Minas Gerais é protagonista na expansão nacional da produção e consumo de cafés especiais. Os produtos produzidos por lá respondem pelo segundo maior faturamento em exportação do estado, perdendo apenas para o minério. No último ano, esse total alcançou a marca de US$ 6,9 bilhões. Dados fornecidos pela Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento de Minas Gerais (Seapa) evidenciam que o estado produz três vezes mais café que a Colômbia e responde por quase 20% da produção mundial.
A tendência do café especial mineiro tem sido conquistar paladares ao redor do mundo, fortalecendo posição no mercado internacional. Os principais destinos do produto incluem Estados Unidos, União Europeia e países da Ásia, como Japão e Coreia do Sul. A produção de café especial no Brasil deve chegar, de acordo com dados divulgados pela Associação Brasileira de Cafés Especiais, a 8 milhões de sacas. Quase 90% de toda a produção de cafés especiais no Brasil vem do sul de Minas.
Desses 8 milhões de sacas de cafés especiais, apenas 900 mil ficam no Brasil, enquanto as demais são exportadas.
De acordo com o diretor de Cadeias Produtivas da Secretaria de Agricultura de Minas Gerais, Julian Carvalho, o governo estadual tem trabalhado para promover o café especial, colaborando com os produtores. “Temos o programa Certifica Minas Café, que trabalha a parte sustentabilidade ambiental, social e econômica. Ele pega um prisma para adequar especialmente as exigências internacionais de sustentabilidade. Esse programa é gratuito para agricultura familiar”. Carvalho comenta também sobre o Circuito Mineiro de Cafeicultura, com 30 etapas para divulgar conhecimento sobre o café em diversas regiões do estado. “Um município polo é escolhido e o evento é montado com foco na demanda da região. É um evento de difusão de tecnologia, com seminários e palestras”.
Carvalho percebe com entusiasmo não apenas o desejo de mais pessoas produzirem um café de qualidade, como também uma percepção no comportamento do consumidor de café. “Temos sentido uma migração de pessoas tentando consumir cafés melhores. Até um tempo atrás, os bons cafés ficavam nas cafeterias. Hoje não. Você vê uma mudança de comportamento nos últimos 10 anos, vê os bons cafés chegando à gondola do supermercado. Vem também de um amadurecimento do consumidor, de adquirir produtos melhores. A gente viu isso com a cerveja e o vinho. Acredito que a gente tem muito potencial”, analisa.
Mesmo com o consumo de 21,3 milhões de sacas de café (não apenas os especiais) e sendo o segundo maior mercado de café do mundo - perde apenas para os Estados Unidos - estima-se que o Brasil é o responsável por adquirir apenas entre 5% e 10% dos seus próprios cafés especiais. Diversos fatores que explicam a opção dos brasileiros por um café de menor qualidade. O primeiro é o preço. Em Belo Horizonte, por exemplo, enquanto o pacote de 250 gramas de café tradicional ou extraforte, os mais comuns do mercado, custam entre R$ 5 e R$ 10, pacotes do mesmo tamanho de café especial raramente custam menos que R$ 20.
Experiência nos EUA inspirou início de investimento em BH
Membro da quinta geração de uma família de produtores de café, Júlia Fortini carrega o café no DNA. “Eu brinco que praticamente nasci debaixo de um pé de café”, comenta. Ela conta que viveu pela primeira vez a experiência de trabalhar com cafés especiais quando foi morar com os pais nos Estados Unidos e conseguiu um trabalho de verão, ainda na adolescência. “O ambiente de cafeteria sempre foi muito familiar porque meu pai me levava junto e a gente cresceu nesse ambiente. Com 12 anos fiz meu primeiro curso de barista e com 15 tive meu primeiro emprego”.
De volta ao Brasil, os pais de Júlia resolveram criar uma escola, a Academia do Café, na capital mineira, para orientar produtores no aprimoramento da qualidade do café. Na época, o assunto era pouco difundido no Brasil e a escola da família foi uma das pioneiras nesse tipo de formação. “A princípio eu não queria trabalhar com café porque não queria trabalhar com meus pais. Mas acabou que o café me puxou então eu comecei a trabalhar na Academia do Café. E é um caminho sem volta. Aí me apaixonei, fui buscando mais conhecimento, me profissionalizando como instrutora e em marketing, até que, em 2013, a gente abriu a cafeteria”, comenta. O empreendimento, que leva o mesmo nome da escola fundada pelos pais de Júlia, foi pioneira nesse segmento na cidade.
