais pontos de operação de vendas.
Segundo a TV estatal chinesa Weibo, as tarifas chinesas ainda não têm data específica para ser aplicadas.
E o Brasil, como fica?
Com a nova retaliação chinesa, depois que 128 produtos norte-americanos já haviam sido barrados, o mercado da soja já especula os impactos da medida, que pode mudar “rotas” de importação e exportação do grão pelo mundo. “Apesar de o Brasil ser o maior exportador da oleaginosa para os chineses, que compraram 53,8 milhões de toneladas de um total de 68,15 milhões de toneladas exportadas em 2017, o país ainda precisa buscar em outros fornecedores mais de 40 milhões de toneladas de soja, com destaque para os EUA, uma vez que as exportações da Argentina são mais baixas, com o país focando no esmagamento interno e exportações do farelo de soja”, avaliou a consultoria INTL FCStone, em relatório.
Segundo análise do grupo, num cenário em que esta taxa de 25% se efetive, a procura pela soja brasileira tenderia a aumentar ainda mais, com a China deslocando outros possíveis compradores do grão do Brasil. “No limite, considerando que a China fosse o destino de toda a exportação de soja brasileira, estimadas em 69,5 milhões de toneladas em 2018 pela INTL FCStone, ainda faltariam cerca de 30 milhões de toneladas da oleaginosa para atender a totalidade das importações chinesas. Dessa forma, não teria como deixar de importar soja dos EUA”, explica a analista Ana Luiza Lodi.
Ainda assim, uma procura maior pela oleaginosa brasileira por parte da China tenderia a fortalecer os prêmios no mercado doméstico, enquanto a queda da demanda pelo produto norte-americano levaria a prêmios mais baixos nos EUA. Os preços em Chicago também tenderiam a cair, o que anularia, pelos menos em parte, os prêmios mais altos no Brasil. “No geral, os prêmios no Brasil tenderiam subir até o limite comparável de se comprar dos EUA, já considerando o imposto de 25%”, resume Ana Luiza.
Em relatório, a consultoria avalia que existiria a possibilidade de o Brasil direcionar uma maior parte da soja em grão para o mercado externo, diminuindo o esmagamento. Contudo, destaca-se que a margem de esmagamento está favorável no mercado interno, considerando o aumento da mistura de biodiesel no diesel para 10% (B10).
“O aumento dos prêmios para exportação da soja em grão precisaria compensar os ganhos com o esmagamento e venda dos subprodutos, para resultar em uma diminuição considerável do direcionamento da soja para mercado interno, favorecendo um aumento muito grande dos embarques internacionais”, avalia a analista da FC Stone, sobre o impacto no cenário doméstico. Como o consumo de farelo e óleo é grande no mercado doméstico, o Brasil precisaria encontrar alternativas para suprir essa demanda, caso um percentual muito maior da soja acabe sendo direcionado para o exterior.