Com ampla diversidade regional, Minas Gerais é um estado tido como a síntese do Brasil quando se trata de resultados eleitorais. Nunca um presidente da República foi eleito sem ter maioria por lá e, por isso, entender as características de cada região de Minas ajuda a analisar o cenário que pode vir nas eleições gerais de 2024.
Na eleição presidencial de 2022, Jair Bolsonaro (PL) venceu nas maiores cidades e regiões mais ricas de Minas - e que têm uma forte presença do agronegócio na economia - como o Triângulo Mineiro e o sul do estado. Lula (PT), por outro lado, foi mais votado no norte de Minas, região com perfil socioeconômico semelhante ao da região Nordeste do Brasil, com uma parcela significativa de pessoas dependentes de auxílios do estado. O atual presidente também venceu na Zona da Mata, região com forte presença de indústrias. A principal cidade da região, Juiz de Fora, é governada por uma aliada de Lula, a prefeita Margarida Salomão (PT).
Apesar da derrota de Bolsonaro nestas regiões, o governador Romeu Zema (Novo) teve melhor desempenho, desbancando o aliado do atual presidente, Alexandre Kalil, mesmo em cidades onde Lula foi mais votado para presidente. Pensando em situações como esta, os partidos mais alinhados à direita, como PL e Novo, têm se organizado para as eleições municipais de 2024 em Minas buscando tirar lições das votações mais recentes, além do ano que vem ser usado como um formador de bases pensando nas eleições majoritárias de 2026.
O Partido Novo, que tem a figura do governador de Minas Gerais como sua maior estrela - e possível candidato à presidência da República em 2026 - tem trabalhado para aumentar a relevância no interior do estado.
Nas eleições de 2020, o partido sofreu com os critérios rígidos impostos pelo então presidente do partido, João Amoêdo, que fez com que o Novo disputasse eleições em apenas 5 das 853 cidades do estado, fazendo vereadores em apenas duas. Segundo o vice-presidente estadual do Novo em Minas Gerais, Frederico Miana, as mudanças na gestão do partido no âmbito nacional dão esperanças de crescimento em Minas, com foco nas eleições de 2024. “Com o afastamento e depois da saída do João Amoêdo do Novo, o partido se oxigenou e hoje, na gestão do Eduardo Ribeiro, que é o nosso presidente nacional, o Novo vive o melhor momento desde a fundação. A gente teve, mês passado, recorde de filiação mensal. Nunca antes o Novo tinha conseguido filiar tanta gente quanto agora”.
Além das mudanças na condução do partido, Miana destaca as alterações na forma de escolher candidatos, que antes se dava por um rigoroso processo seletivo. Segundo ele, o processo tem um cunho mais de formação do que só de seleção. “Obviamente, a gente seleciona, identifica, tem que ter alinhamento com os nossos princípios e valores, mas o foco do processo é muito mais formação. É ajudar o possível candidato, a ele primeiro ter uma formação em liberalismo, nos nossos princípios e valores, e formação também de como fazer campanha, como fazer política, então é um processo natural”.
Os dirigentes do Novo também destacam a flexibilidade para a realização de alianças. Antes da campanha de reeleição de Zema, o Novo participava de eleições sem fazer coligações. Depois do ano passado, essa flexibilidade vai se manter, para que ocupe mais espaços. E o partido conta com isso, acreditando que a polarização na esfera federal não terá tanto impacto nas eleições municipais.
Para o presidente estadual do partido, Christopher Laguna, as capitais e as grandes cidades ainda terão impacto com a polarização, mas isso tende a não ser tão significativo em cidades menores. “Quando a gente vai para o nosso interior aqui, que é muito mais formado por grupos políticos e a ideologia fica um pouco de lado, cai no problema da cidade, no cotidiano da cidade, na parte estrutural dela. Aí o debate sai um pouco da polarização para quem é de fato mais reconhecido da cidade". Mesmo com essa flexibilidade na busca por coligações, Laguna deixa claro que não há qualquer possibilidade de alianças com partidos de esquerda.
Pautas sociais e de costumes recebem atenção, mas economia continuará sendo prioritária ao Novo
Questionado sobre o envolvimento do Novo em pautas sociais e de costumes, que têm sido um trunfo da ala mais próxima de Bolsonaro, Laguna afirma que o partido dá atenção a esses temas, ressaltando que filiados ao Novo fizeram campanha para candidatos com valores ligados à direita nas últimas eleições para o Conselho Tutelar, citando o exemplo de Belo Horizonte.
Entretanto, ele pondera que a pauta econômica deve continuar sendo importante. “Acredito muito que não se faz social sem capital. A gente tem que ter uma boa gestão para ter eficiência para o dinheiro entrar e a gente fazer o social”, afirma Laguna.
Minas e São Paulo devem ter a maior quantidade de campanhas do PL para prefeito nas eleições de 2024
Apesar da derrota de Bolsonaro nas urnas, o PL conta com o bom desempenho do ex-presidente na maioria das grandes cidades de Minas Gerais para construir a estratégia das eleições 2024. Seu poder de mobilização, especialmente no interior do estado, tem grande influência em cidades onde o agronegócio é parcela relevante da atividade econômica.
Com esse trunfo, o PL tem metas ambiciosas para todo o país, pretendendo lançar o maior número possível de candidatos a prefeito, especialmente em cidade com mais de 100 mil habitantes. Em Minas Gerais, isso significaria lançar, pelo menos, 34 candidatos nas eleições de 2024, quantidade que deixaria o estado com o segundo maior número de campanhas para prefeito, ficando atrás apenas de São Paulo.
