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O burocrata que existe em mim saúda o burocrata que existe em você

Bica fechada pela prefeitura: o medo é a arma do burocrata. Foto: Gerson Klaina/Tribuna do Paraná. (Foto: )

Uma parente distante entrou para o folclore da minha família por cunhar e repetir à exaustão uma frase: “Tudo que passa de ordem é desordem”. Serve de medida para quase todas as coisas, inclusive na política. Se você pesa a mão demais para um lado, pode estar contrariando a regra número um de dona Nenê.

O excesso de intromissão na vida dos outros é o típico caso de desordem. O típico afetado por esse erro é o pequeno burocrata que deixa subir à cabeça o pouco poder que lhe deram. E quanto menor o poder, maior a chance de o sujeito se entusiasmar e sair querendo ditar regra para o mundo.

Na prefeitura de Curitiba, por exemplo, há uma epidemia de barnabés querendo ditar tudo o que se pode e o que não se pode fazer. Gente que troca o bom senso pela alínea obscura do inciso desnecessário de um decreto qualquer. Gente que acha que deve ser implacável na aplicação da regra, mesmo que a regra seja estúpida e que as pessoas não estejam fazendo mal a ninguém.

Um exemplo clássico aconteceu no Bosque do Papa. Quem vai chegando no bosque vê uma simpática horta comunitária à beira da rua. O pessoal planta de tudo ali: quem quiser planta, quem quiser colhe. Maior espírito de cidadania não há.

Pois não é que um fiscal qualquer decidiu que não pode? A hortinha não toma espaço de ninguém, não é radioativa, não é imoral nem contém propaganda do comunismo. Mas segundo o pensamento de quem é incapaz de pensar fora do que diz um pedaço de papel, aquilo deve ser o princípio da anarquia final.

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Já imaginou se as pessoas começarem a plantar coisas sem pedirem a bênção do prefeito? Será o caos. É preciso intervir. Em outra situação semelhante, os fiscais já tentaram impedir a barbárie. Se propuseram em 2017 a destruir uma perigosíssima horta numa calçada do Cristo Rei. A Cruzada burocrática, no entanto, morreu na casca porque a população conseguiu provar o ridículo da ação da prefeitura.

Os burocratas, no fundo, querem que a cidade seja de propriedade deles e dos pedaços de papel que, do ponto de vista deles, comandam o universo.

Você quer fazer ioga no parque? Ora, veja bem: você pode achar que isso só faz bem para a saúde de todos, para o exercício da vida comunitária, para a plenitude da cidadania. Mas por sorte o fiscal, o agente, o guardinha está ali munido de um decreto para mandar as pessoas pararem de serem felizes em local público.

Dia desses, um outro exemplo. Um sujeito no Guabirotuba fez um poço artesiano. Distribuía água limpa, potável para a vizinhança. Cinco anos e todo mundo estava feliz. Ninguém ficou doente. A doença foi a Vigilância Sanitária que trouxe: a burocratite.

O rapaz se viu constrangido a fechar a bica depois que o fiscal avisou que ele podia ser processado por essa ideia maluca de dar água para os outros.

É esse tipo de pensamento que você vê quando a prefeitura bota plaquinhas dizendo para você não doar nada para as pessoas que ficam na rua, especialmente crianças. Se você não tiver como carimbar a sua doação, ela pode ser algo terrível: imagine tentar ajudar o próximo sem que o Estado esteja no meio, que absurdo!

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