As despesas com seguranças, assessores, diárias, passagens, carros oficiais e cartões corporativos de ex-presidentes da República já somam R$ 36 milhões, em valores atualizados pela inflação, desde 1999. O maior gasto em um ano foi feito por Dilma Rousseff (PT) em 2017 – R$ 1,4 milhão. Fernando Collor, atual senador pelo PTC, acumulou o valor que recebeu como ex-presidente durante 11 anos – R$ 8,3 milhões – com os benefícios e mordomias do Senado Federal, que incluem cerca de 80 assessores. Nesse período, ele usou R$ 3,1 milhões da cota para exercício do mandato, o “cotão”.
Os maiores gastos de Dilma foram com diárias e passagens para assessores, um total de R$ 850 mil no ano passado. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem um gasto médio de R$ 1 milhão por ano, como mostrou reportagem publicada no último dia 5 por este blog. Foram R$ 7 milhões destinados ao petista desde 2011. O ano de maior gastança de Lula foi 2014, com R$ 1,24 milhão, sendo R$ 750 mil com passagens e diárias. Essas despesas já somam R$ 4 milhões desde que ele deixou a Presidência.
No dia 23 de janeiro, véspera do julgamento no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Lula chegou ao comício em Porto Alegre numa comitiva de quatro carros de luxo e vários seguranças (foto abaixo). A assessoria do ex-presidente afirmou à reportagem que as despesas com os carros foram pagas pelo Partido dos Trabalhadores. E acrescentou que o Lula “costuma estar acompanhado em atos públicos dos seguranças que a lei define que devem acompanhar ex-presidentes da República”.
Segundo a Presidência da República, não há na legislação nada que impeça que Lula mantenha as mordomias de ex-presidente mesmo que seja preso após a condenação em segunda instância na Lava Jato. A reportagem perguntou à assessoria do ex-presidente se ele pretende manter ou renunciar aos benefícios mantidos pela Presidência. A resposta foi evasiva: “o ex-presidente não fez nenhuma manifestação sobre essa lei quando era presidente ou depois”.
As mordomias do “caçador de marajás”
Conhecido como o “caçador de marajás” durante a campanha a presidente da República em 1989, Fernando Collor aderiu às mordomias que o poder oferece. A maior despesa feita pelo ex-presidente foi com seguranças e assessores – R$ 5,8 milhões. Cada presidente tem direito a oito servidores de livre nomeação, sendo dois motoristas, e dois carros oficiais. Curiosamente, o maior gasto de Collor no Senado foi com a segurança da sua residência, um total de R$ 1,6 milhão em sete anos.
As mordomias do Senado são fartas. No ano passado, ele gastou R$ 344 mil do “cotão”, sendo R$ 264 mil com segurança, mais R$ 61 mil com correios e R$ 20 mil com viagens internacionais. A cota para exercício do mandato inclui despesas com restaurantes, hospedagem, divulgação, serviços de apoio. Com 86 assessores em seu gabinete neste ano, ele ainda mantém os oito servidores pagos pelo Palácio do Planalto. A folha de pagamento do gabinete supera os R$ 500 mil. Apesar de tudo, ele teve a menor média de gastos anual – R$ 463 mil por ano.
Questionado pelo blog, o senador Collor não respondeu até a publicação desta reportagem.
José Sarney também acumulou os benefícios de ex-presidente com as regalias do mandato de senador, de 1999 a 2014. Ele gastou um total de R$ 8,8 milhões em 18 anos. As despesas mais pesadas foram em 2013 e 2014, quando chegaram a R$ 680 mil – em valores atualizados. Ele usava muito pouco do “cotão” e mantinha um corpo de 35 assessores no seu gabinete pessoal. Somente a partir de 2011 o ex-presidente passou a gastar com diárias e passagens pagas pela Presidência da República, mas em valores reduzidos comparados com os demais.
Questionado sobre as despesas do ex-presidente Sarney, o assessor Pedro Costa afirmou que, “ao contrário do que pode parecer, essas despesas devem-se essencialmente a salários pagos aos servidores que atendem os ex-presidentes. Posso lhe garantir que não há, no caso do presidente Sarney, nenhuma despesa suntuário: elas se limitam, além das remunerações dos servidores, a cobrir veículos, com manutenção e combustíveis. Não há nenhum recurso recebido diretamente pelo presidente”.
