Até os que sempre torceram o nariz para um prato de saladas passaram a ser adeptos das combinações que há mais ou menos dez anos começaram a invadir os restaurantes brasileiros. A popularização de ingredientes sofisticados e as inovações da cozinha contemporânea decretaram o fim da salada feita apenas de alface e algumas rodelas de tomate. “Hoje em qualquer restaurante é possível encontrar opções diferentes com molhos variados. Se não era comum consumir endívia e poucos sabiam o que era um aspargo, esses produtos agora estão bem acessíveis”, diz Joy Perine, chef do restaurante Zea Maïs.
A procura por uma alimentação mais saudável, somada a novas apresentações, contribuiu para que o prato ganhasse status de refeição principal e deixasse de ser apenas um complemento. “Existem as saladas verdes, que levam apenas folhas; as simples, com folhas e legumes; e as compostas, com proteína e carboidrato. Essas últimas são completas em sabor e nutrição”, explica Solange Schneider, professora do curso de Chef de Cuisine – Restaurateur do Centro Europeu.
O resultado da união entre saúde e paladar levou a uma espécie de “onda verde” em redes de fast food e delivery. Em Curitiba pelo menos cinco delas dão um lugar de destaque no cardápio ao prato. A mais recente, Salad Creations, uma franquia americana, é o primeiro fast food no Brasil exclusivo de saladas. O cliente tem a opção de escolher entre 15 molhos e 40 ingredientes para adicionar a um mix de folhas. “É a substitução do arroz com feijão por legumes, verduras e muitos outros ingredientes, entre carnes, queijos, frutas e grãos”, diz Fernando Bueno, um dos diretores da Salad Creations no Brasil.
Os vegetais e hortaliças também ganham espaço em restaurantes mais requintados que servem à la carte. As entradas ou couverts foram reforçados. Camarões, salmão, molhos com queijos especiais e até caviar. “A escolha dos ingredientes possibilita trabalhar de diversas formas. Folhas quentes e frias, tomates confitados ou gelados. O crocante de um pão, de um queijo, de um peixe, azeites e vinagres diferentes. As receitas tradicionais estão com um toque de modernidade”, completa Joy.
Mix de sabores
Apesar de os dicionários gastronômicos descreverem a salada como uma combinação de vegetais e hortaliças cortados e temperados, não há uma definição (ou limitação) do que pode compor este prato. Em geral as folhas verdes são a base, mas isso não é uma regra. Existem as frutas, como morango, kiwi, manga e abacaxi, que aparecem frescas, grelhadas, assadas ou nos molhos, e os grãos, em geral cozidos. “Imagine uma salada com quatro ou cinco tipos de grãos – trigo, arroz integral ou cevadinha, por exemplo –, uma posta de peixe grelhado na temperatura ambiente e um molho especial”, afirma Celso Freire, chef e proprietário do Restaurante Boulevard.
A professora Solange Schneider explica que a origem do termo remete ‘ao que é temperado com sal’. “Antigamente talvez houvesse a limitação de ser um prato frio. Depois das saladas compostas isso não existe mais”. O acréscimo de molhos cremosos e frutas oleaginosas – castanhas, nozes e amêndoas – faz com que o resultado final nem sempre seja um prato light. É o caso das receitas com batata e maionese e também de algumas das saladas consideradas clássicas: waldorf, grega, ceasar e caprese.
A origem da maioria delas é incerta, mas, de tão reproduzidas, as receitas encontradas atualmente em quase nada lembram as originais. A waldorf, nome que faz referência a um hotel norte-americano, onde o prato foi criado, originalmente só levava maçã, aipo e maionese. A receita atual leva nozes, creme de leite, alface, salsão e atum. O mesmo acontece com a ceasar salad, conhecida no mundo todo. Criada na década de 1920, era feita apenas com alface, parmesão e molho à base de anchovas, bem diferente da encontrada hoje. É uma forma de reinventar e adaptar os sabores ao paladar do brasileiro. “Nós não temos muitas saladas tradicionais. Como os ingredientes são simples, nada impede que você junte idéias e faça composições”, diz Freire.
