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(Rovena Rosa/Agência Brasil)
(Rovena Rosa/Agência Brasil)| Foto:

Uma brecha na Lei Eleitoral estimulou a ascensão de uma série de prefeitos milionários nas eleições de 2016. Sem as doações de empresas nem financiamento público e livres para fazer autodoações, empresários investiram pesado nas suas próprias campanhas, financiando a maior parte das despesas – em alguns casos acima de 90% do caixa. Entre os maiores doadores estão os prefeitos de São Paulo, João Dória (PSDB); e de Betim (MG), Vittorio Medioli (PHS); com R$ 4,4 milhões cada um. Medioli bancou do próprio bolso 99,9% das despesas da sua campanha. Fez mais votos que os seus 10 concorrentes juntos e foi eleito no primeiro turno. Dória foi mais comedido, cobrindo  pouco mais de um terço dos gastos. Os dois também estão entre os prefeitos com maior patrimônio declarado: R$ 179 milhões no caso de Dória e R$ 352 milhões no caso de Medioli.

Pelas normas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o candidato podia usar recursos próprios em sua campanha até o limite de gastos estabelecido para o cargo que disputou. O tribunal fixou um teto para cada município. Isso significa que o candidato podia doar até 100% do valor máximo da sua campanha.

As eleições municipais de 2016 foram um laboratório para as campanhas sem doações de empresas. O desequilíbrio provocado pelas doações com recursos próprios está sendo discutido no âmbito da reforma políticas em andamento no Congresso. Sem uma regulamentação que estabeleça alguns limites, esse tipo de autofinanciamento estará aberto para vagas na Câmara e no Senado, nos governos estaduais e na presidência da República.

“Só quem tem dinheiro”

O prefeito de São Carlos (SP), Airton Garcia (PSB), tem o maior patrimônio registrado no TSE – R$ 439 milhões. O valor dos seus bens é mais de mil vezes maior do que o do seu adversário na eleição. Entre os bens dos políticos milionários há carros de luxo, obras de arte, lanchas, aviões, mansões, fazendas, construtoras, mineradoras e também algum dinheiro vivo para emergências.

Levantamento feito pela Gazeta do Povo nos 309 maiores municípios – com mais de 100 mil habitantes – mostra que em 53 deles os eleitos financiaram mais da metade da sua campanha.

O empresário Hildo de Lima Chaves (PSDB) disputou o primeiro cargo público em 2016. Com patrimônio declarado de R$ 11,2 milhões, colocou R$ 1,7 milhão na própria campanha (76% do total). Assegurou uma vitória apertada no primeiro turno, com diferença de apenas 1% dos votos. No segundo turno, alcançou 65% do eleitorado.

Agora é prefeito de Porto Velho, mas critica o autofinanciamento de campanha: “Acho um absurdo. Isso é um retrocesso na democracia brasileira. Nós voltamos a 1824, quando foi criado o voto censitário, onde só os cidadãos a partir de uma determinada renda podiam votar. Agora temos a ‘candidatura censitária’. Por essa regra, só pode ser candidato quem tem dinheiro”.

Os milionários

A campanha do prefeito de São Paulo arrecadou um total de R$ 12,4 milhões. Sem considerar o que tirou do seu próprio bolso, seriam R$ 8 milhões – pouco acima da campanha de Fernando Haddad (PT), que ficou em segundo lugar e recebeu R$ 7,6 milhões em contribuições eleitorais. O patrimônio declarado do petista é de R$ 451 mil. O seu maior bem é 26% de uma casa no Planalto Paulista, no valor de R$ 183 mil.

Dória tem duas empresas avaliadas em R$ 72 milhões, uma mansão no Jardim América no valor declarado de R$ 12,4 milhões e muitas obras de arte – 165 pinturas e 48 esculturas no valor de R$ 32,6 milhões. Tem ainda um Porsche Cayenne ao preço de R$ 216 mil.

A campanha de Medioli ficou quatro vezes mais cara do que a do seu adversário mais próximo, Ivair Nogueira (PMDB), que teve um caixa de 1 milhão. O peemedebista também fez autodoações, no valor de R$ 923 mil, mas ficou longe do investimento do prefeito eleito. Coincidentemente, o número de votos do vencedor também superou em quatro vezes o do segundo colocado – 119 mil a 30 mil.

A maior empresa de Medioli, um italiano naturalizado brasileiro, é a Vime Participações, com valor declarado de R$ 285 milhões. Tem ainda a Sempre Editora, avaliada em R$ 63 milhões, que edita o jornal O Tempo em Belo Horizonte.

O prefeito de Palmas, Amastha (PSB), financiou 91% da própria campanha. Foram R$ 4,3 milhões de um total de R$ 4,7 milhões arrecadados. Não é muito para um patrimônio de R$ 21 milhões. O curioso é que 77% dos seus bens declarados correspondem a 12 empréstimos feitos a várias pessoas – a maioria parentes. Ele também tem um saldo de R$ 4,5 milhões em caixa.

Seu concorrente, o ex-prefeito Raul Filho (PR), também tem muitos bens, avaliados em R$ 12,2 milhões. A fazenda Varjão, de 5,5 mil hectares, vale R$ 4,8 milhões. As 2 mil cabeças de gado valem mais R$ 2 milhões. Mas colocou apenas R$ 897 mil na campanha, que custou R$ 1,2 milhão.

Política e futebol

Outro empresário recém chegado à política é Alexandre Kalil (PHS), mais conhecido como ex-presidente do Clube Atlético Mineiro. Com patrimônio declarado de R$ 2,7 milhões, bancou R$ 2,2 milhões do seu caixa de campanha, que ficou em R$ 3,5 milhões. Venceu a disputa para prefeito de Belo Horizonte com 53% dos votos, superando o veterano da política João Leite (PSDB). A campanha do tucano foi até mais cara – R$ 3,9 milhões –, mas não saiu um centavo do seu bolso. O PSDB custeou mais da metade dos seus gastos eleitorais.

Entre os bens de Kalil destacam-se uma lancha no valor de R$ 138 mil, quatro motos Harley Davidson avaliadas num total de R$ 240 mil e uma Land Rover de R$ 351 mil. Seu negócio é a construção civil. Tem quotas de capital das empresas Erkale e Fergikal no valor declarado de R$ 351 mil. Os bens declarados de Leite, como apartamento nos bairros Floresta e Sion e até em Orlando (EUA), somam R$ 1,7 milhão.

O mais rico entre os candidatos, o prefeito de São Carlos (SP), Airton Garcia, bancou 92% da sua campanha, que custou R$ 839 mil. O seu patrimônio também é curioso. Dos R$ 439 milhões declarados, R$ 420 milhões correspondem a valore atualizados das cotas de capital e imóveis registrados no TSE. Os valores individuais dos seus bens permanecem desatualizados. A Terra Negócios Imobiliários tem valor de R$ 8,3 milhões. Já a Mineração Vale do Araguaia vale míseros R$ 409 mil.

Mas o patrimônio de seus adversários é ainda menor. Netto Donato (PMDB), com bens no valor de R$ 254 mil, colocou R$ 175 mil na própria campanha (63% do total). Ele é dono da metade de um terreno – bem avaliado em R$ 137 mil – e de um Fiat Idea. Bragatto (PV) tem uma pequena frota: um Fiat 2005 (R$ 30 mil), um Prisma 2007 (R$ 18 mil) e um Corsa 2005/2006 (R$ 20 mil). Juntos, os dois não alcançaram os 48,9 mil votos de Garcia.

(Rovena Rosa/Agência Brasil)

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