Uma liminar do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a cobrança do Fundo Estadual de Infraestrutura (Fundeinfra) por parte do governo de Goiás, também conhecida como “taxa do agro”. O fundo foi criado em 2022 para ajudar a cobrir perdas de arrecadação com ICMS, após aprovação da Lei Complementar 194, da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que limitou em 17% a alíquota incidente sobre combustíveis, energia elétrica, telecomunicações e transporte público – considerados bens e serviços essenciais e indispensáveis.
A decisão de Toffoli diverge do histórico de julgamentos no STF envolvendo a constitucionalidade de fundos estaduais criados para financiar investimentos em infraestrutura, transportes e habitação. Na maioria dos casos, os estados oferecem um benefício fiscal de diferimento de ICMS condicionado ao recolhimento de uma contribuição não compulsória.
Toffoli atendeu a pedido da Confederação Nacional da Indústria. A CNI questionou dispositivos das leis goianas 21.670/2022 e 21.671/2022 que estabeleceram o pagamento da contribuição como condição para que os contribuintes participassem de regimes de benefícios ou incentivos fiscais, de controle de exportações e de substituição tributária para trás. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), que “comprou briga” com o setor agropecuário para aprovar a contribuição na Assembleia Legislativa, disse respeitar a decisão de Toffoli, mas sublinhou que “ela não é terminativa” e acredita que “será revertida no plenário do STF”.
Segundo Caiado, a projeção era de arrecadar cerca de R$ 1 bilhão com o Fundeinfra, o que não cobre de forma integral as perdas com ICMS, que chegariam a R$ 5,5 bilhões em 2023. “Sua função é unicamente assegurar aos produtores rurais os investimentos prioritários em infraestrutura, para que tenham mais competitividade logística para escoar sua produção”, defendeu o governador, ao comentar a decisão do STF.
Taxa recolhe 1,65% da comercialização da soja
Pelo sistema criado em Goiás, a taxa sobre a comercialização de soja chegava a 1,65%. Para cana-de-açúcar, 1,2%, e, para o milho, 1,1%. Uma cobrança de 0,5% vinha sendo aplicada para carnes, com exceção do frango (e do ovo), que foi isentado.
Em sua decisão, o ministro Toffoli destacou que o Fundeinfra busca captar recursos financeiros para o desenvolvimento econômico de Goiás. No entanto, ele afirmou que o STF tem jurisprudência firme sobre a inconstitucionalidade da vinculação de receita de impostos, entre eles o ICMS, a órgão, fundo ou despesa, exceto nos casos permitidos pela própria Constituição Federal. Na prática, Goiás estaria tributando inclusive as exportações, o que esbarra na legislação federal em vigor.
Toffoli concordou com o argumento da CNI de que algum contribuinte que ficasse inadimplente estaria sujeito “a diversas complicações, afetando, negativamente, suas atividades e a própria cadeia econômica”. Em caso de inadimplência, “surgirão os mais diversos embaraços fiscais, econômicos e operacionais, tais como a impossibilidade do gozo do incentivo fiscal, a absorção de custo para fruição da imunidade do ICMS sobre operações de exportação sem garantia da restituição do valor despendido em tempo razoável e a maior oneração do contribuinte pela sua simples caracterização com substituto tributário em operação relacionada à mercadoria discriminada no Decreto Estadual”.
SRB já questionou taxa do Mato Grosso, sem sucesso
A liminar de Toffoli, que ainda será examinada pelo plenário do STF, foi concedida na mesma semana em que o Partido Novo impetrou ação questionando a cobrança de outra taxação do agro, no Mato Grosso, que já perdura por mais de 20 anos. A constitucionalidade do Fundo Estadual de Transporte e Habitação (Fethab), vigente desde 2000, já foi contestada pela Sociedade Rural Brasileira (SRB). O processo, contudo, foi arquivado porque o ministro Gilmar Mendes entendeu que a SRB não tinha legitimidade para promover a ação, visto que aceita em seus quadros outras pessoas, além de produtores rurais.
Em 2020, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade contra o fundo, que considera, na verdade, uma parcela de ICMS exigida para não cobrança de taxa de exportação. O relator da ADI 6.420 também é o ministro Gilmar Mendes.
No julgamento de uma ADI contra a taxa do agro mais antiga de todas, o Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário de Mato Grosso do Sul (Fundersul), de 1999, o STF entendeu que a contribuição não tinha natureza tributária, por não ser compulsória. Assim, ocorreria a "não submissão aos princípios e limites do poder de tributar". Na esteira dessa jurisprudência, novas taxações do agro surgiram no Maranhão, que mantém o Fundo Estadual de Desenvolvimento Industrial, e no Tocantins, que adotou o Fundo Estadual de Transporte. No Paraná, no ano passado o governador Carlos Massa Ratinho Júnior (PSD) chegou a propor a criação de uma taxa do agro, mas após resistência e protestos do setor, voltou atrás e a mensagem foi engavetada.
Para o Partido Novo, que questiona o Fethab matogrossense, trata-se de imposto disfarçado, ou “tributo travestido de fundo”. O Fethab injeta R$ 3 bilhões por ano nos cofres do governo do Mato Grosso.
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