• Carregando...
Michel Houellebecq: vencedor do prêmio Goncourt de melhor romance em 2010 | Divulgação
Michel Houellebecq: vencedor do prêmio Goncourt de melhor romance em 2010| Foto: Divulgação
 |

Serviço

O Mapa e o Território

Michel Houellebecq. Tradução de André Telles. Record, 400 págs., R$ 49,90. Romance.

Quem começar a ler o novo romance de Michel Houellebecq, O Mapa e o Território, e se estender na leitura por boas páginas vai, eventualmente, se indagar porque o escritor francês, depois de ficar cinco anos sem publicar um romance, inicia a saga do fotógrafo e pintor Jed Martin falando do agonizante boiler de seu apartamento. A referência realmente não faz tanto sentido até percebermos aquele que é um dos focos principais do autor: a ruína do artista, vítima da própria arte.

Seguindo o estilo inconfundível do autor, que separa bem a construção do passado dos personagens, longas descrições e narrativa presente propriamente dita, O Mapa e o Território conta como Martin, outrora um promissor pintor de retratos, que abandona a carreira para fotografar mapas Michelin da França, na aclamada exposição O Mapa É Mais Interessante do Que o Território. Apesar do sucesso, Martin, num arroubo de loucura, queima todo o seu trabalho e resolve começar do zero – como responde o que é ser artista em entrevistas: "antes de tudo é ser alguém submisso. Submisso a mensagens misteriosas, imprevisíveis, (...) que nem por isso deixam de governar de maneira imperiosa (...) Essas mensagens podiam implicar a destruição de uma obra, até mesmo de um conjunto inteiro de obras, para enveredar numa direção radicalmente nova (...) ou até sem nenhuma direção." É quando volta a fazer retratos expressivos de "profissões simples", pintando professores, empresários e um escritor – nada menos que o autor do romance, Michel Houellebecq.

Jed Martin e Houellebecq passam a se relacionar. Compartilhando as mesmas visões sobre arte (aliás, essa é uma constante nos livros do escritor: não há divergência de opiniões), Houellebecq consegue, pelo menos ficcionalmente, algo próximo de um amigo — provavelmente uma brisa de ar fresco para um dos escritores mais odiados da França, acusado, não sem razão, de misoginia, racismo e um toque de antissemitismo. Munido de uma desfaçatez sem paralelos na literatura, o autor faz rir ao tratar de si próprio, ao mesmo tempo tão cheio de si e tão claramente decrépito e decadente. Um fator positivo que contribui para o entretenimento proporcionado pelo livro.

É aí que as coisas começam a degringolar – afinal, nenhum livro de Houellebecq é feliz do começo ao fim. A exposição de Martin em que consta o retrato do escritor acaba se tornando um sucesso de crítica, e seus quadros passam a valer milhões de euros. O pintor então se vê sem outra saída a não ser aceitar ser tragado pelo próprio sucesso e estagnar-se criativamente até um acontecimento surpreendente, decorrente de sua fama, mudar sua vida por completo. E é aí que, em dado momento do livro, o leitor se depara com Jed Martin conversando com seu boiler velho, no ápice de sua isolação artística e percebe que, de certa forma, o sucesso e a unanimidade artística equivale quase instantaneamente à sua morte.

O Mapa e O Território guarda diversas semelhanças com outros livros de Houellebecq: a busca pela figura materna, como em Partículas Elementares, o sucesso profissional que equivale à ruína pessoal, como em Plataforma e A Possibilidade de Uma Ilha e uma crítica à sociedade de consumo, ao mercado da arte e à comunidade europeia. Contudo, a idade parece ter amolecido a fúria do autor, que já não é mais tão contundente e ácido quanto antes, e aposta muito mais em um humor triste para o sucesso de seu romance. Talvez tenha sido essa a razão de, pela primeira vez, ele ter conquistado um prêmio Goncourt. GGGG

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]