O acordo entre governo e produtores de vinho para dar mais espaço ao produto nacional nas prateleiras, firmado após o anúncio governamental de não apoio à salvaguarda, divide opiniões — e não somente entre varejistas e importadores. Os consumidores também entraram na polêmica.
Muitos brasileiros dão preferência a rótulos estrangeiros, enquanto sommeliers e importadores alegam que o vinho nacional costuma ser mais caro que o importado de mesma categoria.
Pelo acordo com o governo, 25% das prateleiras dos supermercados deverão ser destinados aos vinhos nacionais. Nas lojas especializadas, a fatia será de 15%. Hoje, é necessário apenas 10% de vinhos nacionais. O objetivo é dobrar as vendas do produto até 2016, para 40 milhões de litros por ano. A medida foi uma contrapartida do governo para não sobretaxar vinhos importados, pleito do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin).
O advogado Castro Freire tem sempre em casa uma garrafa de vinho. Importada, já que não compra rótulos nacionais. Para ele, bons produtos saem de vinícolas do Chile. “Hoje, até no churrasco, bebo um vinho. Haver mais produtos nacionais nas lojas não vai mudar em nada o meu consumo”, disse o advogado.
Para o aposentado João Franzoni, os bons vinhos do Brasil são inacessíveis. “Já visitei vinícolas no Sul. Só assim para ter acesso a vinhos bons, que são caros e estão fora do mercado.”
A avaliação de Franzoni não surpreende a sommelier Cecília Aldaz. Para ela, os bons vinhos brasileiros custam mais do que similares importados. Em restaurantes, é possível encontrar um rótulo nacional por R$ 150 a R$ 200, ao mesmo tempo em que um vinho espanhol varia de R$ 80 a R$ 120. Uma diferença de até 87,5%.
“Há ótimos vinhos nacionais, mas são caros. E, por isso, dificilmente é vendido em restaurante. Se o cliente está disposto a gastar R$ 200 num vinho, não busca um brasileiro”, disse ela, acrescentando ainda que a crise na Europa deixa os preços ainda mais atraentes para os brasileiros. “Os rótulos europeus agora querem exportar mais.”
Especialistas lembram ainda que os melhores rótulos não são encontrados no varejo, mas apenas em restaurantes. Na briga nas lojas, os brasileiros perdem. Na delicatessen Zona Zen, em São Paulo, a proporção de rótulos nacionais é de 12%, e os espumantes respondem pela maior parte. Na loja do restaurante Salitre, também de São Paulo, dos 800 rótulos, 5% são nacionais. Entre os tintos, há o nacional Antonia Dias Tannat por R$ 80, mais caro do que um de qualidade similar Lucca Tannat (R$ 62), do Uruguai.
“O que atrapalha o mercado de vinhos nacional são os vinhos de baixa qualidade que chegam a um baixo custo, como os “Santas””, comentou Fred Schlesinger, da brasileira Dal Pizzol. Segundo a sommelier Deise Novakoski, há exemplos que podem ser comparados com rótulos de qualidade. Ela cita o chardonnay da Casa Valduga, comparável ao chardonnay chileno da Concha Y Toro (linha Trio). “A Miolo faz um merlot corretíssimo, comparável ao mesmo merlot argentino da Nieto Senetiner” disse.
O dono da Lidador, Joaquim Cabral, disse que na rede há duas ou três marcas de vinhos nacionais. Para ele, há pouca produção, o que eleva os preços. “Os nacionais são caros. Melhor: os bons vinhos nacionais são caros”. José Odara, dono da Symposium Bistrô, não acredita em efeitos na produção em decorrência da medida do governo. Para ele, os vinhos tintos brasileiros não são competitivos. “Já os espumantes têm qualidade.”
A participação dos vinhos nacionais aumenta na maioria dos supermercados. No Walmart, são 27% do total. No Mundial, 40%. Mas, no Zona Sul, os importados reinam: são 95%. Com os espumantes, a história é outra: 60% deles são nacionais no Zona Sul. “Para falar sobre vinhos de fora, é necessário considerar câmbio e impostos. Geralmente, vinhos similares custam três vezes mais no Brasil”, comentou Pietrangelo Leta, diretor comercial do Zona Sul.
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