Segundo a presidente municipal do PL de Uberaba, Ellen Miziara, o partido está trabalhando nacionalmente para criar uma grande base, pois isso foi subestimado nas eleições presidenciais de 2022, na qual Bolsonaro acabou derrotado. “A gente tem observado essa preocupação do PL em estruturar a base com pessoas que de fato estão e vão trabalhar pelo partido e defender o decálogo do partido”, comenta ela, falando sobre a carta com dez princípios de cunho conservador que o PL assimilou após a entrada de Bolsonaro. Por conta disso, Miziara afirma também que o partido tem como determinação não fazer aliança com PT e partidos de esquerda.
Ainda sobre alianças, Miziara comenta que há, em várias cidades, diálogo avançado com o Partido Novo, já que o PL faz parte da base do governo Zema na Assembleia Legislativa de Minas. A dirigente partidária cita como exemplo Contagem, onde o pré-candidato a prefeito, deputado estadual Cabo Júnio Amaral (PL) pretende ter um candidato a vice do Novo e onde estão alinhados em relação a princípios. Outras grandes cidades como Juiz de Fora e Uberlândia também trabalham para ter candidatos próprios do PL, além da busca da reeleição do prefeito Gustavo Nunes, de Ipatinga.
Questionada sobre sua cidade, Miziara diz que em Uberaba o partido trabalha para ter candidato próprio. A cidade, conhecida por ser a capital mundial do gado zebu e referência no agronegócio, é comandada pela prefeita Elisa Araújo (Solidariedade), que foi convidada para ingressar no PL. Porém, Miziara deixa claro que não quer uma adesão da atual prefeita apenas para que o PL tenha cargos e não participe de forma a ter voz nas decisões que se referem a projetos.
“A gente fez esse convite, fizemos uma reunião partidária na qual a gente deu para ela uma pauta com 60 itens, pelo menos, que precisam ser ajustados na prefeitura", afirmando que a atual prefeita, para ingressar no PL, deve se comprometer com questões como liberdade econômica, diminuição de impostos, respeito ao agronegócio e uma educação livre de doutrinação e ideologia de gênero.
Miziara, que é vice-presidente estadual do PL Mulher, comentou sobre a ampliação da participação feminina no partido. Segundo ela, das novas filiações que o partido recebeu este ano em todo o Brasil, 30% são de mulheres. Está sendo desenvolvido um trabalho de formação para as mulheres candidatas, pois não querem apenas cumprir a cota de gênero exigida pela lei eleitoral, mas sim fazer com que as mulheres tenham uma boa votação. “Tenho certeza que elas vão trabalhar para ter voto. Elas não vão ser pessoas figurativas no partido, que estão ali para poder cumprir tabela”, completa Miziara, falando acerca da prática comum em eleições de se colocar mulheres sem expressão nas chapas apenas para garantir que não haverá impugnação por descumprimento da cota mínima de gênero.
Caminhando ao lado das questões políticas, o marketing das possíveis campanhas já começou e, na medida em que a legislação permite, potenciais candidatos se posicionam. Sobre essa seara, a especialista em marketing político e eleitoral Mariana Couto acredita que a polarização dará o tom da conversa para 2024. "As pessoas ainda estão muito focadas nisso, ainda é muito forte o ‘você é de direita', 'você é de esquerda’. Não dá para ficar em cima do muro. O público quer pessoas de posicionamento firme", acredita.
Mariana, que atua há mais de 10 anos em campanhas, especialmente no interior do estado, acredita que é essencial conhecer bem a região do futuro candidato, já que Minas tem muitas particularidades e isso também influencia na forma de se comunicar. “Minas é um país, e em cada região é preciso entender muito bem do local para atuar. A política é muito regionalizada e diferenciada. No interior, por exemplo, prefeito e primeira-dama são muito importantes e a vida gira em torno da política. A população tem um humor mais ácido, vigia tudo que acontece com os políticos locais. Na capital isso muda e as questões partidárias aparecem mais”, comenta Mariana, que acredita também que o trabalho de base precisa ser feito desde agora, para identificar e se posicionar melhor para o público.
A especialista aponta ainda que, mesmo para os candidatos aos cargos majoritários, a humanização pode ser um diferencial nesse cenário polarizado. “Existem pautas que são frequentemente mais ligadas à esquerda, outras à direita e é natural que cada um se alinhe a esses temas conforme seu espectro político. Mas um candidato a prefeito, por exemplo, precisa ser maior que essa disputa e isso só se consegue com aproximação do público e um trabalho forte, muito antes da pré-campanha oficial começar”.
Sobre a comunicação, Mariana ainda reforça que o uso de inteligência artificial é inevitável em 2024, mas alerta para a possibilidade de os candidatos se prejudicarem com as ferramentas. “Acredito que, especialmente no interior, o uso de inteligência artificial para fake news sobre os candidatos será maior, justamente por ter um público muito atento a qualquer deslize do oponente. De qualquer forma, todos precisam estar preparados para isso, tanto o bom quanto o mau uso”, alerta a especialista.
Com 853 municípios, Minas Gerais tem 14.471.876 eleitores e corresponde ao segundo maior colégio eleitoral do país. Nas últimas eleições, 10.844.554 mineiros foram às urnas.
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