Pelo mundo
No Brasil é comum a refeição começar pela salada, mas em alguns países europeus, como França ou Itália, ela é consumida do meio para o final. Mas não é só a ordem que muda. As receitas acompanham as peculiaridades da culinária de cada país. A caprese italiana, por exemplo, leva mussarela, tomate e manjericão, os mesmos ingredientes da famosa pizza marguerita.
Já na culinária árabe, além do tabule, conhecido mundialmente, os legumes aparecem em quase todos os pratos. “Toda mesa árabe acompanha alface, tomate, pepino, rabanete e cebola. Eles vêm sem tempero para comer com as pastas árabes de berinjela e de grão-de-bico”, explica Vaneska Berçani Rodrigues, sócia-proprietária e chef do restaurante Velho Oriente.
Outras saladas, de tão completas, podem servir de prato principal. É o caso do fatuche. “Todo mundo gosta. É feito com alface, tomate, rabanete, pepino com casca, cebola, hortelã, salsinha e o pão árabe cortado ou frito”, diz a chef. Os grãos também são muito utilizados: grão-de-bico, lentilha, fava e trigo cozidos e temperados com limão, alho e especiarias, o que deixa o sabor um pouco mais forte do que o das saladas americanas ou européias.
Nos países asiáticos, o uso de pimenta e óleo de gergelim também deixa os sabores mais exóticos. Para harmonizar, os molhos costumam ser adocicados. “São muito usados o broto de feijão e o de bambu, acelga, cogumelos em geral, principalmente shitake e shimeji, molho de ostras e frutos do mar. O que eles não usam muito é carne vermelha”, diz Mauro Dias da Costa, chef do Babilônia Gastronomia.
Vinagretes e molhos
Um molho saboroso pode ser a garantia do sucesso de uma salada. “É o principal, além do acompanhamento – a carne ou o grão bem temperado”, conta Ivan Rodolfo Lopes, chef do Terra Madre Ristorante.
Da combinação dos três ingredientes – sal, azeite e vinagre (ou limão) – saem quase todos os molhos cremosos e líquidos. Os chamados vinagretes são resultado da mistura dos três ingredientes básicos com outros complementares. Aquele molho encontrado em bufês é o chamado campanha (leva tomates, cebolas e pimentão picados, azeite e vinagre) e não tem relação com os vinagretes dos chefs. “Se juntarmos o vinagre e o azeite, que normalmente não se misturam, teremos uma base a partir da qual podemos fazer combinações variadas de molhos, desde os mais líquidos até os mais pesados e cremosos, que normalmente levam maionese ou ovo”, explica Celso Freire.
Os tradicionais, facilmente encontrados em supermercados, são simples de serem feitos. “Se não for fazer, é preferível usar o sal, vinagre e azeite de qualidade ou um vinagrete simples, que combinam com todos os tipos de saladas. Não indico os molhos prontos, porque o sabor nem sempre fica natural”, diz Ivan Lopes.
Na hora de harmonizar o mo-lho e a salada, é importante que os sabores não concorram. “A regra geral é que os pratos mais simples pedem molhos ou vinagretes simples e os mais elaborados combinam com um molho mais forte”, explica a chef e professora Solange.
Se a escolha for por uma salada de folhas escuras com um queijo forte, um molho adocicado cai bem. “É importante que a doçura contraste sempre com um sabor acentuado, para que não se sobreponha demais. O doce tira a acidez e pode diminuir até o salgado”, complementa. Na dúvida, o melhor mesmo é optar por combinações conhecidas – como o salmão com limão siciliano ou parmesão e vinagre balsâmico – e apostar na combinação de poucos ingredientes de cada vez.
Vinho ou água?
Não é fácil harmonizar os sabores de uma salada com bebidas. Dentre os vinhos, os brancos são os mais indicados por normalmente serem associados com couvert e entradas. Solange explica que é muito difícil combinar com vinhos saladas que levam vinagrete. “A acidez não combina com vinho. Mas as que não são tão ácidas podem ser combinadas até com espumantes”, diz. Folhas mais amargas, como endívias ou o radicchio também não harmonizam. “Quando houver muitos ingredientes, o melhor mesmo é pedir uma água.”
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