A bovinocultura de corte do Paraná prova que é preciso persistência para atravessar um período de “vacas magras”. Trocadilhos à parte, o setor deixa para trás o ciclo de preços baixos, insumos caros e briga acirrada por espaço com a agricultura. A pecuária encolheu, mas ganhou lucratividade. E agora o ambiente é considerado favorável para uma retomada no longo prazo.
Os pecuaristas que perderam entusiasmo com a atividade reduziram plantéis e aumentaram o abate de matrizes, favorecendo a valorização da proteína. Hoje o valor da arroba chega a R$ 125. Quem bateu o pé e se manteve na atividade retoma o otimismo, mas garante: mesmo com cotação recorde, continua sendo difícil expandir a produção no curto e médio prazos.
O cenário atual era cogitado pelos especialistas, com base no comportamento da pecuária dos últimos quatro anos. Em resposta aos preços mais baixos, houve aumento no abate de fêmeas, reduzindo a quantidade de bezerros e restringindo o aumento na oferta. Mesmo assim, o rebanho nacional cresceu. Porém, não em escala suficiente para garantir o consumo interno e a exportação, aponta o analista da Informa Economics FNP, Aedson Pereira.
Aperto
“Nos últimos anos toda a cadeia de cria, recria e engorda de animais passou por dificuldades. Hoje a disponibilidade é só o suficiente para atender à demanda”, pontua o especialista. A recente abertura de mercados como Rússia e China potencializou essa situação, complementa. Entre janeiro e julho os embarques totais da proteína subiram 10,8% na comparação com 2013, para 900 mil toneladas.
Mesmo no Paraná, que reduziu em 20% o plantel desde 2005, os preços mais altos ainda não garantem novo impulso à atividade. O boi perdeu competitividade frente a commodities como soja e milho, indica Paulo Rossi, do Laboratório de Pesquisas em Bovinocultura (LapBov) da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
“O preço da terra [cada vez mais alto] acaba fazendo a diferença nessa comparação com a agricultura”, indica. Parte dos pastos virou lavoura, e a estratégia não deve mudar mesmo com a perspectiva de um patamar de preços mais baixos para os grãos, considera.
“Quem cedeu a área para culturas como a soja não vai voltar. Para crescer na pecuária o estado precisa aumentar a produtividade”, diz. O cenário muda para regiões em que o custo da terra é menor, avalia. É o caso do Noroeste do estado.
Caixa
A retomada no rebanho depende da disposição dos produtores para novos investimentos. “O pecuarista voltou a ter fôlego. Agora é preciso reter fêmeas, voltar a criar. No caso do Paraná, também é preciso melhorar as pastagens degradadas e apostar na integração”, sinaliza o zootecnista e diretor de Pecuária da Sociedade Rural de Maringá (SRM), Jucival Pereira de Sá.
Ainda assim, os reflexos não vão aparecer tão cedo. “Você toma a ação hoje e o resultado aparece daqui a quatro anos, então é preciso esperar”, sinaliza Rossi, do LapBov.
Quem investiu não se arrepende, e pretende continuar. Em São Sebastião da Amoreira (Norte), o pecuarista André Carioba precisou de um total de R$ 5 milhões para estruturar um confinamento com capacidade para 2,1 mil animais. Com mais R$ 1,5 milhão em investimentos, ele pretende ampliar a capacidade em 40%, para 3 mil animais. A atividade gera rentabilidade média de 4,5% ao mês e já responde por 35% da renda da fazenda, também dedicada à produção de grãos e legumes.
Desafio é maior em áreas de pequeno porte
Com áreas de tamanho menor que as de Mato Grosso (maior criador de gado do país), o Paraná deve levar mais tempo para reagir aos preços recordes da carne bovina. Há menos animais para expansão do rebanho à venda, comenta o produtor Licio Isfer, de Palmeira (Campos Gerais). O inverno também pesa contra, indica o zootecnista e diretor de Pecuária da Sociedade Rural de Maringá (SRM), Jucival Pereira de Sá. “Não há muitas pastagens e a oferta do boi gordo acaba sendo menor.”
Com perto de 30 anos de experiência na pecuária, Isfer acredita que não há como apostar no gado esquecendo a agricultura. Ele cria 1,2 mil cabeças de gado em 200 hectares e produz grãos em 900 ha. Mesmo com uma área maior de grãos, não cessa os investimentos no rebanho. “Não se pode viver de momento. Minha meta é em dois ou três anos conseguir equiparar a pecuária com a renda do milho”, revela.
Onda de baixa começou há oito anos, mas perdeu fundamentos
A retração no rebanho paranaense começou em 2006, mas os fundamentos do mercado mudaram muito em oito anos. Ainda em 2005 o valor da arroba do boi começou a cair, em uma sequência que durou até junho de 2006, com a mínima de R$ 44,57. Desestimulados, os produtores começaram a reduzir os plantéis e o estado eliminou 1,5 milhão de fêmeas bovinas.
A lucratividade da soja, que todo ano rouba área de outros setores, já foi maior. Em 2007, o valor da saca do grão rompeu a barreira de R$40 por saca (60 quilos) e não parou mais de subir. Houve um tropeço em 2010, mas a escalada continuou até o patamar de R$ 70/saca em meados de 2012 — R$ 14 a mais que o preço atual.
Agora sobra menos carne. Com plantel reduzido e demanda crescente, o preço do boi em pé voltou a subir. A arroba fechou agosto na média de R$ 119, salto de 20% em 12 meses.