O projeto é antigo e a espera pela obra da maior ponte sobre lâmina d’água da América Latina, a ser construída entre Salvador e a Ilha de Itaparica, gera preocupações. Vencido há quase quatro anos pelo consórcio chinês formado pelas gigantes China Railway 20th Bureau Group Corporation (CR20) e China Communications Construction Company (CCCC), o leilão ainda não resultou no início das obras.
Com uma extensão de 12,4 quilômetros, a ponte está prevista para ser concluída em 2028 e promete reduzir o tempo de travessia para apenas 15 minutos. Atualmente, baianos e turistas gastam uma hora no ferry boat ou quatro horas por rodovias para fazer o trajeto.
Apesar da promessa de melhoria na infraestrutura, o projeto preocupa o governo da Bahia. No início do ano, o governador Jerônimo Rodrigues (PT) expressou suas dúvidas sobre a obra, afirmando que "rezava" para que ela saísse do papel. “Se não der certo, desmancha o contrato e faz outro”, afirmou.
A sondagem do local que receberá as obras, iniciada no fim de janeiro, não foi suficiente para tranquilizar o chefe do Executivo estadual. Em abril, ele se reuniu com o embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, para discutir a construção. Rodrigues mencionou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou a enviar uma carta ao presidente da China, Xi Jinping, pedindo garantias à edificação.
“É a partir da finalização da sondagem em águas rasas que se delineia o projeto executivo. Estou torcendo para o consórcio cumprir tudo aquilo que está no contrato”, disse Rodrigues na ocasião. O estado estima o custo da obra em R$ 13 bilhões, enquanto o consórcio prevê R$ 9,5 bilhões.
O governador reconheceu que houve aumento nos custos da obra e que a pandemia de Covid-19 influenciou nos preços dos insumos, mas “há um contrato assinado que deve ser cumprido”. Ele destacou que o assunto volta à mesa no encontro do G20 em outubro, quando o presidente da China deve vir ao Brasil. “Estou muito contente, mas estou muito precavido”, disse.
O consórcio informou à Gazeta do Povo que as obras físicas devem começar no início de 2025, mas que questões importantes para a montagem da estrutura foram iniciadas no começo deste ano. De janeiro a março, por exemplo, foram realizadas sondagens nos municípios de Vera Cruz e Salvador, em terra e na borda do mar, onde a lâmina d’água é pequena.
Em março, a Concessionária Ponte Salvador-Itaparica recebeu, no município de Simões Filho, dez contêineres chineses com equipamentos e materiais. Entre eles, há três perfuratrizes especiais com sistema de compensação de ondas, que garante a estabilização das balsas. Também foram aportadas uma cabine de operação, torre de operação, guincho, gerador e um laboratório para análise geotécnica do material coletado no mar.
“A construção desse empreendimento é um processo de alta complexidade e, para iniciar as obras fisicamente, diversos tipos de estudos e serviços precisam ser realizados. Além da sondagem, que está em desenvolvimento, foram concluídos outros serviços, como batimetria, geofísica e estudos ambientais, sociais e culturais”, explicou o consórcio.
A construção será viabilizada por uma Parceria Público-Privada (PPP) entre o governo baiano e o consórcio chinês, com duas praças de pedágio e concessão por 35 anos.
O que já foi feito e está previsto para os próximos meses
A sondagem foi iniciada no último dia 31 janeiro a partir de perfurações em terra no município de Vera Cruz, na Ilha de Itaparica. Em seguida, foi realizada a sondagem em terra em Salvador e, posteriormente, as perfurações na borda do mar em Vera Cruz.
Ao fim dessa etapa, o cronograma prevê para as próximas semanas o início da sondagem em águas rasas com até dez metros de profundidade, por meio de uma plataforma. Até o fim deste semestre, deverá se iniciar a sondagem em águas profundas com mais de dez metros de profundidade, com uso de balsas que chegam a 75 metros.
“Em cima dessas balsas, estarão equipamentos desenvolvidos com tecnologia chinesa de ponta. Durante a sondagem, as perfuratrizes retiram fragmentos do solo no local onde serão instalados os pilares da ponte. Em seguida, os materiais são analisados em laboratórios especializados, que fornecem relatórios detalhados sobre o solo da área. Assim, é possível compreender melhor as características do terreno e dimensionar com precisão a fundação da estrutura da ponte”, esclareceu.
