A iminência da taxação de 25% na importação de madeira, anunciada pelo governo americano há um mês, acendeu um alerta ao setor madeireiro no Brasil. A concorrência para a exportação deve ficar mais acirrada. O Canadá, maior fornecedor de madeira aos Estados Unidos, é um dos países na mira do presidente Donald Trump e um recuo nessas vendas pode empurrá-lo na busca de outros mercados, o que afetaria a exportação brasileira.
O Brasil é alvo de uma investigação, por ordem administrativa de Trump, sobre a importação de madeira no país. O republicano promete repetir aos produtos brasileiros a tarifa que será imposta a Canadá, México e China. A medida entraria em vigor no próximo mês.
“Nós seríamos beneficiados se escapássemos da sobretaxa. Seria uma boa oportunidade. Porém, o Canadá viria com força para pontos que o Brasil domina”, explica o empresário do ramo de compensados Roni Marini, vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) e coordenador do conselho temático da madeira na instituição. O Paraná é um dos estados que mais exporta o produto.
A preocupação do mercado brasileiro é com a capacidade de produção e preço das indústrias canadenses, mexicanas e chinesas, que somadas são responsáveis por 58% da importação americana. “Mercados como Reino Unido e União Europeia tendem a ser os mais afetados pelo desvio da oferta. O que pode comprometer a presença brasileira nesses destinos, devido à concorrência no mercado global”, expõe o embaixador José Carlos da Fonseca Junior, diretor de relações institucionais da Associação Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), e presidente da Associação Brasileira de Embalagens em Papel (Empapel).
Os Estados Unidos são o principal cliente brasileiro de três produtos:
- compensado de pinus
- madeira serrada de pinus
- molduras de pinus
Diversificação reduz riscos, avalia empresário do segmento madeireiro
Dos US$ 49,3 bilhões importados pelos EUA no ano passado, o Brasil deteve a fatia de US$ 1,7 bilhões. Apenas China e Canadá superaram o fornecimento brasileiro. O momento pede atenção do mercado para a possível diversificação de clientes.
“Outros mercados podem ser abertos, é um momento ideal para buscar novos compradores para nossos produtos e termos uma cartela mais diversificada, a fim de não depender exclusivamente de uma única economia. A diversificação reduz riscos”, afirma o empresário e consultor Ivan Tomaselli.
Embora a alta do dólar torne os produtos brasileiros mais competitivos no exterior, as sobretaxas podem gerar aumento de oferta não apenas de produtos, mas também de preços. “Com a política tarifária de Donald Trump, está em jogo não apenas a restrição ao mercado estadunidense. O aumento da concorrência em outros mercados tende a resultar em inundação de produtos a baixo custo, característicos das operações chinesas”, pondera o presidente da Empapel.
Ainda que o objetivo de Trump seja fortalecer os produtores americanos com a sobretaxa na importação, os custos serão elevados aos consumidores, o que pode reduzir o tempo de atuação da medida. “A inflação vai subir. Já há uma tarifa agressiva para o aço e o alumínio. Se houver para a madeira, será o caos”, avalia o economista Marcos Rambalducci.
Ele acrescenta que, nos Estados Unidos as casas são construídas com madeira, incluindo madeira compensada. "Tudo vai ficar mais caro, vai ser impraticável para o consumidor. O governo vai acabar cedendo", acredita ele.
Para equilibrar as contas, os EUA teriam que possuir um maior número de indústrias para atender a demanda do setor madeireiro. “Não acredito na autossuficiência dos Estados Unidos nesse setor. Eles possuem matéria-prima, mas não têm indústrias. Demandaria muito investimento e os empreendedores podem não embarcar nessa, já que em quatro anos pode haver mudança no governo e no modelo de política comercial. Poder ficar mais difícil, mas vamos continuar vendendo para eles”, aponta Roni Marini.
Ainda que o objetivo de Trump seja fortalecer os produtores americanos com sobretaxa na importação, os custos serão elevados aos consumidores.
Região Sul detém 86,5% das exportações de madeira
Se o momento é de expectativa, os produtores do Sul do Brasil são os mais preocupados com os impactos. Dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham) indicam que os estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul representaram 86,5% do total exportado pelo Brasil, no último ano, aos Estados Unidos.
Santa Catarina tem um amplo destaque. O estado é responsável por 41% das exportações de madeira e por 50% da exportação de móveis. Dados oficiais da Secretaria de Comércio Exterior, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, apontam que, em 2024, Santa Catarina exportou US$ 651.004.071 em madeira e derivados.
O estado catarinense foi seguido pelo Paraná, com US$ 614.649.767; e pelo Rio Grande do Sul, com US$ 108.252,426. “No Sul do Brasil, toda madeira beneficiada é madeira plantada para esse fim. Somos os maiores exportadores. Temos que quebrar o paradigma de quem usa o madeireiro segue aquele modelo extrativista do século passado. O que nosso setor representa para os empregos e para o PIB é algo muito significativo", aponta o vice-presidente da Fiep.
Ele defende a necessidade de políticas públicas voltadas ao setor para incentivar o consumo de madeira para construção de casas no Brasil. "Nosso consumo interno tem que aumentar. Só há ganhos porque, com o aumento de árvores plantadas, aumenta a absorção de CO², o que contribui para diminuir o aquecimento global”, completa Marini.
O setor madeireiro planta 1,8 milhão de árvores por dia no Brasil, dando origem a uma grande lista de produtos de fonte renovável, como celulose, papéis, embalagens, painéis de madeira e pisos laminados, conforme relatório da IBÁ.
A Região Sul tem 87% da área plantada com pinus no país, principal gênero utilizado no processamento de madeira para multiprodutos. O setor registrou 15.661 empregos diretos em janeiro de 2025, nos três estados do sul do Brasil, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
União Europeia acusa Brasil de dumping no setor de compensados
Na última quinta-feira (13), pelo menos 90% dos produtores de madeira compensada do Sul do Brasil participaram de uma reunião em União da Vitória (PR). Além de discutirem estratégias para a possível sobretaxa dos EUA, outro problema foi apresentado.
A Secretaria de Comércio Exterior, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, foi notificada de um processo de dumping movido pela União Europeia sobre o setor madeireiro do Brasil. A legislação anti-dumping é um instrumento de defesa comercial que a União Europeia usa contra possíveis práticas comerciais desleais.
O objetivo dessa política seria proteger empresas e postos de trabalho europeus. A União Europeia promove o livre comércio, porém, pode restringir parceiros comerciais que subsidiem seus produtos ou quando os produzem em excesso e vendem a preços reduzidos.
Representantes do setor nacional decidiram contratar um escritório especialista em ação de dumping para a defesa, com o objetivo de evitar uma possível sobretaxação. A investigação europeia pode durar um ano.
“Foi uma surpresa. O mundo realmente está mais nacionalista. A globalização parece ceder espaço para um novo pensamento - cada um defendendo de forma mais escancarada o seu espaço. Acreditamos que o argumento não é coerente, o que está sendo apontado não é real”, relata Marini.
O empresário do setor Tomaselli acrescenta que, até o momento, sabe-se pouco sobre a ação. “Mas é algo que vai incomodar. É impossível dimensionar, vai ser um processo longo, mas não acredito que seja efetivamente comprovado”, afirma ele.