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A partícula de Deus não tem mais onde se esconder
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Já tenho leitura obrigatória para o meu recesso de Natal: é The God Particle, de Leon Lederman. Tenho o livro faz tempo, e agora preciso lê-lo antes que fique desatualizado, afinal o assunto da semana no meio científico é o anúncio de que o Cern está encurralando o bóson de Higgs, a famosa “partícula de Deus”. Essas reportagens da Economist, da Scientific American, do Último Segundo, da New Scientist, do Guardian e da Gazeta do Povo (algumas delas escritas antes do anúncio de ontem) explicam o que é o bóson de Higgs muito melhor do que eu poderia sonhar em fazer, então recomendo as leituras.

Denis Balibouse/Reuters
O pessoal do Cern está empenhado em encontrar o bóson de Higgs, e todos esperamos que eles tenham sucesso.

Conta a história que Lederman, um prêmio Nobel de Física, queria chamar o livro de The Goddamn Particle, o que significa algo como “Maldita Partícula”, dado o infindável prazer que o bóson parece ter de fugir dos cientistas. O editor achou melhor tirar o “damn”, e deu no que deu. Desde que ouvi falar da partícula, achei que o apelido tinha a ver com essa propriedade que a partícula tem de atribuir massa a outras partículas, algo que tem um quê de “divino”. O autor do modelo que prevê o bóson, Peter Higgs, detesta o apelido (mas, vamos admitir, foi uma grande jogada de marketing), e só hoje fiquei sabendo que ele estava propondo, no bóson, uma espécie de “substituto” para Deus.

É aqui que a gente entra. O blogueiro Brad Hirschfield, do Washington Post, diz que o assunto certamente causará discussões no campo da relação entre ciência e fé, mas não vê nenhum tipo de ameaça na eventual descoberta do bóson de Higgs (e eu concordo plenamente com ele). “Ao encontrar a ‘partícula de Deus’, os cientistas seriam os primeiros a admitir que a história não acaba aí; que esta nova informação ajudará a explicar muitas coisas e abrir portas a novas e mais complexas questões”, afirma, acrescentando que seria bom que os crentes usassem essa abordagem para suas próprias crenças.

Hirschfield está se referindo à maneira como nosso entendimento das realidades sagradas vai mudando, e usa como exemplo a própria noção de Deus, que após séculos e séculos de pensamento teológico e controvérsias foi se refinando; por exemplo, do velho “Deus das lacunas”, que vai intervindo diretamente para causar esse ou aquele salto, passamos a entender um Deus cujo plano inclui um universo que se desenvolve “sozinho”, por assim dizer. E, quanto mais entendemos algo, mais nos maravilhamos e mais perguntas aparecem (estou acompanhando um debate entre amigos, em uma lista de discussão, que é o melhor exemplo disso). É essa atitude tão própria da ciência que Hirschfield espera também dos religiosos — em outras palavras, a “fé adulta” que o então cardeal Ratzinger pedia aos católicos na célebre homilia da missa que abriu o conclave do qual ele saiu como Bento XVI.

(atualizado em 15/12) No Telegraph de hoje, o teólogo Alister McGrath faz outro paralelo interessante ao explicar por que o bóson de Higgs, mesmo sem ter sido ainda observado, virou algo que os cientistas hoje aceitam sem muita hesitação. Confiram esse trecho: “Os sábios nos dizem que [a ciência] é, na verdade, sobre oferecer as melhores explicações para aquilo que vemos, aceitando que essas explicações nem sempre podem ser comprovadas, e às vezes podem estar para além da comprovação. A ciência frequentemente propõe a existência de entidades invisíveis (e muitas vezes indetectáveis), como a matéria escura, para explicar o que pode ser visto. A razão pela qual o bóson de Higgs é levado tão a sério na ciência não é o fato de sua existência ter sido comprovada, e sim o fato de ele dar tanto sentido ao que observamos que sua existência parece certa. Em outras palavras, seu poder de explicar é visto como um indicador de sua veracidade.” Ele prossegue dizendo que Deus é um pouco como a Sua partícula: enquanto alguns exigem provas concretas, outros argumentam que “a existência de Deus providencia o melhor arcabouço para dar sentido ao mundo. Deus é como uma lente que deixa as coisas mais nítidas”, compara McGrath.

Finalista!
Semana passada o Prêmio Top Blog 2011 divulgou os blogs Top3 em todas as áreas. O Tubo de Ensaio será finalista na categoria “Religião-blogs profissionais” pelo voto popular, categoria em que foi o vencedor no ano passado; Já no júri acadêmico, que deu ao blog o terceiro lugar em 2010, desta vez o Tubo não entrou na lista da final. Os vencedores serão conhecidos neste sábado, em São Paulo. Independentemente do resultado, desde já quero agradecer a todos os que votaram no blog e fizeram propaganda!

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