Essa etapa de sondagem ocorrerá até dezembro deste ano, com um investimento previso de R$ 160 milhões.
O passo a passo da tão esperada obra física
Quando a obra física começar, prevista para o início de 2025, a estrutura passará por várias etapas de edificação divididas em trechos.
O chamado trecho 1 prevê a construção das estruturas que compõem os acessos viários na capital do estado. Este trecho incluirá 4,2 quilômetros que abrangem um conjunto de viadutos e dois túneis praticamente paralelos aos existentes na Via Expressa.
Já o trecho 2 prevê um vão principal de 482 metros de extensão para a passagem das embarcações. Além disso, haverá dois vãos secundários de 220 metros cada, permitindo a navegabilidade de navios transatlânticos, petroleiros e plataformas.
De acordo com a concessionária, o projeto adotou a norma americana Astho, utilizada mundialmente na elaboração de projetos desta natureza, para projetar os vãos principal e secundários, locais de passagens do tráfego marítimo de grande porte.
"Os vãos foram projetados levando em consideração o tráfego marítimo esperado para os próximos 50 anos, considerando os maiores navios do mundo, inclusive aqueles sem histórico de tráfego na Baía de Todos os Santos”, esclareceu.
O trecho 3, por sua vez, conta com a construção de acessos viários na Ilha de Itaparica, com um sistema de aproximadamente 30 quilômetros de extensão. Uma nova rodovia com viadutos incorporados em três interseções ligará a chegada da Ponte Salvador–Itaparica até a interseção com a BA-001.
Já o trecho 4 compreende a recuperação e a ampliação de um trecho da BA-001, nas proximidades de Cacha Prego até a Cabeceira da Ponte do Funil. Após um estudo de demanda de tráfego nos próximos 30 anos, a ponte contará com três pistas por sentido. A terceira funcionará, inicialmente, como acostamento. De acordo com o estudo, duas faixas serão suficientes para atender à demanda prevista para os primeiros anos.
“A ponte contará ainda com uma barreira móvel que dividirá os sentidos do trânsito e poderá ser deslocada conforme for a demanda, especialmente em feriados e datas comemorativas. Está previsto um fluxo de 28 mil veículos por dia no primeiro ano de operação, sem restrições para nenhum tipo de veículo”, explicou o consórcio.
O impacto da ponte na economia baiana
O Sistema Rodoviário Ponte Salvador-Itaparica será um novo vetor de distribuição de renda e impulsionará a economia de toda a Bahia, com geração de sete mil empregos. A previsão é que dez milhões de baianos serão contemplados em cerca de 250 municípios.
Esse grande investimento fomentará o desenvolvimento econômico da região a partir da atração de novos empreendimentos em áreas como logística, indústria, comércio, serviços e mercado imobiliário.
A aposta do governo do estado é que o novo sistema irá impulsionar o turismo na Bahia de maneira sustentável, tendo em vista que a distância entre Salvador e importantes zonas turísticas no Sul e no Baixo Sul do estado serão reduzidas em mais de 100 quilômetros.
Além da ponte, serão construídos novos acessos viários em Salvador e Vera Cruz. Na capital, serão quatro quilômetros de uma nova estrutura entre a região da Calçada e Água de Meninos, composta por um conjunto de viadutos e dois novos túneis que ficarão paralelos aos da Via Expressa.
Em Vera Cruz, o fluxo de veículos oriundos da ponte será direcionado para uma nova via expressa com 22 quilômetros, que será construída na região de Mar Grande e seguirá até as proximidades de Cacha Pregos. Por fim, será duplicado um trecho de 8 quilômetros da BA-001, desde Cacha Pregos até o início da Ponte do Funil, onde finaliza a área de atuação da Concessionária.
Enquanto a ponte Salvador-Itaparica não é construída, quem mantém o título de maior ponte brasileira sobre lâmina d´água é a ponte Rio-Niterói, que liga os dois municípios no estado do Rio de Janeiro. Essa estrutura tem 13,2 quilômetros de extensão, incluindo um trecho sobre terra firme e 8,8 quilômetros em cima da água.
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