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Não estranhe se um dia você receber uma notificação em casa de que foi multado porque passou de propósito com o carro sobre uma poça d’água para molhar pedestres ou outros veículos. Pode soar inusitada, mas esta ocorrência está prevista no artigo 171 do Código Brasileiro de Trânsito como infração média, passível de multa de R$ 85,13.

Diariamente, boa parte dos motoristas infringe inúmeras determinações contidas no CTB sem nem sequer suspeitar. Quem imaginaria que não manter a distância lateral de 1,50 metro ao ultrapassar uma bicicleta é considerado infração média, sujeito à multa e menos quatro pontos na carteira de habilitação.

Desde que foi promulgado, em 1998, o CTB já sofreu mais de 200 modificações em artigos, agregando novas resoluções. Atualmente, existem 769 situações infracionais. "Fica difícil para o agente verificar se houve ou não uma infração. Por exemplo, dirigir com apenas uma das mãos também fere a lei, mas o motorista pode estar trocando a marcha ou mexendo no rádio. Neste caso, a autuação só ocorrerá se o condutor estiver comendo ou bebendo algo, motivo pela qual uma das mãos estaria ocupada", observa Léa Hatschbach, gerente de Infrações do Trânsito da Diretoria de Trânsito (Diretran) de Curitiba.

Ela cita o exemplo da distância mínima ao passar pelo ciclista para explicar que CTB foi feito para um país inteiro, atendendo, inclusive, peculiaridades de cada região. "Tem locais em que as pessoas circulam bastante de bicicleta, por isso há um artigo específico que visa a segurança do ciclista", justifica.

Léa também recorda de um episódio em frente a Rodoferroviária de Curitiba no qual um motorista foi multado após jogar o carro numa poça d´água só para molhar alguns agentes de trânsito que estavam na calçada. "Um deles teve até que retornar a sede da Urbs para trocar de roupa", conta o gerente, para em seguida dar um recado: "Desconhecer a lei não é motivo para cometer a infração. O motorista tem que conhecer o código de trânsito, mesmo sendo uma leitura desconfortável, para evitar surpresas."

Subjetivo

O professor de direito de trânsito da Faculdade de Direito de Curitiba, o advogado Marcelo José Araújo, afirma de que alguns artigos chamam a atenção pela subjetividade. "Muitas vezes não é tão simples estabelecer o que pode ou não. O CTB proíbe o calçado que comprometa a utilização dos pedais. Mas uma coisa é o guarda que não usa salto alto tentar usá-lo, e outra é a modelo acostumada às plataformas. Além disso, o agente não vai enfiar a cabeça dentro do carro para verificar o calçado que a pessoa está usando", argumenta. Objetivamente, a lei prevê punição para quem dirigir com calçado que não se firme nos pés, onde se enquadrariam chinelo, tamanco ou sandália sem tiras.

Na verdade, o zelo dos legisladores faz com que fossem criadas infrações sem a mínima possibilidade de fiscalização. Reflexo disso é o número bem reduzido – para não dizer inexistente – de punições com multa para as transgressões mais atípicas, como dirigir o veículo desligado ou desengatado em descidas acentuadas. "Há até boa intenção ao impor determinadas regras. Mas, falta um papel educativo por trás disso. Campanhas que mostrem que se dirigir com salto alto pode ter dificuldades de controlar os pedais numa emergência ou sofrer uma lesão andando com o braço para fora", analisa.

O professor cita como exemplo a campanha feita pela Diretran, dentro do programa "Cidadão em Trânsito", que usava bichos para comparar com as principais infrações de trânsito cometidas pelo motorista . O condutor que parava em fila dupla era taxado de perua, o rato representava quem avançava o sinal vermelho, anta era aquele que bloqueava o cruzamento e galo garnizé era associado a excesso de velocidade. "A penalidade de caráter moral perante a sociedade fica mais enraizada do que a multa em si. As pessoas passaram a fiscalizar umas as outras".

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