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Foto: Gazeta do Povo
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O que leva o chefe eleito de uma nação de 209 milhões de habitantes a divulgar um vídeo obsceno e escatológico? É a questão que ronda o presidente Jair Bolsonaro, o Brasil e até uma boa parcela do mundo, segundo os trending topics do Twitter desta quarta-feira de Cinzas.

Se você ainda não sabe do que se trata, clique aqui e tire suas próprias conclusões (dica: o conteúdo é barra pesada, pense bem antes de ir adiante).

Bolsonaro, obviamente, queria chocar e criticar uma atitude grotesca. Apanhou bastante e viu subir para o topo das discussões mundiais do Twitter a hashtag #impeachmentbolsonaro. Logo depois, em segundo lugar, veio o #bolsonarotemrazao.

A estratégia do escândalo nem de longe é uma novidade na cartilha de comunicação de Bolsonaro. Nem a de dividir para se fortalecer.

Mais do que os comos e os porquês, a pergunta mais importante sobre a apelação à baixaria é: com quem Bolsonaro queria falar? A resposta é simples: com o brasileiro que não gosta de carnaval.

Mas o Brasil não é o país do carnaval? Há controvérsias bastante razoáveis. Pesquisa feita em 2004 pelo instituto CNT/Sensus apontava que 57,6% dos brasileiros não gostavam de carnaval, contra 41,2% que gostavam. Foram ouvidas 2 mil pessoas, em 195 municípios.

O jornal O Estado de S. Paulo entrevistou, na época, o professor de cultura popular da Inesp Alberto Ikeda para comentar a “surpresa”. A questão, segundo ele, é que não havia nenhuma surpresa. “Atribuo esse índice baixo à questão da moral. Como o carnaval expõe o nu, é combatido por grupos religiosos mais conservadores, que cresceram muito nos últimos 20 anos”, declarou.

OK, a pesquisa é antiga. Mas o que levou o Rio de Janeiro (inegavelmente a capital mundial do carnaval) a eleger como prefeito o bispo Marcelo Crivella, símbolo do anticarnavalismo? Os últimos anos tem servido para mostrar que há poucas cláusulas pétreas no contrato social brasileiro.

Outra paixão, o futebol, também não causa mais tanto fervor. Pesquisa do Datafolha realizada em janeiro de 2018 mostrava que 41% dos entrevistados disseram não ter interesse por futebol – o índice é dez pontos porcentuais maior do que o aferido pelo mesmo instituto em 2010. 26% disseram ter grande interesse, 23% médio interesse e 9% pequeno interesse.

Grosso modo, a pesquisa mostra que, se um político sair à rua dizendo que não quer ver dinheiro público escoando para futebol (como Bolsonaro fez com os patrocínios da Caixa), pode conversar com pelo menos dois a cada cinco eleitores. Fora o pessoal que gosta de futebol, como o palmeirense Bolsonaro, e que topa entrar no assunto.

A “golden shower” de Bolsonaro foi, ao mesmo tempo, uma pregação aos convertidos ao bolsonarismo, um flerte generalizado com o pessoal que detesta o carnaval e, acima de tudo, mais uma edição do nós contra eles. Hostilizado em blocos carnavalescos de norte a sul do país (diga-se de passagem, assim como quase todo político brasileiro ao longo das últimas oito décadas), Bolsonaro reagiu mostrando o que acontece no time de lá.

Joga com o raciocínio de que era “essa gente” que o xingava. Bolsonaro ganhou a eleição surfando na onda de um país dividido. Nunca disse que governaria de forma diferente.

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