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Privatizações de Cemig e Copasa podem ser concretizadas em 2025.
Vice-governador de Minas após protocolo do pedido de emenda à Constituição estadual que pode engatilhar privatização de Cemig e Copasa.| Foto: Luiz Santana/ALMG

Este final de 2024 marcou a retomada de uma das discussões mais polêmicas do governo de Minas Gerais: a privatização da Companhia Energética do estado, a Cemig, e da Companhia de Saneamento mineiro, a Copasa. A medida é defendida como prioritária pelo governador Romeu Zema (Novo) e avançou com os projetos protocolados na Assembleia Legislativa (ALMG). Porém, os intensos debates em torno do assunto, que tiveram início ainda durante o primeiro mandato de Zema em Minas, continuam reverberando entre especialistas, políticos, movimentos sociais e a população.

Para o governo, a privatização é a chave para modernizar serviços e atrair investimentos capazes de melhorar a infraestrutura energética e o saneamento básico em um estado com grandes desafios geográficos. Além disso, após aprovação do Propag (Programa de Pleno Pagamento da Dívida dos Estados), a venda dos ativos, especialmente no caso da Cemig, pode ser a "bala de prata" para a quitação da dívida com a União.

Cemig e Copasa são avaliadas em R$ 15 bilhões.

No movimento contrário à proposta, opositores destacam riscos de aumentos tarifários, perda de controle sobre recursos estratégicos e impactos sociais, especialmente em áreas rurais e regiões mais vulneráveis socialmente. O vice-governador mineiro, Mateus Simões - que protagonizou a cena de entrega do novo projeto de lei aos deputados estaduais em novembro - afirmou na ocasião que estava confiante de que a discussão na casa legislativa seria finalizada em poucos meses. Juntas, as duas empresas estatais são avaliadas em mais de R$ 15 bilhões.

Privatização antecede possível federalização da Cemig

A proposta apresentada pelo governo mineiro trouxe junto a discussão sobre uma possível federalização da Cemig, como forma de abater dívidas do estado com a União. Henrique Reis, advogado especialista em regulação do setor elétrico, avalia que a privatização anterior à federalização é a estratégia mais adequada.

“Se o objetivo do governo é entregar uma companhia mais eficiente e moderna, a desestatização deve acontecer antes. A federalização, nos moldes atuais, pode transferir o controle para o governo federal, o que limitaria as oportunidades de modernização da governança e o potencial de valorização da empresa”, explicou.

Reis também destacou o contexto nacional, mencionando o impasse entre o governo federal e a Eletrobras sobre os poderes de controle da companhia privatizada, que pode influenciar na forma como a União negociará uma participação societária na Cemig, que hoje tenta aumentar seus poderes na Eletrobras. Atualmente, a União tem 45% das ações, mas apenas 10% de direito a voto.

Para o especialista Henrique Reis, a privatização no modelo de corporation, com posterior federalização, seria o cenário ideal. “Isso pode gerar um modelo de gestão mais eficiente, com capacidade de adaptação às transformações do setor elétrico, que demanda inovação tecnológica e novos modelos de negócio”, completou.

Governo Zema tenta superar necessidade de referendo para avançar com privatizações

O avanço do projeto depende de um fator essencial: a aprovação pelos deputados estaduais mineiros. Para autorizar o avanço na privatização de Cemig e Copasa, os parlamentares precisam aprovar uma mudança na Constituição estadual, que hoje exige a realização de um referendo popular. A base governista, que conta com 57 dos 77 deputados, se mostra confiante, mas a oposição promete mobilizações para prolongar o debate e engajar a sociedade. Enquanto a Assembleia Legislativa discute a dispensa do referendo, o governo aposta no diálogo para aprovar o projeto e tenta diminuir as resistências.

Necessidade de referendo foi inserida na Constituição de Minas pelo então governador Itamar Franco como forma de impedir a privatização das Centrais Elétricas de Furnas pelo ex-presidente FHC.

O embate não é inédito. Em 2023, diversas audiências públicas pautaram o tema e trouxeram sindicalistas e opositores do governo para a Assembleia Legislativa de Minas. Poucos dias após o protocolo efetivado por Mateus Simões, em audiência pública requerida pelo deputado Leleco Pimentel (PT), foi apresentada uma proposta de mobilização popular contra a tentativa de privatização das companhias estatais. Os movimentos Levante Popular da Juventude, pela Soberania Popular na Mineração e Brasil Popular participaram da audiência.

Na ocasião, o secretário nacional de Participação Social da Secretaria-Geral da Presidência da República, Renato Simões, afirmou que seria um retrocesso a dispensa do referendo. O mecanismo foi inserido na Constituição de Minas pelo então governador Itamar Franco, como uma forma de impedir a privatização das Centrais Elétricas de Furnas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

As vozes contrárias à venda das estatais mineiras evidenciam o risco para a prestação de serviços essenciais. De acordo com os opositores às privatizações das companhias, no último mês de abril um plebiscito realizado por movimentos sociais apontou que 95% entre 300 mil consultados seriam contra a iniciativa. O fim da consulta popular exigida pela Constituição do estado também seria rejeitado por 98% dos consultados.

A qualidade do serviço prestado e o aumento das tarifas também são pontos frequentemente levantados por quem rechaça a desestatização, tendo como argumento a experiência da empresa Enel, responsável pelo serviço de energia elétrica no estado de São Paulo, que nos últimos meses apresentou diversas falhas na prestação dos serviços.

Em entrevista concedida à Gazeta do Povo, o vice-governador mineiro afirmou que o modelo de privatização da Enel foi um “erro em modelo”, e que esse não será o caminho escolhido por Minas. “Eu sempre falo que aprender com os erros dos outros é mais barato e mais rápido. Por isso que a proposta para a Cemig se espelha na Copel (Companhia Paraense de Energia), porque lá o governo tem golden share como nós queremos ter aqui, para garantir que as decisões de investimento nunca vão sair da vista do controlador estatal, Seja o governo de Minas, seja a União”, apontou Simões.

A Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae-MG), responsável por fiscalizar e normatizar os serviços de água e esgoto da Copasa e de outras concessionárias no estado, informou, em nota, que “independentemente do modelo adotado — público, privado ou parceria público-privada — a Agência mantém seu compromisso de regular e fiscalizar o setor, assegurando o cumprimento das normas vigentes, a busca pela universalização dos serviços de saneamento básico em Minas Gerais, a manutenção da qualidade do atendimento e a prática de tarifas justas e equilibradas”.

Avanço de projetos para Cemig e Copasa é teste para a política mineira

Com bilhões de reais em jogo e um debate que abrange desde a eficiência operacional até questões de soberania, a privatização da Cemig e da Copasa promete marcar a gestão estadual em Minas. A adesão ao Propag foi tema integrante da última sessão solene de 2024 da ALMG, quando os deputados reforçaram o protagonismo da Casa nessa negociação, o que pode ser um indicativo de que, após tantos anos de impasse, a pauta esteja pronta para avançar com a sociedade.

A decisão final, ainda em construção na ALMG, será um teste para a política estadual, com desdobramentos que podem reverberar na qualidade de vida dos mineiros. Em recesso, os deputados retornam aos trabalhos em 1º de fevereiro de 2025.

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