O que Rodrigo Janot diria de um procurador federal que é flagrado num encontro num bar de Brasília, à noite em pleno feriado, com o advogado de um réu que está sendo denunciado por ele naquele momento? Se usarmos o mesmo rigor que Janot trata encontros fora da agenda de outras autoridades, Janot deveria deixar o cargo.
A Constituição de 1988 (foram tantas, é sempre bom ser específico) deu status de quarto poder ao Ministério Público. Na prática, a república brasileira tem quatro poderes: executivo, legislativo, judiciário e MP. Rodrigo Janot é um chefe de poder, tem prerrogativas e regalias compatíveis com o cargo, mas raramente é visto ou cobrado como tal. Carlos Andreazza, em O GLOBO, apelidou Janot de Governador-geral da República. Michel Temer, Rodrigo Maia e Carmem Lúcia, líderes dos outros poderes, não têm a mesma sorte.
Segundo O Antagonista, Janot e e o advogado Pierpaolo Bottini, que defende Joesley Batista, conversaram por 20 minutos numa mesa discreta de um boteco da capital federal. Durante o convescote, fora da agenda oficial, o acusador geral da república não tirou os óculos escuros. Bottini emitiu uma nota dizendo que o encontro foi “casual”, como se ambos estivessem perambulando sozinhos nos bares de Brasília no feriadão de 7 de setembro. Que bandeira.
Janot, indicado para o cargo por Dilma Rousseff em 2014 e reconfirmado dois anos depois, tentou afastar Michel Temer com uma “denúncia inepta“, mas foi impedido pelo Congresso há um mês. A economia do país, cambaleante mas em recuperação, agradece. Uma “vitória da responsabilidade“, como disse o Estadão em editorial, um dos poucos veículos que se mostrou imune ao jacobinismo janotista ou às delações de Joesley Batista, aceitas pelo valor de face por parte da imprensa.
Numa constrangedora capa de revista em junho, o açougueiro e maior criminoso do país com mais de duzentos ilícitos confessos, chegou a dizer que “Temer é o chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”. Joesley merecia estar naquela mesa da birosca de Brasília ontem. Quem não tem colírio, usa óculos escuros.
Em outro editorial primoroso, publicado ontem, o Estadão não usa meias palavras: “o papel do Ministério Público deve ser exatamente o oposto ao que vem sendo exercido por Rodrigo Janot”. O jornal não podia imaginar que horas depois o mesmo Janot estaria num bar com ninguém menos que o advogado de Joesley Batista.
Num momento de histeria e desmoralização institucional do país, de “heroísmo tarja preta” como dito por Guilherme Fiúza, criticar a atuação de Rodrigo Janot é pedir para ser chamado de “conivente com a corrupção” ou ter “bandido de estimação” pelos binários reativos das redes sociais, sempre prontos a espirrar uma opinião precoce no teclado. O tempo é o senhor da razão.
“Pede para sair”, gritaria Capitão Nascimento. “Sai daí, Zé, sai daí logo”, diria Roberto Jefferson em tempos de mensalão. A imagem de ontem no bar de Brasília não deixa mais dúvidas: é hora de pedir a saideira.