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Deputado ‘doa’ computadores da Câmara para sua base e os entrega em ano eleitoral

Giacobo, responsável pela administração da Câmara: prioridade para doações ao Paraná, base eleitoral do deputado. Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados (Foto: )

Municípios do Paraná receberam quase metade dos computadores “inservíveis” doados pela Câmara dos Deputados em 2017 – foram repassados ao estado R$ 1,77 milhão em equipamentos de um total de máquinas doadas avaliadas em R$ 4 milhões. Parte desses computadores, conseguidos com o apoio do primeiro-secretário da Casa, deputado Giacobo (PR-PR), foi entregue em 2018, ano eleitoral. Os equipamentos foram anunciados como seminovos. Os processos mostram a prioridade para o atendimento às prefeituras paranaenses.

A que lei que regulamentava essas doações (99.658/1990) previa a doação a estados e municípios “mais carentes”. Mas foram atendidos municípios como Pato Branco (4.º melhor IDH do Paraná e 34.º do país – 0,849) e União da Vitória (35.º IDH do estado e 738.º do país – 0,793). A maioria dos municípios paranaenses contemplados tem IDH muito acima da média nacional ou estadual. Apenas no dia 25 de julho de 2017, 20 municípios do Paraná foram agraciados com computadores da Câmara.

O deputado Giacobo, responsável pela administração da Câmara, também conseguiu a doação de um tomógrafo avaliado em R$ 440 mil para o município de São Miguel do Iguaçu (PR) – o 68.º mais rico do Paraná. No seu Facebook, ele informou, em 25 de janeiro de 2018 a chegada do equipamento à cidade paranaense no dia anterior. E fez a sua autopromoção: “O tomógrafo foi doado ao município através de indicação do deputado Fernando Giacobo. O aparelho tem apenas dois anos de uso”.

A Constituição federal, no seu artigo 37.º, inciso XXII, diz que a publicidade dos atos dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes ou imagens que “caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos”.

Prioridade para o Paraná

Em ofício enviado ao deputado Giacobo em 22 de agosto de 2017, o deputado Édio Lopes (PR-RR) solicitou a doação de 50 computadores para equipar escolas nas comunidades indígenas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Em março de 2018, o diretor-geral da Câmara, Lúcio Xavier, informou da impossibilidade de atender ao pedido do deputado para doação de computadores para as prefeituras de Uiramutã, Rorainópolis, Caracaraí, e Normandia, autorizada pela presidência da Casa em 27 de dezembro, em razão da autorização ter chegado àquela unidade técnica “sem tempo hábil para os procedimentos necessários ainda no ano de 2017, uma vez que a Lei n. 9.504/1997 veda a possibilidade de doações em ano eleitoral”.

Mas, em data posterior ao pedido negado, em 28 de novembro de 2017, o prefeito da cidade paranaense de União da Vitória, Hilton Roveda, solicitou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a doação de 50 notebooks. Em 12 de dezembro (apenas duas semanas mais tarde), o deputado Giacobo autorizou a doação de 20 computadores para a prefeitura de União da Vitória. Não houve a mesma agilidade para o atendimento de municípios como Uiramutã, 87.º município mais pobre do país, com IDH de 0,542 – quase o mesmo de Papua Nova Guiné, país da Oceania onde um terço da população vive em situação de extrema pobreza.

Outro pedido foi encaminhado a Giacobo em 12 de setembro de 2017. O Centro Maria Fernandes, de Boa Vista, capital de Roraima, solicitou à Câmara a doação de 25 computadores e 25 impressoras. Em março de 2018, o diretor-geral da Câmara, Lúcio Xavier, respondeu que, quando a matéria alcançou a unidade técnica responsável pelo seu processamento, “não houve tempo hábil para notificar a requerente no exercício de 2017, mormente em razão da exiguidade de tempo e do grande volume de processos de doação em tramitação nesta Casa à época”.