A nota acrescenta que “os servidores são necessários para dar apoio ao presidente. Ao contrário do que pode parecer aos que não conhecem o que ele chamou de ‘liturgia do cargo’, suas inúmeras atividades exigem providências de natureza diversa. Posso lhe garantir que todos, inclusive eu, trabalhamos efetivamente”, completou Costa.
Um ex-presidente pelo mundo
As despesas com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso desde 2003 somam cerca de R$ 10 milhões em valores atualizados – uma média de R$ 716 mil por ano. A maior parte – R$ 8 milhões – foi gasta com seguranças e assessores. Ele viaja ao exterior a cada três meses, em média. Participa de várias organizações internacionais e comparece a reuniões e seminários. Faz palestras em universidades e mantém correspondência com líderes estrangeiros. Tem sempre dois diplomatas na sua equipe de assessores.
A sua assessoria cita grupos internacionais que o ex-presidente integrou, como The Elders, Drug Policy Comission of the Un e o Club de Madrid. Pertence ainda ao Foro IberoAmerica (fundado por Gabriel Garcia Marquez e Carlos Fuentes), juntamente com Ricardo Lagos e Felipe Gonzalez, e ao Conselho da Fundação Champalimaud e ao Berggruen Institute.
Em nota enviada ao blog, a assessoria descreve uma “viagem típica” de FHC: “Em novembro passado, quando foi a Washington, falou no Wilson Center e no Interamerican Alliance. Tomou café da manhã com Luís Almagro, da OEA. Foi para New York, onde deu palestra para mil alunos, junto com Albert Fishlow. No dia seguinte, foi para Providence, Rhode Island, onde assistiu o anúncio do Fernando Henrique Cardoso Graduate Fellowship in the Social Sciences, com doações privadas que chegaram a US$ 4 milhões”.
Maria Helena Gasparian, diplomata, conselheira, afirma que nenhum segurança acompanha o ex-presidente nas viagens. Ele viaja para o exterior na classe econômica, “de acordo com as regras da Presidência. Nenhum custo do deslocamento do presidente é debitado da Presidência. O presidente não tem pensão como ex-presidente. Tem só a pensão de ex-professor da USP”.
Dilma no exterior para falar do “golpe”
A ex-presidente Dilma tem realizado inúmeras viagens ao exterior a convite de universidades, organizações não-governamentais, instituições internacionais e partidos políticos “para falar sobre a realidade brasileira, em especial, o golpe parlamentar de 2016 e suas consequências para a democracia”, diz nota da sua assessoria.
Segundo a nota, “há um grande interesse no processo pelo qual foi afastada da Presidência por meio de um impeachment sem crime de responsabilidade. Ao mesmo tempo, a continuidade da crise política e a adoção de uma agenda com propostas que não foram endossadas pelo voto popular nas eleições de 2014 e as eleições em 2018 atraem muita atenção neste mundo onde a internet torna todos os acontecimentos acessíveis”.
A ex-presidente esteve em várias cidades da Europa, dos Estados Unidos e da América do Sul. “Cabe esclarecer que os custos relativos às passagens, à estadia e ao transporte da ex-presidenta são inteiramente assumidos pelas universidades e organizações que convidam, portanto, sem ônus aos cofres públicos. De acordo com a legislação brasileira, a ex-presidente tem direito à segurança e assessores, assim como todos os ex-presidentes. Seus deslocamentos, ao contrário daqueles da ex-presidenta, são custeados pelo Estado brasileiro”.
Quando chegou, já era assim
Questionado pela reportagem sobre a elevação de gastos com diárias e passagens num ano eleitoral, 2014, a assessoria do ex-presidente Lula afirmou que “a participação em eventos eleitorais é coberta pela campanha eleitoral, isso inclusive está na prestação de contas das campanhas. O ex-presidente não tem direito a verbas. Os gastos cobrem as atividades da equipe de segurança do ex-presidente, de acordo com a lei”.
A reportagem perguntou se Lula considera adequado que ex-presidentes tenham benefícios como seguranças, motoristas, cartões corporativos, carros oficiais, num momento em que o governo federal enfrenta grave crise financeira e fiscal. A sua assessoria respondeu: “A lei que define o apoio a ex-chefes de Estado foi feita em 1991 e alterada pela última vez em 2002, pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que adicionou dois assessores aos ex-presidentes. O ex-presidente não alterou a lei, nem ela foi criada no seu governo”.