O grupo CNH Industrial, dono das marcas de maquinário agrícola Case e New Holland, dos caminhões Iveco e dos motores FPT, está apostando dezenas de milhões de dólares no biometano como solução ecológica que poderá tornar, em poucos anos, as fazendas brasileiras autossustentáveis em energia. O biometano é obtido por meio da purificação do biogás resultante da decomposição anaeróbica de resíduos orgânicos como lixo, dejetos de animais e resíduos vegetais.
“Apenas os resíduos da cana de açúcar no processo de fabricação do etanol poderiam produzir 53 milhões de metros cúbicos de metano por dia. Isso daria para substituir 50% da demanda por diesel em todas as operações agrícolas”, diz Rafael Miotto, vice-presidente para América Latina da New Holland. A conta de Miotto inclui o aquecimento de aviários e granjas de suínos, além do combustível para mover tratores e outros maquinários pesados. E, claro, significa ainda a aposentadoria da conta de energia elétrica da propriedade rural autossuficiente.
Nas contas da CNH Industrial, o biometano tem vantagens comparativas em relação ao próprio biodiesel, feito a partir de várias matrizes energéticas, como soja, sementes e gordura animal. “No biodiesel existem no mínimo dez produtos químicos diferentes. Isso limita o percentual de mistura que é possível fazer no diesel”, afirma Marco Aurélio Rangel, presidente da FPT. Já o biometano, que pode ser filtrado e padronizado independentemente da matriz energética, é, segundo Rangel, “extremamente viável na transição para fontes de energia mais sustentáveis”.
Durante a Agrishow, em Ribeirão Preto, os executivos do grupo CNH Industrial revelaram que já foram produzidos globalmente mais de 30 mil motores movidos a gás natural e a biometano, números que só tendem a crescer. O principal mercado ainda é a Europa, onde é maior a pressão da opinião pública para adoção de combustíveis sustentáveis ambientalmente, com produção baixa ou neutra de CO2.
Estrela da festa
No Brasil, o garoto-propaganda do biometano continua sendo o trator conceito T6, de 180 HP de potência, que desde o ano passado vem sendo testado a campo em propriedades rurais do Paraná (Castro e Santa Helena) e que estreou agora na Agrishow. As planilhas mostram que o T6 consome 30% menos de combustível e reduz em 80% a emissão de CO2, quando comparado a um trator a diesel.
A New Holland estima que em três anos o trator movido a biometano será realidade em escala comercial. É o prazo para maturação do produto e para verificar se os clientes – os produtores rurais – realmente “compram a ideia” da solução autossustentável e ambientalmente correta.
“O melhor caminho para começar é esse trator, nessa faixa de potência (180CV), que atinge o maior número de clientes e de atividades na fazenda, com autonomia para um dia inteiro de trabalho. No longo prazo, o desafio será colocar o biometano nas máquinas maiores. Todo o comparativo é com o diesel. Buscamos oferecer desempenho, produtividade e autonomia similares”, avalia Eduardo Luis, diretor de marketing da New Holland para a América Latina.
Uma vantagem competitiva do biometano está no fato de que, para dentro da porteira da propriedade, ele não precisa de regulamentação como acontece com a venda da energia elétrica para as concessionárias, em que os produtores reclamam da dificuldade operacional e da diferença de preços entre a energia que “se compra” da que “se vende”.
A CNH já vê o biometano como uma espécie de commodity energética utilizada e aceita em vários países. “Essa é a vantagem do biometano, é possível trabalhar em todo o globo. Estamos falando de uma energia de obtenção mais democrática, de diversas fontes, e que tem mercados assegurados como a França, Inglaterra e Alemanha, que querem tratar do passivo ambiental. Lá, eles foram praticamente obrigados a trabalhar com o biodigestor”, avalia Eduardo Luis.
Segundo a Associação Brasileira de Biogás e Biometano (ABiogás), o potencial de produção de biometano no setor agropecuário é de mais de 70 milhões de metros cúbicos por dia, sendo 78% do setor sucroenergético e 22% na produção e processamento da proteína animal. Ainda no setor de saneamento há o potencial de produzir 7 milhões de metros cúbicos por dia desse biocombustível. No total, o potencial brasileiro de biogás equivale a 44% da demanda por diesel.
* O repórter viajou a convite do pool de imprensa de empresas participantes da feira.