Os primeiros anos de cafeteria foram desafiadores. Com um público acostumado a um café mais forte e mais encorpado, as pessoas estranharam a nova forma de ver o café. "A forma que a gente servia foi como que eu conheci nos Estados Unidos. Então a gente tentou trazer um pouquinho dessa cultura da cafeteria. O pedido era no balcão exatamente para ter contato com o barista. A gente queria esse contato com o consumidor para ter a oportunidade de explicar sobre os grãos e os diferentes métodos”, conta Júlia, lembrando que nem sempre os consumidores ficavam convencidos.
“Tinha muita reclamação sobre a cor do café, sobre o tamanho do expresso, sobre o preço. A gente tentava contornar isso mostrando o valor, conversava com o cliente, mas alguns se recusavam a pagar ou simplesmente não davam abertura para conversar”, diz a barista.
Apesar dos problemas iniciais, eles não desistiram e esperaram por mudanças, que vieram. Belo Horizonte tem dezenas de cafeterias especiais e é nítida a mudança da cultura de parte do mercado consumidor. “Tem um cliente nosso que no início veio aqui, tomou um café e chamou de água de batata. Hoje ele vem toda semana para comprar nosso café e todo final de semana ele vem para tomar um café coado e mostrar para um amigo novo”, compartilha ela.
Multinacional especializada em cápsulas chega a Minas Gerais
A cadeia do café em Minas envolve a indústria e, no último mês de novembro, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais e o Invest Minas – agência de promoção de investimentos do governo estadual – anunciaram a chegada da multinacional suíça Mocoffe, empresa que produz de soluções de café em monodose, as famosas cápsulas. A empresa se instalará no município de Varginha, no sul do estado. A previsão é que sejam investidos R$ 20 milhões, com expectativa de criação de 80 postos de trabalho.
Empresas e cafeterias se espalhando são um sinal de amadurecimento do mercado. A barista Júlia é uma entusiasta desse cenário. “Acredito que o mercado não vai ficar saturado. Quanto mais gente falando de café e consumindo, mais coisas temos para trabalhar e evoluir nesse mercado no Brasil”.
Cafés especiais se tornam oportunidade de valorização do produto
O segmento do café especial tem impulsionado a economia, gerando empregos e renda para milhares de famílias de Minas. Pequenos produtores - que tradicionalmente enfrentavam dificuldades para competir no mercado global - encontram no café especial uma oportunidade de valorização de produtos e de suas práticas sustentáveis de cultivo. A Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), ligada à Secretaria de Agricultura de Minas Gerais, faz um trabalho que tem como objetivo não apenas orientar os produtores, mas também divulgar os cafés especiais. Umas das principais iniciativas nesse sentido é o Concurso de Qualidade dos Cafés de Minas Gerais, realizado há 20 anos e que conta com a parceria de uma rede de supermercados que atende predominantemente as classes A e B na região metropolitana de Belo Horizonte.
Neste ano, pela primeira vez, um produtor da região metropolitana venceu o concurso. O agricultor Mamédio Martins dos Santos, do município de Sabará – cidade distante 20 quilômetros da capital mineira - surpreendeu ao desbancar mais de 1.560 amostras de concorrentes do Cerrado Mineiro, Sul e Matas de Minas, regiões com tradição no cultivo de cafés especiais.
O anúncio dos vencedores da competição foi feito em 11 de dezembro. Mamédio, que desistiu de trabalhar na mineração para plantar café, cultiva 10 hectares em local com altitude acima de mil metros. Ele contou que faz quase tudo com apenas um funcionário e a ajuda dos filhos. “Quase ninguém sabe que em Sabará tem produção de café. Agora vão ficar sabendo”, diz, emocionado com a possibilidade de reconhecimento nacional.
Os produtores do café campeão estadual e os primeiros e segundos lugares regionais saem do concurso com venda garantida para a rede de supermercados. Segundo informações da Emater, neste ano serão adquiridas cinco sacas de 60 quilos de cada produtor, que farão parte de uma linha de cafés especiais lançada anualmente pela rede para venda aos consumidores. Os valores pagos aos produtores são bem acima do mercado e variam de R$ 3 mil a R$ 5 mil por saca.
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