A nova fase da Operação Carne Fraca pode ser recebida pelo setor agrícola francês como mais um argumento contra o acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia, dificultando as já lentas negociações entre os dois blocos econômicos.
Agricultores franceses representam uma das oposições mais influentes a esse tratado, com uma resistência específica à importação de carne brasileira e argentina.
“Fomos informados que de houve mais um problema com a carne brasileira, e essa é uma das razões pelas quais não entendemos por que a UE quer assinar um acordo com o Mercosul”, diz à reportagem Arnold Puech d’Alissac, presidente regional da FNSEA (Federação Nacional de Sindicatos de Proprietários Agrícolas). “O Mercosul é um mercado que não tem os mesmos padrões de qualidade que exigimos aos nossos produtores”, afirma. A FNSEA representa 20 mil sindicatos e 22 federações francesas.
A terceira fase da Operação Carne Fraca investiga como setores de análise da BRF e laboratórios credenciados no Ministério da Agricultura fraudavam resultados de exames. Com isso, diminuíam os níveis da bactéria salmonela, que impede a exportação a mercados mais rigorosos.
França
A FNSEA é um dos grupos que pressionam o governo francês para não permitir um acordo com o Mercosul.
O tratado é negociado pela Comissão Europeia (o braço Executivo do bloco), mas precisa do aval do Parlamento Europeu e dos países-membros - vem daí a importância da pressão francesa.
Agricultores franceses protestaram nas últimas semanas em todo o país e, no influente Salão de Agricultura de Paris, penduraram cartazes com os dizeres “não ao acordo”, afirma Alissac.
“Temos muito medo desse tratado. Vamos perder com a entrada da carne, sem com isso ganhar nada.”
No ano passado, até novembro, o Brasil foi responsável por 50% de toda a carne de frango importada pela UE - foram 376 mil toneladas, no total.
Em uma nota oficial, a Comissão Europeia disse ter sido avisada sobre a nova operação pela delegação da UE sediada em Brasília e que pediu informações às autoridades brasileiras.
O bloco não descarta implementar novas medidas de controle, a depender do desenrolar das investigações.
As ações implementadas em 2017 seguem em vigor, incluindo mais controles da entrada de carne bovina brasileira pelas fronteiras europeias.
A BRF, por sua vez, diz em um comunicado que a companhia “segue as normas e regulamentos brasileiros e internacionais referentes à produção e comercialização de seus produtos, e há mais de 80 anos demonstra seus compromissos com a qualidade e segurança”.
Itália
Outra notícia preocupante às negociações entre Mercosul e União Europeia é a eleição de forças populistas na Itália, que realizou seu pleito no domingo (4).
Venceram partidos como a Liga, de direita nacionalista, e o 5 Estrelas, contrário ao sistema político vigente. Ambos são avessos à integração europeia e ao euro.
Siglas como a Liga defenderam, em sua campanha, o favorecimento do produto “made in Italy” e a geração de empregos no país. O acordo com o Mercosul pode ser visto como algo prejudicial às indústrias locais e, assim, indesejável.
A última rodada de negociações entre Mercosul e União Europeia foi concluída na última sexta-feira (2) em Assunção sem avanços significativos.
As discussões estão em andamento há quase 20 anos, mas há alguma esperança de que finalmente possam ser concretizadas, pois a União Europeia tem buscado novos parceiros comerciais diante do isolamento americano e da saída do Reino Unido, programada para meados de 2019.
A União Europeia exportou ao Mercosul em 2016 bens equivalentes a 43,2 bilhões de euros e importou outros 41,6 bilhões de euros.