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Inédita no Brasil, Samanta Schweblin é a nova revelação da literatura argentina | Divulgação
Inédita no Brasil, Samanta Schweblin é a nova revelação da literatura argentina| Foto: Divulgação

Vencedora do prêmio Casa de las Américas de 2008 por Pájaros en la Boca, seu segundo livro de contos, Samanta Schweblin é uma das vozes mais originais do gênero literário curto em seu país. Em seus relatos, estranhos e perturbadores como um filme de David Lynch, é possível encontrar resquícios da obra do escritor Julio Cortázar, em que o insólito emerge das situações mais corriqueiras sem sobreaviso – em um famoso conto do livro Bestiário, de Cortázar, um homem vomita coelhinhos brancos sem qualquer cerimônia, enquanto o conto-título de Pájaros en la Boca mostra uma criança que tem o estranho hábito de se alimentar com pássaros vivos.

Você é considerada a grande contista da sua geração na Argentina, mas continua inédita no Brasil. Acha que existe um paradoxo de proximidade e distância entre nossos países?

Com certeza, e é uma pena. Mas a literatura está ocupando um bom espaço na internet, o que acelera nossas leituras (porque pula o mercado editorial), ultrapassa barreiras territoriais e barateia custos. Arriscaria dizer que somos menos argentinos, menos uruguaios ou chilenos, e cada vez mais latino-americanos. Mas, com o Brasil, temos ainda uma barreira de idioma. Não falo português, e hoje tenho mais chances de ler e discutir com um escritor espanhol do que com um brasileiro.

O que acha do rótulo Nueva Narrativa Argentina (NNA)?

Rótulos sempre incomodam, porque unificam e apagam as diferenças, que é o que temos de mais rico. Mas reconheço que, graças a ele, vozes que até então passavam despercebidas começaram a se tornar conhecidas. A antologia de contos que batizou grupo (La Joven Guardia: Nueva Literatura Argentina) foi reeditada recentemente na Espanha e muitas editoras e agentes literários se voltaram à suposta NNA por causa disso. Não somos um grupo nem um movimento genuíno porque não há nenhuma diretriz estética, temática ou política que nos una, é apenas uma questão de geração.

Você estudou Cinema na Uni­versidade de Buenos Aires. Até que ponto seu trabalho é in­­fluenciado pela linguagem cinematográfica?

Durante cinco anos, vi uma média de 20 filmes por semana. Aprendi muito mais sobre como contar uma história escrevendo roteiros e trabalhando noites inteiras na sala de montagem do que se tivesse estudado uma carreira teórica, como literatura. Proponho uma correção estilística àquela famosa frase: "uma imagem diz mais rápido que mil palavras". Isso não é melhor nem pior, mas em uma geração que é bem mais visual do que as anteriores, surgem novas ferramentas e necessidades narrativas.

Já disseram que Pájaros en la Boca remete a Julio Cortázar. Quais são suas influências?

Que me cataloguem como herdeira da geração de Borges, Bioy Casa­­res e Cortázar me agrada por um lado, porque eles foram meus mestres – especialmente Casares e Antonio di Benedetto. Mas também pesa sobre mim essa ideia de "continuadora da literatura fantástica argentina", quando realmente não sinto tanta presença do fantástico nos meus trabalhos.

O fantástico foi muito popular na literatura argentina dos anos 1960. A produção atual está mais realista do que alegórica?

Fico surpresa ao descobrir que certos traços fantásticos vão se perdendo de geração a geração: ficções que na realidade de hoje já não funcionam como fantásticas, ou funcionam de outro modo. Segundo Ítalo Calvino, o fantástico do século 19 era um produto refinado do espírito romântico; já o fantástico do século 20 era mais intelectual, como um jogo. Acho que, agora, o interessante está nesse limite que cada vez mais se aproxima de nós. Na literatura atual, ou pelo menos na que me interessa, há uma fronteira do verossímil que já não pode ser cruzada, e isso está longe de ser uma desvantagem, porque torna tudo muito mais interessante. Na trama de "Perdiendo Velocidad" (conto de Pájaros en la Boca que pode ser lido no site da autora), a morte chega quando a pessoa deixa de fazer bem aquilo que ela melhor sabe fazer, embora não haja uma presença física da morte nem um dado real que a justifique (como teria num relato fantástico do século 19). A resolução de um conto é o que fará dele fantástico ou realista e, paradoxalmente, ela está apenas na cabeça do leitor.

Entre El Núcleo del Disturbio (2001) e Pájaros en la Boca (2008), o que mudou em sua literatura?

O primeiro foi um livro de estreia que escrevi entre 19 e 21 anos, portanto, vejo-o mais como uma espécie de "palheta de cores". Talvez Pájaros seja muito mais sólido, consistente e unificado, por seus climas e conflitos. Mas ambos têm semelhanças. Há uma linha de tensão e de temas que continua e que continuará inclusive no livro de contos que estou escrevendo agora. (MS)

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