Cid Gomes pode desembarcar da base do governador do PT no estado do Ceará.| Foto: Pedro França/Agência Senado
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O senador Cid Gomes (PSB) sinaliza rompimento com o grupo político dominado pelo PT no Ceará e deve deixar a base do governador do estado, Elmano de Freitas (PT). O motivo seria o que o senador considera como acúmulo de poder do partido no estado — a legenda detém governador, prefeito eleito de Fortaleza - Evandro Leitão - e quer ficar também com a presidência da Assembleia Legislativa (Alece).

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A informação veio à tona no último final de semana, e a porta-voz foi Lia Gomes (PDT), irmã de Cid e deputada estadual. Em entrevista ao jornal local Diário do Nordeste, a parlamentar afirmou que ele não estava mais se sentindo parte do grupo de Freitas, que é comandado pelo ministro da Educação e ex-governador do Ceará Camilo Santana (PT).

De acordo com Lia, o próprio Cid se encontrou com o governador cearense e disse a ele que estava se sentindo escanteado porque acha que existe uma concentração de decisão nas mãos das pessoas do PT. “O Cid vinha sentindo que não era mais chamado para participar nas decisões sobre as posições políticas do grupo do ministro Camilo e do governador ”, afirmou a deputada estadual ao jornal.

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O descontentamento de Cid Gomes com o grupo de Santana, do qual Freitas faz parte, não é de agora. Desde a crise do PDT em 2022, que levou ao racha entre Cid e Ciro e à ida dele ao PSB, uma rusga permaneceu na relação entre Cid e o PT do Ceará, mesmo ele tendo aceitado apoiar a candidatura de Freitas. Nas eleições municipais deste ano, isso ficou ainda mais evidente: ele apoiou a candidatura de Evandro Leitão (PT) à prefeitura de Fortaleza, mas ficou de fora das decisões políticas.

A gota d'água, no entanto, foi o aval que Freitas deu ao nome do deputado Fernando Santana (PT) à presidência da Alece. Ele é irmão da mulher de Camilo Santana. Nem Cid, nem o PSB e nenhum dos outros partidos do grupo teriam sido convidados para debater o tema.

De acordo com um pedetista ouvido pela Gazeta do Povo, que pediu para não ser identificado, o desejo do senador era que o cargo fosse ocupado por algum dos deputados do PDT fiéis a ele, mas que não conseguiram, por questões judiciais, segui-lo ao PSB. "A hegemonia do PT incomoda. Eles já têm o governo, a prefeitura e querem também ficar com a presidência da Assembleia”, resumiu Lia Gomes, também ao Diário do Nordeste. Ela esclareceu, no entanto, que a posição era "pessoal", e não do partido.

Cid Gomes diz que não há decisão tomada

Depois de todo o "bafafá" causado pela declaração de Lia Gomes, Cid tentou pôr panos quentes e pediu para não atribuírem a ele "palavras dos outros". O senador participou de reunião do PSB realizada na última terça-feira (19) para tratar do assunto. Na saída, falou brevemente com jornalistas e disse que ainda não há decisão.

"Decisão é decisão e, quando se decide, se comunica. Não há ainda essa comunicação. Acho que qualquer ação na vida deve ser feita de forma sempre ouvindo o coração, colocando a cabeça como o grande regrador da sua fala e das suas decisões. Se está em curso isso, vamos ter paciência, mas tem ritos que têm que ser cumpridos. Não é razoável que a gente comunique uma coisa sem que algumas prévias possam ter acontecido. Como as prévias não aconteceram todas, não pode haver comunicação", disse ele quando questionado se estava deixando a base aliada do governador do Ceará.

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A declaração foi concedida depois do esforço do presidente do PSB no Ceará, Eudoro Santana — pai do ministro da Educação — para que Cid não arrastasse seus aliados para fora da base petista e para fora do partido. O senador ajudou a legenda a subir de oito para 65 prefeituras no estado e a se tornar a maior em quantidade de gestões municipais no Ceará.

