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A animação Carros, que estréia hoje em todo o Brasil, comprova a vocação da produtora Pixar para o entretenimento tecnicamente avançado e moralmente conservador. Dirigido pelo vice-presidente da empresa, John Lesseter, também responsável por Toy Story, o filme é aquilo que se espera do cinema americano: um contar de história fechado, bem acabado e edificante. Qualidades similares foram vistas em produções anteriores da companhia, embora faltem a Carros coadjuvantes interessantes, como foi a estilista neurótica Edna em Os Incríveis ou a desmemoriada Dory em Procurando Nemo. Ao contrário do que o título pode indicar, a trama é uma velha história sobre os contrastes entre o campo e a cidade, curiosamente representados por carros.

O personagem principal é Relâmpago McQueen, um jovem e talentoso carro que disputa o título do circuito Nascar com mais dois veículos, um esportivo veterano e um sedan arrogante e desonesto. McQueen acredita que a vida se resume à fama e à tietagem de conversíveis bonitinhas até que um acidente com um caminhão transportador muda seu destino.

Rota 66

Perdido pelo interior dos Estados Unidos, o inexperiente carro de corrida se perde na famosa rota 66 até parar em Radiator Springs, uma cidade que vive no passado. Para um veículo urbano e hi-tech, Radiator é um antro de vulgaridade e subdesenvolvimento. É povoada por uma kombi, símbolo hippie nos Estados Unidos, nutrida por um "combustível de mistura orgânica", que tem em um jipe sua contrapartida militar e disciplinadora.

Também estão presentes uma caminhonete caipira, um carro turbinado, um cinquecento topolino, carro popular da itália nos anos 60 (que pode ser visto em Noites de Cabíria, de Fellini). A figura paterna está em Doc Hudson, um velho veterano dos circuitos assombrado por traumas, dublado na versão americana por Paul Newman, hoje com 81 anos, mas ainda aficionado de corridas automobilísticas. A dupla amorosa será formada com uma bela e sexy carroceria de um Porche 911, que largou a cidade para recuperar a decadente Radiator Springs.

Como manda o gênero, a rejeição inicial irá transformar-se em afeto. Os veículos são completamente humanizados, com direitos a bocas, sorrisos, expressões, o que não deixa de ser estranho e interessante ao mesmo tempo, por se apropriar de uma cultura tão disseminada que é o culto por carros. Como um conto moral que contrapõe o campo e a cidade, o velho e o novo, o intuitivo e o racional, o improvisado e o planejado, a história é previsível e bem conduzida.

Não há, porém, sacadas interessantes como a família desajustada por não poder exercer seus superpoderes, vista na primeira metade de Os Incríveis. GGG1/2

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