O anúncio de que o presidente Jair Bolsonaro liberou uma proposta de reforma da Previdência com idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres dissipou as dúvidas sobre a vontade do presidente de fazer mudanças que levem a uma economia significativa nos gastos públicos. Saiu da mesa a ideia de idades mínimas de 62 e 57 anos, como ele havia falado em entrevistas.
Além disso, a transição proposta é rápida, de até 12 anos. Esse, no fundo, é o ponto mais significativo da decisão divulgada na quinta-feira (14). No texto de reforma aprovado na comissão especial da Câmara durante o governo Michel Temer, já havia a previsão de idade mínima de 65 e 62 anos, mas o tempo de transição era mais longo, de 20 anos.
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O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem falado em gerar uma economia de R$ 1 trilhão em uma década. Esse número ainda precisa ser comprovado pelo restante do projeto de reforma. O próprio Guedes deixou escapar que esse montante de economia pode ser em 15 anos, o que deixaria o projeto em uma posição intermediária entre o que foi proposto por Temer e o que foi aprovado na comissão da Câmara. O ideal, no entanto, é que o texto saia do Palácio do Planalto com uma economia maior na primeira década, contribuindo de forma mais acentuada para a redução do endividamento público.
O governo deixou escapar vários balões de ensaio sobre o que seria o projeto da reforma e ainda existem pontos importantes para se saber se a economia será grande o suficiente para pelo menos estabilizar o crescimento do déficit. É bom lembrar que ninguém espera uma proposta que elimine o déficit, pelo menos por mais uma geração. Os números explicam: no ano passado, o déficit total da Previdência foi de R$ 285,5 bilhões, sem contar estados e municípios. Uma economia de R$ 1 trilhão em uma década, ou R$ 100 bilhões por ano em média, elimina apenas um terço do déficit atual (essa é uma conta simplificada só para dar uma dimensão do que está se propondo na reforma, já que a economia é em relação ao cenário sem reforma ao longo dos próximos anos).
Aparentemente, algumas coisas vão cair antes de o texto ser apresentado na próxima semana. O ministro Paulo Guedes gostaria de aproveitar o momento para lançar o sistema de capitalização, que usa contas individuais para fazer uma poupança para a aposentadoria, e a carteira de trabalho verde e amarela, que retiraria trabalhadores jovens da regulação da CLT. São dois pontos com grande chance de elevar o ruído na tramitação no Congresso. O primeiro, porque muda o teto do INSS para os jovens. O segundo, porque cria uma duplicidade de direitos difícil de vingar na Justiça. Nenhum dos dois é essencial para lidar imediatamente com a bomba-relógio dos gastos previdenciários.
Há pelo menos outros nove pontos para confirmarmos a intenção de encarar de frente a realidade da Previdência:
Regra de transição
O último balão de ensaio do governo é a possibilidade de haver três regras para calcular a aposentadoria durante a transição. Além de confusa, essa solução pode até elevar o gasto em um primeiro momento, principalmente se houver a manutenção de aposentadorias integrais por pontos (que na prática é uma variação do sistema 85/95 já em vigor). O ideal é que haja um pedágio sobre o tempo de contribuição de quem já está perto de se aposentar, com o cálculo feito pelo fator previdenciário. Com isso, trabalhadores mais jovens, mas perto da aposentadoria por contribuição ficariam mais tempo no mercado de trabalho e teriam o benefício ajustado por sua longevidade. Além disso, é preciso impor uma idade mínima que aumenta ao longo do tempo. Esse era o modelo na reforma original do governo Temer.
Regra de cálculo
O valor pago na aposentadoria depende da regra de cálculo que o governo vai propor. Atualmente, levam-se em conta as 80% maiores contribuições. Incide o fator previdenciário para quem não se encaixa na regra 85/95 (que garante aposentadorias integrais). O texto que passou na comissão permitia aposentadoria integral com 40 anos de contribuição, menos do que os 49 exigidos na proposta original da equipe de Temer – e que tinha ainda a conta sobre 100% das contribuições. A economia será maior se for mantida a conta sobre a média de todas as contribuições. Resta saber qual vai ser a exigência para que o benefício seja integral.
Tempo de contribuição
Hoje, é possível pedir aposentadoria por idade com 15 anos de contribuição. A proposta original de Temer previa 25 anos, mas a comissão voltou o tempo para 15 anos. A minuta de reforma que vazou em janeiro falava em 20 anos. Aqui, o melhor modelo é o que exige mais contribuições, com uma transição que até pode ser mais longa do que a da idade mínima. É uma forma de incentivar o recolhimento ao INSS.
Categorias especiais
O que vai acontecer com policiais, professores e outras categorias que se aposentam antes? Essa questão levantou uma oposição ferrenha no Congresso e é provável que o texto da reforma já venha com uma proposta que dá tratamento especial, como aprovado em comissão: 55 anos para policiais civis e federais, e 60 anos para professores. Não haveria economia extra aqui.
Idade mínima do funcionalismo
Outra questão que minou a tramitação do texto no governo Temer foi a idade mínima do funcionalismo. A proposta era para uma elevação imediata dos atuais 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, para a regra 62/65 anos. A razão para não haver transição é o fato de a grande maioria dos servidores que seriam beneficiados pelo mecanismo se aposentarem com um benefício equivalente ao último da ativa, integral e com paridade. O argumento da equipe de Temer é justo: para um benefício sem equivalente na iniciativa privada, é preciso exigir mais imediatamente.
Contribuições
O governo Temer tentou elevar a alíquota de contribuição do funcionalismo de 11% para 14%. Seria uma forma de acelerar o equilíbrio financeiro do sistema, que no fim paga benefícios melhores que na iniciativa privada. É possível que a equipe de Guedes tente um sistema único, para servidores e trabalhadores da iniciativa privada, no qual a alíquota máxima passe a ser de 14%. Seria um caminho para fazer o ajuste também pelo lado da receita.
Militares
Os militares ficaram de fora da primeira proposta e agora o governo promete mandar um projeto separado. A meta é impor uma idade de 55 anos para os militares entrarem para a reserva, com um aumento na contribuição de 7,5% para 11% sobre o soldo – pouco, ainda, diante dos 14% pretendidos para o resto do funcionalismo. Seria um avanço importante se fosse apresentado em conjunto com o resto da reforma.
Aposentadorias rurais
Na tramitação do projeto de Temer, as mudanças na aposentadoria rural foram retiradas do texto. Uma economia na casa do trilhão em uma década só é possível se houver uma revisão profunda nesse item, que é o maior responsável pelo déficit atualmente. Um projeto bem feito precisa prever contribuições individuais e o recolhimento por empresas exportadoras do agronegócio.
BPC
Houve uma tentativa, também derrubada no Congresso, de se elevar a idade mínima para o cidadão requerer o benefício de prestação continuada (BPC). Esse é um benefício para pessoas pobres que não conseguiram recolher para o INSS e paga um salário mínimo. A minuta que vazou em janeiro falava na criação de um sistema com pagamento a partir dos 55 anos, mas abaixo do salário mínimo. O mais provável é que, se quiser gerar economia neste ponto, o governo imponha um redutor em relação ao salário mínimo. O tema também pode ser debatido fora da reforma da Previdência, já que é um gasto assistencial e não previdenciário.
Pensões
A equipe de Paulo Guedes quer manter as restrições para o acúmulo de pensões e aposentadorias, além de impor limites mais rígidos na concessão de pensões. É provável que a proposta fique próximo do que já está no Congresso, com redução de 50% na pensão (mais adicionais por dependente) e limite de acúmulo até dois salários mínimos.
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