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Procurador no TCU diz que Ricardo Barros tenta “arruinar” parceria da Hemobrás e cobra punição

A Hemobrás está localizada em Pernambuco. Foto: Divulgação/Hemobrás (Foto: )

O procurador Marinus Marsico, que atua no Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU), cobra uma punição ao ministro da Saúde, o paranaense Ricardo Barros (PP), por uma “sequência de atos e omissões” para “arruinar” a Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) entre a estatal Hemobrás, localizada em Pernambuco, e a empresa estrangeira Shire Farmacêutica Brasil. O objeto da PDP é a produção do Fator VIII recombinante, usado no tratamento da hemofilia tipo A.

Na quarta-feira (21), no âmbito de uma representação sobre o “caso Hemobrás”, em trâmite no TCU desde julho de 2017, o procurador entrou com um pedido de medida cautelar para afastar temporariamente o paranaense do cargo de ministro da Saúde e, no mérito, para aplicar contra ele sanções de multa e de inabilitação para o exercício de cargo em comissão e função de confiança. Agora, cabe ao relator do tema no TCU, ministro Vital do Rêgo, analisar os pedidos do procurador.

A despeito disso, Ricardo Barros já anunciou que irá deixar a pasta da Saúde, reassumindo a cadeira na Câmara dos Deputados, entre segunda-feira (26) e terça-feira (27). A desincompatibilização é obrigatória para quem pretende disputar as eleições de outubro e Barros vai tentar conquistar mais um mandato de deputado federal pelo PP do Paraná. Com o afastamento do pepista da Esplanada dos Ministérios, o primeiro pedido do procurador deve perder o objeto. Ainda assim, o TCU pode concordar em aplicar sanções a Ricardo Barros.

No pedido de medida cautelar, obtido pela Gazeta do Povo, o procurador narra uma série de situações nas quais Ricardo Barros demonstraria “obstinada” intenção de “arruinar” a PDP, “em flagrante descumprimento de decisões do TCU e do Poder Judiciário”, “sujeitando as atividades da Hemobrás a riscos de prejuízos graves e irreparáveis”.

“Como documentado neste processo de representação, a partir de meados de 2017 foi desencadeada no âmbito do Ministério da Saúde – com participação direta do senhor Ricardo Barros, titular da pasta – sequência de atos e omissões tendentes a fulminar a vigente PDP do Fator VIII recombinante (Hemobrás/Shire) e substituí-la por outros negócios, alterando-se partícipes da transferência de tecnologia e/ou fornecedor do insumo (Tecpar/Octapharma), chegando-se até mesmo a tratativas visando à construção de uma nova fábrica em Maringá/PR, apesar dos vultosos investimentos já realizados no parque fabril da Hemobrás em Goiana/PE e das graves consequências de uma ruptura unilateral da PDP vigente”, resume Marsico.

O procurador lembra, por exemplo, que o TCU, em dezembro do ano passado, havia dado um prazo de 30 dias para o Ministério da Saúde resolver o impasse. A partir daí, a pasta já pediu duas prorrogações do prazo. Há uma “demora excessiva para analisar e deliberar sobre a proposta de reestruturação da PDP (feita pela Shire)”, pontua Marsico.

Outro lado

Procurado, o Ministério da Saúde enviou uma nota, na qual informa, primeiro, que “as novas etapas de transferência de tecnologia estão em análise pelos Comitês de Avaliação e Deliberativo do Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde”. Em seguida, a nota faz críticas à PDP: “Na avaliação do Ministério da Saúde, trata-se de uma proteção de mercado da Hemobrás e sua parceira comercial, o que provoca um prejuízo aos cofres públicos de, pelo menos, R$ 142,6 milhões”.

“A Hemobrás oferece cada unidade a R$ 1,11 e recusou a redução do preço. Empresas concorrentes ofereceram oficialmente à pasta o mesmo produto com valores entre R$ 0,74 e R$ 0,78. É reconhecido que processos de licitação tendem a diminuir os preços devido à disputa entre os participantes. O valor que poderia ser economizado equivale a aquisição de 36 milhões de doses de vacina contra febre amarela. O Ministério da Saúde buscará ressarcimento dos valores pagos acima do mercado”, continua a nota.

Ao final da manifestação, o Ministério da Saúde ainda destaca que “as etapas de transferência de tecnologia não foram cumpridas” e afirma que “a demanda supera o contrato vigente com a empresa pública”.

Nesta sexta-feira (23), no final da tarde, Ricardo Barros e o presidente da República Michel Temer fazem uma visita à Hemobrás, em Pernambuco. Eles devem anunciar recursos para a estatal.

O caso

Criada em 2004 com a função social de fornecer medicamentos hemoderivados ou produzidos por biotecnologia, a Hemobrás firmou a PDP com a Shire no final de 2012. Ao longo da vigência da PDP, ou seja, até o ano de 2024, a Shire repassaria para a Hemobrás toda a tecnologia envolvida na produção do Fator VIII recombinante.

Em troca, durante a vigência da PDP, o Ministério da Saúde compraria o medicamento (Fator VIII recombinante) produzido pela Shire. E, ao final da PDP, a Hemobrás teria o domínio da tecnologia para ela própria fabricar o medicamento, abastecendo o mercado interno, um dos maiores do mundo.

Em meados de 2017, contudo, alegando atrasos na transferência de tecnologia, o Ministério da Saúde suspendeu a PDP, o que gerou contestações do MPTCU, do MPF-PE, da Shire e da própria Hemobrás.

A Shire e a Hemobrás reconhecem atrasos no processo de transferência tecnológica, mas argumentam que isso ocorreu devido a falhas nos repasses da União à estatal. Além disso, embora a Shire tenha feito uma proposta de reestruturação da PDP, prevendo investimentos na Hemobrás e perdão de juros de dívidas, a empresa estrangeira alega que o Ministério da Saúde não tem dado retorno.

Diante do imbróglio, o TCU determinou à pasta, em dezembro último, um desfecho para o caso, em 30 dias: se a opção for pela continuidade da parceria, o Ministério da Saúde deverá atualizar o cronograma de transferência de tecnologia. Se a deliberação for pelo rompimento, a pasta deverá comprovar a vantagem econômica e o interesse público da medida, “considerando o montante de recursos já despendido” no complexo da Hemobrás.

Interesse eleitoral

Para o MPTCU, Ricardo Barros tem interferido na questão por interesses pessoais. O Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), ligado ao governo do Paraná, já apresentou ao Ministério da Saúde uma proposta de parceria semelhante, mas na qual a Shire seria substituída pela Octapharma. Neste caso, a produção do Fator VIII recombinante ficaria concentrada em uma fábrica do Tecpar em Maringá, reduto eleitoral da família Barros.

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