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Por que a reforma da Previdência não fez a menor falta neste ano

Em questões de longo prazo, é bastante comum que o debate fique míope, olhando só para o que está acontecendo no momento. Com o fracasso da reforma da Previdência no governo Michel Temer (por causa da intervenção no Rio de Janeiro, o assunto nem vai entrar em pauta mais), muita gente vai usar a atual tranquilidade na economia como argumento contra mudanças previdenciárias.

Afinal, não fizemos a reforma e o país continua andando, com crescimento projetado entre 2,5% e 3%, inflação baixa e juros no menor nível da história recente. O bom resultado fiscal do primeiro bimestre, no qual o país teve superávit, pode reforçar a tese de que é só a economia crescer um pouco mais e por mais tempo para ficar provado que não existe déficit da Previdência e que o problema era de outra natureza – falta de estímulo estatal para a economia, por exemplo.

As razões para a tranquilidade econômica neste ano, no entanto, não vêm da solução da nossa bomba-relógio previdenciária de longo prazo. Elas são uma combinação de ajustes feitos pela equipe econômica justamente para abrir uma janela maior para o país fazer um ajuste fiscal. Janelas desse tipo são sempre temporárias, nem sempre com efeitos benéficos.

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Uma das medidas tomadas pela equipe econômica foi jogar para cima o déficit público e atrasar o ajuste fiscal. Para este ano, o limite de déficit primário (antes do pagamento dos juros) é de R$ 159 bilhões. Para o ano que vem, será de R$ 139 bilhões. Pela proposta inicial da atual equipe econômica em 2016, já deveríamos ter déficit abaixo de R$ 100 bilhões no ano que vem. Qual o efeito desse atraso no ajuste? Ele diminui o efeito da queda dos juros em prazos longos. O mercado hoje trabalha com uma taxa real de juros de 2% para prazos curtos (2020, 2021) e de 5% para prazos mais longos (2035 em diante). Ou seja, o efeito da queda nos juros é menor do que seria na presença de um ajuste maior, possível com reformas, incluindo a da Previdência.

Se o atraso do ajuste é o lado ruim da história, há um ponto bastante positivo. A equipe econômica conseguiu conter de forma concreta os gastos com subsídios, em especial com a aprovação da taxa de longo prazo (TLP), que retira subsídios em empréstimos do BNDES, e o fim de outras linhas hiperbaratas do banco. Só em 2017, a economia nessa rubrica foi de cerca de R$ 30 bilhões. Como os empréstimos que ainda existem vão sendo quitados ao longo do tempo, a conta será decrescente pelos próximos anos.

É claro que poderíamos usar de forma mais inteligente esse corte de gasto, em vez de custear o crescente déficit da Previdência e ceder à pressão política por mais gastos em ano eleitoral. O governo poderia anunciar imediatamente uma redução no déficit para este ano e o próximo, fazendo com que os juros de longo prazo cedessem. A janela de oportunidade pode rapidamente se tornar um remendo inútil.

Isso porque o crescimento dos gastos previdenciários não vai desacelerar sem reforma. Nos últimos 20 anos, o gasto previdenciário cresceu 4 pontos percentuais por ano a mais do que o PIB, em média. E vai continuar crescendo porque a população está vivendo mais (ou seja, recebe o benefício por mais tempo) e há menos gente entrando no mercado de trabalho (já que o crescimento populacional caiu drasticamente nas últimas duas décadas). A projeção que consta na lei orçamentária é que o gasto previdenciário chegará a 17% do PIB em 2060, o que equivale a quase 100% dos gastos da União atualmente. Lembrando que o problema também existe nos sistemas próprios de previdência dos estados e municípios.

Como esse crescimento leva a uma combinação de alta de impostos e corte de investimentos, seu efeito é reduzir o crescimento do país no longo prazo. O Ministério da Fazenda estimou que, só em 2018, a falta da reforma comeria 0,15 ponto percentual do PIB: em vez de crescer 3%, cresceríamos 2,85%. Por coincidência, a pesquisa semanal que o Banco Central faz com instituições financeiras mostra que está havendo uma correção para baixo na expectativa de crescimento para este ano e ela já está em 2,8%.

Há outros fatores influenciando a revisão, claro. Os números da economia real estão vindo piores do que o esperado, o consumo está crescendo pouco (o emprego formal está crescendo devagar e os juros ao consumidor continuam altos), e o investimento não está reagindo de forma muito rápida porque ainda há bastante capacidade ociosa na economia. Mas a falta de uma consolidação no cenário fiscal de longo prazo tem seu peso sobre essa revisão.

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