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Alguns carros entram para história da indústria automotiva não só pelo sucesso nas vendas. Há modelos que figuram na seleta galeria dos 'imortais' pela inovação e o pioneirismo. É o caso do Fiat 147, que completou no último dia 5 de julho 40 anos do lançamento da versão a álcool no Brasil.
O modelo foi o primeiro em solo nacional a ser abastecido com o combustível vegetal, além de ser o pioneiro no mundo produzido em larga escala. Ele contribuiu ainda para o desenvolvimento no país de veículos movidos com o derivado da cana-de-açúcar.
O 147 tornou-se icônico por ser o primeiro automóvel brasileiro a vir com motor transversal dianteiro e desembaçador traseiro e a oferecer quase todas as variantes: hatch, sedã, perua, furgão e picape (só faltou o conversível e o utilitário esportivo).
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Odor inebriante de cachaça
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A presença de álcool no tanque fazia o escape expelir um cheiro que lembrava ao de uma bebida aguardente, por isso o modelo logo ganhou o apelido de 'Cachacinha'. Quem teve ou tem um exemplar sabe o forte odor inebriante que toma conta da cabine ao dar a partida
O primeiro 147 com esse tipo de combustível foi vendido em 1979 para o Ministério da Fazenda, em Brasília. Com pintura preta e faixa branca nas laterais, foi usado por mais de 30 anos pela frota do governo e atualmente faz parte do acervo de clássicos da Fiat e está praticamente original, sem restauração, com mais de 80 mil quilômetros rodados.
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
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A unidade traz uma plaqueta em alumínio fixada no painel pelo próprio órgão ministerial, que dá ainda mais exclusividade ao exemplar.
O modelo traz algumas peculiaridades comuns à época, como cinto apenas abdominal, banco sem encosto de cabeça e retrovisor apenas do lado do motorista.
Afogador para os dias frios
O 147 também encontrou a solução para um problema crônico nos carros a álcool: a partida a frio.
Em dias de temperaturas mais baixas ligar o veículo era um teste de paciência, uma vez que o poder calorífico era menor que o da gasolina - a quantidade de calor emitida pela combustão completa de um combustível.
Veio o tanquinho exclusivo com uso de gasolina para facilitava a partida no motor frio. O recurso passou a ser usado amplamente e até hoje equipa vários modelos flex. O acionamento era por meio de um botão no painel, o afogador, para injetar a gasolina no coletor de admissão.

A primeira leva de 147 a álcool era equipada com motor 1.3 8V Fiasa, de 62 cv e 11,5 kgfm de torque, contra 61 cv e 9,9 kgfm da versão a gasolina. O câmbio era manual de quatro marchas.
O zero a 100 km/h ocorria em 16,2 segundos, ante os 18,2 s do modelo a gasolina. A velocidade chegava a 142 km/h, contra 140 km/h do combustível fóssil.
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Sistema de alimentação, como tanque de combustível, bomba, tubulações, mangueiras e carburador, recebia evoluções contínuas, além do álcool contaminar os lubrificantes, que precisavam de aditivos adequados. A proteção interna do tanque de combustível trocou o chumbo pelo estanho, mais resistente.
Para receber o álcool a montadora teve de fazer uma série de melhorias no motor, principalmente devido ao poder corrosivo do combustível.
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Robson Cotta, gerente de Engenharia Experimental da FCA (Fiat Chrysler Automóveis), lembra que no início a fabricante usava lugares frios, como Campos do Jordão, para os testes que precederam a implantação dos sistema.
Mas tiveram de contratar cabines frigoríficas para colocar os carros, pois senão ficavam na dependência de a temperatura registrar abaixo de 8 graus pela manhã.
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O simpático hatch foi responsável por inaugurar em 1976 a fábrica da Fiat em Betim (MG) - a maior da marca fora da Itália.
De 1979 a 1987, período em que foi comercializado no Brasil, o 147 a álcool emplacou 120.516 unidades.
147 puxa a fila do Proálcool
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O 147 'Cachacinha' puxou a fila de outros modelos a álcool e que surgiram como resposta brasileira à crise do petróleo de 1973.
À época os países árabes, que dominavam a produção e venda do chamado 'ouro negro', inflacionaram o preço do barril em mais de 400%, saltando de US$ 2,03 em 1971 para US$ 10,73 em 1974.
Refém do petróleo importado, o país acabou encontrando no álcool a solução doméstica para manter o mercado automotivo aquecido. Nascia em 1975 o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), que tinha por objetivo estimular a produção de álcool.
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Proliferou a criação de usinas, houve incentivos fiscais do governo e empréstimos bancários a juros baixos para produtores de cana-de-açúcar e fabricantes de automóveis.
Surgiu assim uma nova matriz energética no Brasil. A produção álcool saltou de 3,4 bilhões de litros ao ano em 1980 para 9,5 bilhões em 1985. A participação de carros a álcool subiu rapidamente, aumentado de 27% para 95,8% durante a primeira metade da década de 1980.
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A presença de modelos com esse tipo de combustível só começou a diminuir com o recuo no preço do petróleo na década de 1990.
Com o advento da injeção eletrônica e da modernização de gerenciamento do motor veio a tecnologia bicombustível, que permita o carro consumir só álcool - que passou a se chamado de etanol -, só gasolina, ou a mistura de ambos em qualquer proporção.
"A virada para o flex acabou sendo bastante ‘confortável’, a maior evolução nesses modelos foi mesmo no gerenciamento eletrônico."
Ronaldo Ávila, supervisor de engenharia da FCA.
Em 2003 era lançado o Volkswagen Gol Total Flex, primeiro carro bicombustível, que trazia soluções desenvolvidas no período do Proálcool, como o uso de níquel químico na proteção de peças metálicas que entram em contato com o etanol e de componentes de escape feito em aço inoxidável.
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