O alargamento da praia de Jurerê, uma das mais badaladas de Florianópolis (SC), foi concluído em tempo recorde. Foram 44 dias de trabalho que resultaram em uma faixa de areia de 40 metros de largura. Antes, algumas partes da praia estavam tomadas pelo mar, sem espaço na orla para turistas e moradores.
A expectativa é de que a faixa de areia se estabilize em 30 metros devido à ação das marés. “Essa dinâmica está dentro do processo de monitoramento de sedimentos”, explica o secretário local de Transporte e Infraestrutura, Rafael Hahne.
O próprio processo de erosão, que causa a redução da faixa de areia, é provocado por ondas, marés e correntes marítimas. No entanto, tem sido intensificado pela ocupação de áreas muito próximas às praias, como as dunas, e por mudanças climáticas, que elevaram o nível do mar. Com o alargamento da faixa de areia, “o que está gerando erosão nas praias não está sendo atacado, e vai continuar. Porém está se dando uma sobrevida (à faixa de areia)”, analisa o coordenador da pós-graduação em Oceanografia, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Pedro de Souza Pereira.
A obra custou R$ 24,79 milhões e é a maior realizada na capital catarinense - que também interferiu nas faixas de areia das praias em Canasvieiras e Ingleses. Foram espalhados 500 mil metros cúbicos de areia em Jurerê, segundo a prefeitura, em 3,38 quilômetros de extensão. O trecho que passou por intervenção se estende do costão do lado tido como Internacional até cerca de 50 metros do costão do trecho conhecido como Tradicional, que faz divisa com Canajurê.
A prefeitura avalia que a obra, embora tenha sido feita durante a alta temporada, “ocorreu sem transtornos para a administração municipal e para quem procurou a famosa praia”. Após o início dos trabalhos, no entanto, a água de Jurerê ficou mais turva, em contraste com o tom mais azulado que costuma ter.
A praia está liberada desde o último dia 9, quando a draga que retirava sedimentos do fundo do mar e levava para a faixa de areia finalizou o trabalho e foi retirada. A entrega oficial da obra ocorreu neste sábado (23), dia do 351º aniversário de Florianópolis.
Florianópolis já fez três obras de alargamento
Todas as obras de alargamento realizadas em Florianópolis foram no norte da ilha. Jurerê e Canasvieiras, por exemplo, são vizinhas, separadas apenas por um trecho que leva no nome uma mistura das duas praias: Canajurê.
A praia de Canasvieiras foi a primeira da capital a passar por intervenção e é uma das mais procuradas por turistas durante a temporada. Preferida dos argentinos, que a transformam em uma "mini Buenos Aires" no verão, Canas passou por alargamento em 2020 e viu sua faixa de areia, que antes variava entre um e cinco metros, chegar a 50 metros. A obra, que custou mais de R$ 10,5 milhões, dragou do fundo do mar cerca 400 mil metros cúbicos de sedimentos que foram transportados para a beira da praia, ampliando o espaço para turistas. O trabalho durou 105 dias e foi desenvolvido em 2,34 quilômetros de praia.
Durante esse processo, parte da areia adicionada em Canasvieiras se deslocou para a praia de Canajurê, que teve sua faixa de areia ampliada mesmo sem obra. O efeito mostra como o litoral é interligado e, por isso, especialistas defendem que estudos sejam realizados antes das obras para entender o impacto, não apenas na praia alvo, mas na região que ela compõe. “O projeto de Canasvieiras não só teve impactos ambientais como produziu impacto nas praias vizinhas, porque acabou inviabilizando trapiche de Canajurê que reflete em consequência para uma série de atividades econômicas do turismo náutico”, pontua o professor de Ecologia e Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Paulo Horta.
A obra de Canasvieiras, por mobilizar menos de 500 mil metros cúbicos de areia, foi classificada como de médio porte, de acordo com resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), de 2017. Por isso, para que a obra conseguisse licenciamento ambiental foi necessário um estudo ambiental simplificado, com abrangência limitada na área que sofreu influência direta da intervenção. Em nota técnica emitida em outubro do ano passado pelo Programa Ecoando Sustentabilidade da UFSC, professores defendem que todas as dragagens que mobilizem mais de 100 mil m³ de sedimento deveriam ser consideradas de grande porte, por “ser uma atividade com efeitos regional (não apenas local) e potencialmente causadora de significativa alteração ambiental”.