Ao final da reunião, Eudoro rebateu qualquer rumor de que Cid deixaria o PSB. "Ele não vai sair do partido. Tem problemas com alguns dos partidos, e sempre terá, porque o poder é assim, a política é muito dinâmica. Estamos pedindo uma reflexão porque não podemos perder no Ceará a contribuição pessoal de um senador da envergadura e qualidade do Cid, que foi governador duas vezes, foi prefeito de uma cidade importante", disse ao Diário do Nordeste.

Na segunda-feira, Eudoro havia afirmado em entrevista à rádio O Povo CBN que recebeu uma ligação de Gomes logo após a conversa dele com Freitas. "Ele explicou que falou em nome pessoal e não do partido. Eu entendi, prestei minha solidariedade a ele pessoalmente, até porque o partido, para tomar posição, tem que ser coletivo".

PT concentra decisões e não consulta partidos do grupo

Ainda em entrevista à rádio local, Eudoro confirmou a insatisfação com a escolha de Fernando Santana para a presidência da Assembleia Legislativa do estado, com a ressalva de que a decisão não partiu do ministro da Educação. "Não foi o Camilo que escolheu nem quem indicou. Ele tem até outra visão sobre isso e concorda que isso tem de ser avaliado", disse então.

"Acho que a presidência (da Alece) é algo que deve ter muita opinião dos próprios deputados. Sei como isso se dá, fui deputado quatro vezes. Lógico que (a opinião) do governador é importante. Se o candidato é do campo do governo, ele tem de estar relacionado, mas a decisão é dos deputados. Acho que muitos outros nomes poderiam ser examinados", pontuou Eudoro.

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"Se a gente quer avançar no Ceará, a gente tem de ter humildade de recuar, avaliar, analisar, tanto de um lado quanto do outro", acrescentou ele, que avalia também que Cid tem sido deixado de lado pelo PT.

Eudoro Santana citou a campanha de 2024 como exemplo. "Esse problema não é do nome ou da situação, é consequência de problemas que vêm acontecendo desde a candidatura do Evandro (Leitão) a prefeito, tivemos muitos problemas. O Cid foi descartado desde o início e são problemas que vêm sendo discutidos", afirmou.

O ministro da Educação também se manifestou publicamente e negou rompimento com o político. “Cid é um grande amigo, parceiro de projeto e de luta, e é meu candidato ao Senado em 2026. Não só pela gratidão que tenho a ele, mas pelo o que ele representa pelo Ceará”, disse Camilo Santana.

Petistas evitam falar abertamente sobre o assunto. Aqueles que falam minimizam mal-estar com Cid Gomes. Do outro lado, aliados do senador evocam que a insatisfação dele com o grupo estava "mais do que evidente".

Um deles, que conversou com a reportagem da Gazeta do Povo, disse em tom irônico que, se ele não souber costurar bem essa ferida, pode perder a preferência na busca pela reeleição ao Senado em 2026. "E quem fica feliz com isso? O Eunício (Oliveira), é claro", afirmou.

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História de Cid Gomes com o PT é antiga

A aliança de Cid Gomes com o PT começou no município de Sobral, em 1996, quando ele era presidente da Alece e foi eleito para a prefeitura da cidade, então pelo PSDB. Em 2006, ele foi alçado a governador do Ceará pelo PSB, e a aliança com o PT permanecia firme. Desde então, trocou de partido algumas vezes, mas permaneceu como um dos principais articuladores políticos do grupo político que comanda o Ceará há mais de duas décadas.

Cid Gomes governou o Ceará entre 2007 e 2014. Na época, Camilo Santana era um dos mais fiéis aliados, tendo ocupado os cargos de secretário de Desenvolvimento Agrário e de Cidades, e foi indicado para a sucessão.

O petista exerceu dois mandatos com alta aprovação dos cearenses e, em 2022, foi eleito com folga para uma cadeira do Senado. Atualmente, está licenciado para ocupar o cargo de ministro no governo Lula (PT).

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]