Há dois anos o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) emitiu 192 advertências por escrito a criadores, expositores e laboratórios de pesquisa que supostamente violaram as leis de bem-estar animal, e a agência governamental apresentou queixas oficiais contra 23, conforme dados do próprio USDA.
Neste ano, as notificações despencaram: o departamento emitiu apenas 39 advertências nos três primeiros trimestres do ano fiscal de 2018, e apresentou e arquivou apenas 1 queixa - com uma multa de US$ 2 mil para um infame criador de cães de Iowa, que já estava fora do mercado há cinco anos.
Em agosto, o USDA não emitiu avisos, não apresentou reclamações e não impôs nenhuma penalidade a assentamentos ou a quaisquer das 8 mil fábricas cujas licenças e inspeções estão sob o guarda-chuva da Lei de Bem-Estar Animal, conforme documentos obtidos por um grupo de defesa dos direitos dos animais.
Segundo a agência, a queda é resultado da suspensão das audiências de litígio, bem como do renovado processo de fiscalização, que enfatiza um trabalho mais próximo com os supostos violadores ao invés de investir em um demorado processo investigativo, que segundo estudos internos provou ser ineficaz.
Mas o resultado é pouco transparente em um sistema que já não é muito claro. Em dois anos, os registros passaram de facilmente encontráveis na internet para um sistema em são disponibilizados apenas depois de serem requisitados, por escrito, e pedidos através do que seria o equivalente à Lei de Acesso à Informação no Brasil. A mudança, acusam os críticos, favorece as empresas em detrimento do controle público.
“É tudo parte de dessa agenda pró-indústria e antirregulatória”, diz Eric Kleiman, pesquisador que rastreou as medidas do USDA para o Instituto de Bem-Estar Animal, uma organização de advogados. “Nunca tivemos esse tipo de ataque contra princípios fundamentais de preceitos tão básicos da lei que tenha desfrutado de apoio bipartidário e público de longa data há mais de 50 anos”, afirma.
A divisão de cuidados com animais do USDA emprega mais de 100 inspetores que conduzem inspeções surpresa para o licenciamento de fábricas uma vez a cada três anos, pelo menos. Além da Lei de Bem-Estar Animal, o departamento é encarregado de aplicar a Lei de Proteção aos Equinos, que proíbe práticas de sofrimento em cavalos.
Dados fora do site
A agência parou de postar os registros de inspeções em agosto de 2016, substituindo-os por um índice numérico das atividades. Em fevereiro de 2017, ela removeu abruptamente os registros de bem-estar animal e proteção aos equinos de seu site, citando litígios - aparentemente em referência a uma ação judicial. O “blackout” foi criticado por grupos de proteção aos animais e pelo Congresso, bem como por algumas indústrias e conservadores proeminentes.
Posteriormente, a agência restaurou alguns arquivos à sua base de dados pública, muitas com textos pesados. Os questionários para outras ações podem levar meses para serem completamente preenchidos.
Mas conforme os registros se tornam menos visíveis, as ações de fiscalização também estão diminuindo. Os árbitros do USDA começaram a suspender as audiências sobre violações de bem-estar animal e proteção aos equinos em 2017 por causa de uma ação que estaria sendo julgada na Suprema Corte e que poderia impactar na atuação dos juízes de direito administrativo da agência, conforme disse Bernadette Juarez, administradora-adjunta do programa de cuidado animal do USDA.
A porta-voz da agência diz que outros órgãos do governo fizeram o mesmo, mas dois grupos que representam os juízes de direito administrativo dizem que não sabem de outros casos. “Eu não acredito que o que o USDA fez é uma resposta apropriada para um caso pendente”, disse Marilyn Zahm, presidente da Associação dos Juízes de Direito Administrativo.
Algumas ações de fiscalização, no entanto, continuam, mas em um ritmo mais lento do que em anos anteriores. Conforme documentos obtidos pela Lei de Acesso à Informação requisitados pela Fundação PETA, por exemplo, em março o USDA multou a Delta Air Lines em US$ 10 mil por permitir que um gato escapasse de sua caixa e morresse durante o transporte, e enviou uma advertência a um criador de cães acusado de 39 violações entre 2014 e 2016, incluindo dar um vermífugo para cabras aos cães.
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