Por sua vez, a praia dos Ingleses teve o alargamento finalizado em março de 2023, em um processo que durou 53 dias e recebeu investimento de R$ 18,8 milhões. Cerca de 2,8 quilômetros de praia receberam quase 500 mil m³ de areia, que aumentaram a faixa de areia para 35 metros.
No entanto, em setembro de 2023, conta o professor Paulo Pagliosa, do Núcleo dos Estudos do Mar da UFSC, parte da praia que sofreu alargamento estava com apenas 10 metros de faixa de areia. “Meses depois da finalização (da obra de alargamento), não tinha mais o aterro. Todo aterro foi levado embora. Não é na praia inteira, mas em alguns pontos”, explica. A prefeitura informa que a redução da faixa “se trata de um processo natural por conta da ação das marés, e que realiza monitoramento ambiental técnico nas praias alargadas para que novos serviços sejam planejados”.
Como foi a obra em Jurerê
A obra em Jurerê foi realizada com uma draga (embarcação) resistente às intempéries, o que permitiu que o trabalho fosse realizado mesmo em dias de chuva. Localizada a 1.350 metros de distância da orla, a draga sugava sedimentos localizados a 2,5 metros de profundidade e que, segundo a prefeitura, são da mesma coloração e dimensão dos da praia.
Depois se aproximava da faixa de areia, mas mantendo ainda distância de 200 metros para não encalhar. Então, era acoplada a uma tubulação de 450 metros, que ligava a embarcação até a faixa de areia. Por esse tubo, a draga bombeava a areia para transportá-la até o balneário e, na sequência, os sedimentos eram espalhados por tratores.
Para especialistas, o impacto ambiental das obras de alargamento é dividido em dois momentos: quando se retiram os sedimentos do mar, e depois, quando se deposita a areia na praia, segundo os especialistas. Na primeira etapa da intervenção, que consiste na dragagem de sedimentos, pode ocorrer a remoção da fauna e da vida marinha. “Possivelmente vai matar localmente os organismos que vivem ali e que não são de fugir”, pondera Paulo Pagliosa. Além disso, esse processo acaba levantando outros tipos de materiais, que podem afetar organismos que vivem naquela coluna de água, como peixes e algas.
Outro ponto, ressalta Horta, é que no fundo marinho tem uma série de substâncias, entre elas as que formam a maré vermelha, que pode ser poluente e prejudicial para a saúde dos ambientes e das pessoas. Tem, ainda, o impacto sonoro do trabalho da draga, aponta Pagliosa, que afeta o comportamento de mamíferos aquáticos, peixes e aves. O professor explica que há regulamentação específica nesse tipo de trabalho e que, quando esses organismos são avistados próximos da draga, é necessário parar o equipamento. Segundo a prefeitura de Florianópolis, o trabalho da draga, que aconteceu 24 horas por dia, só foi suspenso por conta da passagem de golfinhos pela região.
No segundo momento, a areia que é depositada na praia também soterra organismos. “A gente precisa entender que as praias não são só areia: tem bichinho e plantinha fundamentais para equilíbrio do sistema costeiro”, explica Horta. Além disso, a dragagem não traz apenas areia, acaba importando outros materiais. Em Balneário Camboriú, no primeiro mês, trouxeram conchas (que são moluscos da classe bivalves), que são organismos vivos e morreram na areia.
Santa Catarina é o estado que mais fez obras de alargamento em praias
Com a finalização da obra em Jurerê, sobe para oito o número de intervenções de alargamentos realizadas em Santa Catarina. Segundo levantamento do coordenador da pós-graduação em Oceanografia, da UFSC, Pedro de Souza Pereira, Santa Catarina é o estado que mais realizou obras de alargamento no país. O segundo colocado é o Espírito Santo, que fez três intervenções e se prepara para uma quarta.
No estado catarinense, a primeira obra de alargamento ocorreu em 1998, em Balneário Piçarras. Desde então, a cidade passou por novas intervenções nos anos de 2008 e 2012 e se prepara para uma quarta em 2024. A nova obra custará em torno de R$ 16,5 milhões. Outras três obras de engordamento estão em fase inicial ou com projeto em análise. Entre elas, a de Itapoá que deve ser uma das maiores obras de alargamento do mundo.
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