O programa do PT para a economia é o que prega a intervenção mais forte no sistema bancário. O partido quer aumentar impostos de bancos que têm taxas de juros mais altas e multá-los se eles não seguirem a ordem do governo de baixar os juros. Agrada quem acha que o povo deve domar o poder dos bancões, mas na verdade a ideia é o contrário disso. Ela vai prejudicar os mais pobres.
São vários os programas de governo que pregam algum tipo de medida para baixar os juros. Os mais pragmáticos falam em regras específicas para fintechs poderem competir, ou em reformas que melhorem as garantias no mercado – lei de falências, cadastro positivo e afins. É uma continuação do que está sendo feito.
Para alguns candidatos, isso não basta. E o exemplo mais detalhado é o programa do PT, que traz medidas concretas de punição aos bancões. E aí o partido erra feio. O que aconteceria com as medidas defendidas pelo petista Fernando Haddad seria a expulsão dos mais pobres do mercado de crédito, ou seu confinamento nas linhas de crédito mais caras.
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Isso aconteceria porque o diagnóstico do PT está errado. O partido parte do princípio de que os bancos ganham demais com os juros, mas um relatório divulgado em junho pelo Banco Central contraria essa tese. O BC estima que 14,9% do custo do crédito está nas margens dos bancos. A inadimplência é o principal fator, respondendo por 37,4% do custo, seguida da despesa administrativa (25%) e dos tributos e contribuições (22,8%).
Portanto, não bastaria aos bancos baixar os lucros para evitar impostos mais altos propostos pelo PT. Eles teriam de fechar a conta de outra forma e a mais fácil é reduzindo a inadimplência. Como? Tornando a concessão mais rigorosa nas linhas em que tivessem de baixar as taxas à força. Os cidadãos mais pobres e com menos garantias seriam os primeiros afetados.
É claro que o sistema bancário poderia ganhar mais eficiência e reduzir margens se conseguir melhorar, por exemplo, sua comunicação com os clientes. Para isso, o estímulo para o o aparecimento de fintechs, com modelos de negócios mais enxutos, é mais eficiente do que ameaçar os bancos.
Para os mais ricos, esse debate é indiferente. Eles já usam serviços bancários de custo mais baixo, oferecidos por um número bem maior de instituições, e não têm os juros do cartão de crédito como um problema do dia a dia.
Outro aspecto ignorado pelo programa petista é que os bancões não dependem exclusivamente do serviço de crédito para seus resultados. Na verdade, como lembrou em um artigo recente o economista Marcos Lisboa, os bancos têm lucro com outros braços além do varejo, com seguradoras, corretoras e gestoras de ativos. O discurso de que os lucros bilionários são efeito direto dos juros altos é demagógico e não toca nos problemas reais.
O debate sobre os juros ao consumidor evoluiu bastante nos últimos dois anos com a gestão de Ilan Goldfajn no Banco Central. Foi criado um sistema para reduzir as bolas de neve dos cartões de crédito e as fintechs foram aceitas de uma forma bem flexível para serem reguladas na sequência. O BC continua defendendo a melhora do arcabouço legal, como a aprovação do cadastro positivo.
É verdade que tanto o BC quanto o Cade poderiam ter percebido melhor os efeitos da concentração dos bancos de varejo, negando a concretização de negócios que reduziram as opções ao consumidor para cinco grandes instituições. Agora, no entanto, não existe saída melhor do que esperar que apareçam novas opções ao consumidor – afinal, apesar da concentração, o sistema bancário brasileiro atravessou bem a última crise econômica e seria um risco desnecessário forçar uma pulverização do mercado.