Há décadas existe essa história de que o Sul deveria se separar do resto do país. Um movimento que de vez em quando ressurge e que recentemente, com a crise política, ganhou um certo embalo. Agora, pertinho da eleição de verdade, resolveram fazer um plebiscito de mentira. Não vale nada: vale apenas como alerta contra certos riscos da nossa democracia.
Plebiscito de verdade é aquele convocado pelo Congresso. Faz-se quando o governo quer decidir algo relevante em que há duas escolhas legítimas e acredita-se que, por importante, a decisão deve ser tomada diretamente pelos cidadãos. Essa consulta popular não é plebiscito, apenas finge. Não é nada: é mero marketing. E marketing perigoso.
Sabe por que jamais o Congresso convocaria esse plebiscito? Porque ele seria ilegal. A Constituição brasileira diz claramente que pedir a separação do país é contra a lei básica brasileira. É o equivalente a pedir a tomada de outro país. Ou a pedir que o idioma vire o sueco. Ou que se elimine o direito de ir e vir. Ou qualquer outra aberração: simplesmente não há essa possibilidade.
A impossibilidade do plebiscito se dá por ser inconstitucional. E portanto não há duas opções legítimas. O país existe como é. Pregar o contrário, inclusive, dá cadeia. E só não se deve prender os líderes do movimento para não criar mártires de uma causa injusta e que, felizmente, ainda é pequena.
O movimento separatista nasce de uma série de premissas equivocadas. Uma delas é de que o Sul seria uma região diferente, étnica e historicamente. Claro que cada canto do Brasil tem especificidades, mas a tese do “Brasil diferente” não se sustentou e não é defendida a sério por nenhum grande historiador ou cientista social.
A premissa da pujança econômica é outra falsidade. São Paulo é mais forte economicamente do que o Sul. Deveria se separar também? E depois da separação do Sul: se um estado for mais pujante do que o outro, fará nova separação? E depois as cidades dentro desse estado? Até que alguém esteja descontente porque seu bairro está pagando mais impostos e outra região do município recebendo mais benefícios. Aí sim teremos o movimento do “Batel é meu país”, com semelhantes em Florianópolis e Porto Alegre.
O movimento, por mais que seus líderes possam negar ou nem perceber, nasce de um conceito errado, um preconceito, de que certas regiões do país são diferentes para melhor e de que outras regiões em função de atraso histórico ou perfil racial, sabe-se lá, impedem o nosso crescimento. A Amazônia é a maior riqueza deste país. Separar seria perdê-la, assim como seria perder o pré-sal, o petróleo do Nordeste, a riqueza ambiental, o pantanal, a indústria do Rio, as minas do Brasil Central.
Ainda que por motivos egoístas, seria um erro. Ms, principalmente, é um erro porque um país não é um juntado casual de pessoas. É uma história. É um povo. É uma sabedoria coletiva. É uma luta de séculos por construção de uma identidade – não se trata só de economia, e sim de solidariedade humana. O Brasil tem uma história e uma cultura muito mais ricas do que o Sul isolado. Querer ser menores em tamanho nos reduziria não apenas a um egoísmo, mas ainda a um egoísmo burro. E triste.
A consulta do movimento não vale nada legalmente. E, moralmente, vale ainda menos. Que eles ganhem. Que se vangloriem de ter conseguido 100% dos votos, porque só quem votarão serão eles mesmos. Nós, os outros, os brasileiros, ignoraremos isso e continuaremos orgulhosos de ter Ruy Barbosa, Machado de Assis, João Cabral, Drummond, Manoel de Barros, Villa-Lobos. Todos brasileiros, como você, eu e – queiram eles ou não – os próprios separatistas.
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