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Lembro-me de um jantar num restaurante estrelado de Paris. Para começar, um belo Champagne vintage cuvée de luxo. O sommelier trouxe a garrafa, abriu e serviu para o anfitrião provar. Estava ao lado dele e vi que ficou em dúvida, mas ainda assim aprovou o vinho. Quando provei, percebi que estava bouchonée, com gosto de rolha.

Foi a maior surpresa, pois nunca havia visto um Champagne com esse defeito de garrafa. Não ia ser desmancha prazeres nem contrariar o anfitrião, fiquei quieto. Mas ele imediatamente cochichou-me ao ouvido: –Não notou algo estranho nesse Champagne ? Respondi-lhe, também confidencialmente: – Parece inacreditável, mas está bouchonée. Ele imediatamente chamou e mostrou ao sommelier, que provou, recolheu os copos , pediu desculpas e trouxe outra garrafa; desta vez perfeita!

Felizmente nos Champagnes e nos grandes vinhos a proporção de garrafas com esse defeito é muito baixa. Contudo, nos vinhos médios e mais simples, pode chegar a 5% do total, ou até um pouco mais, o que é inaceitável.

O sabor e odor a rolha, bouchonée em francês ou corked em inglês, é um defeito da garrafa, transmitido por uma rolha de cortiça defeituosa. Traduz-se na presença da substância TCA (tricloronisol), aparentemente inofensiva à saúde na proporção que aparece, mas destruidora dos sabores e aromas da bebida. O TCA é produzido por fungos da rolha na presença de clorofenol (resíduo, na rolha, de defensivos ou poluição industrial).

A intensidade desse defeito grave vai de tênue a intensa. Dá ao vinho um sabor a bolor, pano molhado sujo, e químico, além de abafar os aromas e sabores da bebida. Só piora com o tempo em copo e aeração do vinho. Uma garrafa com esse defeito deve ser rejeitada e sempre recebida de volta pelo fornecedor e trocada.

O problema é que rolhas de cortiça melhores e produzidas com maior controle de qualidade podem ser antieconômicas. Uma rolha premium custa na casa de US$ 2. O dobro do preço de uma garrafa de vinho de consumo corrente na origem.

Muitas vezes o vinho não justifica o investimento na rolha melhor; ou o produtor mais ganancioso prefere economizar onde não devia. Daí surgiram as rolhas alternativas: de borracha, de vidro, de plástico e a screw cap. Os produtos sintéticos vedam razoavelmente, mas por pouco tempo, e não deixam o vinho “respirar”, como permitem os microporos da cortiça.

De todas as alternativas, o screw cap tem se afirmado como a melhor. Já domina nas indústrias da Nova Zelândia, Austrália, e avança em todo mundo. São as cápsulas de rosca.

Mas a indústria da cortiça tem reagido e melhorado o controle de qualidade das rolhas. Sem falar que, em termos do charme do vinho e da guarda longeva, ainda não surgiu alternativa melhor que a cortiça, produto natural, extraído da casca dos sobreiros. A despeito dos novos pretendentes, a rolha de cortiça ainda é a rainha dos vedantes das garrafas de vinho.

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