“Computadores doados pelo deputado”

Em 21 de abril de 2018, ano eleitoral, o deputado divulgou na sua página na internet a entrega de computadores em Chopinzinho (PR): “Escolas recebem computadores doados pelo deputado Fernando Giacobo”.

Os equipamentos foram conseguidos a partir de contatos de quatro vereadores, entre eles Leônides Moser. “São computadores seminovos, de primeira qualidade, que irão auxiliar muito no trabalho das escolas. Só temos que agradecer ao deputado”, disse Moser em nota divulgada no site da Câmara de Chopinzinho.

A Lei Eleitoral veda a distribuição de bens em ano eleitoral. O artigo 73, parágrafo 10, da Lei 9.504/97 deixa claro: “No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública e de estado de emergência”.

Em 10 de janeiro de 2018, o município de Rolândia recebeu a doação de 60 computadores da Câmara no valor estimado de R$ 102 mil. O pedido feito ao deputado Giacobo pela vereadora Maria do Carmo. A vereadora acompanhou a chegada dos equipamentos. As caixas estavam cobertas por uma faixa: “A vereadora Maria do Carmo conquista doações de 60 computadores da Câmara Federal com o apoio do deputado federal Giacobo”. 

Câmara defende legalidade das doações

Questionada sobre a legalidade das doações de computadores, o fato de não terem sido priorizados municípios mais carentes e as entregas em ano eleitoral, a Câmara respondeu em nota oficial. “Os bens em condições de uso, mas declarados pelos órgãos técnicos da Casa como inservíveis, podem ter duas destinações: doação ou alienação por meio de leilão”.

Sobre as condições de uso dos equipamentos, afirmou: “Em geral, um microcomputador completa seu ciclo de vida útil em quatro anos. Após esse período, a reposição de peças é bastante dificultada e onerosa, especialmente em decorrência da obsolescência tecnológica, tornando sua manutenção, portanto, antieconômica”.

A Câmara também detalhou o processo de doação: “A doação de bens inservíveis pela Casa ocorre somente mediante provocação externa, mediante a protocolização de requerimento. O deferimento do pleito depende de prévia avaliação técnica e jurídica, observada a ordem de pedidos de doações e os princípios que regem a Administração Pública, em especial, os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. O ritmo de tramitação dos processos depende de fatores diversos, como a apresentação da documentação exigida por lei. Embora a análise dos pedidos observe a ordem de apresentação, as respostas não necessariamente obedecem a essa sequência”.

“Superado o ciclo de vida”

A nota diz que os equipamentos doados pela Câmara foram adquiridos em 30 de dezembro de 2011, “ou seja, possuíam mais de 48 meses de uso, restando, pois, superado o ciclo de vida útil, razão pela qual sua manutenção no acervo era antieconômica”.

Sobre a entrega de equipamentos em 2018, a Câmara respondeu que “vale registrar que, em observância ao § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/1997, todas as doações ocorreram no ano de 2017, não tendo havido qualquer doação no ano eleitoral de 2018”.

A Câmara acrescentou que, em 2017, foram doados equipamentos para órgãos do Legislativo e do Executivo de todas as esferas de Poder (municipal, estadual e federal), tendo sido beneficiadas entidades de 13 estados.

Em relação ao pedido de doação de computadores para escolas de comunidades indígenas e ribeirinhas de municípios de Roraima, a nota diz que o requerimento foi recebido em 2017, sobrestado em 2018, em razão do período eleitoral, e retomado em 2019, já contando, inclusive, com parecer jurídico favorável, expedido em 3/1/2019.

“O tomógrafo doado pela Câmara dos Deputados foi adquirido em 1996. Foi classificado como antieconômico e desativado após a sua substituição por outro mais moderno, em 2014. A Casa recebeu quatro solicitações para o aproveitamento do mesmo tomógrafo. Foi observada a ordem cronológica dos pleitos. Entretanto, os demandantes desistiram da doação por razões diversas, entre as quais o ônus do transporte e do serviço de instalação do equipamento”, conclui a nota.

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