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Apesar de odiar posar para fotografias, Silveira mostra os três livros de sua autoria e outro que traz capítulo dedicado a ele | Antônio Costa/Gazeta do Povo
Apesar de odiar posar para fotografias, Silveira mostra os três livros de sua autoria e outro que traz capítulo dedicado a ele| Foto: Antônio Costa/Gazeta do Povo

Lançamento

Capoeira, a Luta que Venceu

Gideoni Silveira. Rede Esperança (R. Nicácio Riquelme, 192 – Capão da Imbuia), (41) 3013-5254. Amanhã, às 14 horas. R$ 40 (com direito a um exemplar do livro).

"Em cinco numa cela, um olhando para a cara do outro... Eu ia para meus cadernos, que apoiava em cima de uma tampa de cadeira de escola, e ficava. Às vezes, varava a noite escrevendo."

Gideoni Silveira, capoeirista e escritor.

Gideoni Silveira – mais conhecido por mestre Silveira– pode ser considerado um escritor "das antigas". Escreve à mão, diretamente em cadernos, e repassa o texto na sua velha máquina de escrever. Quebrou todo o teclado do notebook que ganhou da esposa, substituído por um mais resistente, presente de seu filho, ao escrever sua obra mais recente: Capoeira, a Luta que Venceu, que será lançado amanhã na sede da Rede Esperança. Esse é só um detalhe trivial na trajetória do capoeirista, que passou 16 anos no Sistema Prisional Brasileiro e viu na literatura a saída para ficar distante das conversas que ouvia na cela da Penitenciária Central do Estado, onde cumpriu pena.

"Eu já estava empapuçado daquilo. Aí eu pedi para a Sônia [a esposa] trazer um caderno para mim." As 10 mil cópias do livro foram possíveis pelo apoio de um amigo, que patrocinou a edição. A obra tem prefácio da professora do Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná Liliana Porto e aborda a história e o papel da capoeira no Brasil.

Filho de indígenas, Silveira teve uma infância difícil. Na vida adulta, se envolveu com o crime. Tudo começou quando tocaram em um dos pilares que considera sagrado: a família. Uma das sobrinhas foi violentada aos nove anos de idade por um vizinho. "Segundo o laudo, foram 92 facadas. Eu não ia deixar isso de graça."

Como era menor de idade, não respondeu pelo crime, mas foi preso quando completou 18 anos. Fugiu cinco meses depois com uma quadrilha de assaltantes a banco. "Aí você já pode imaginar o meu destino, né?" Respondeu a 26 assaltos. "Eu não iria voltar para casa. E eu ia dizer para os caras com quem eu fugi que eu era um anjinho?"

Na prisão, antes de começar a escrever, Silveira instituiu o ensino da capoeira. "A coordenadora de ensino olhou para mim e acreditou na minha capacidade. E me deu uma sala para começar as aulas." O resultado? Todos os anos ele faz o que chama de "via sacra", passando em todas as penitenciárias do estado, e tem alunos que saíram da prisão e viraram professores – o próprio Silveira, além de uma academia de capoeira, que montou com a ajuda do sogro, é árbitro da Federação Internacional de Capoeira.

O mestre Silveira escritor surgiu em 1995, depois que os textos viraram o livro A Voz do Silêncio, coletânea de poesias que retratam o sistema carcerário – a obra mais lida na biblioteca da Colônia Penal Agrícola, em Piraquara.

Escrever durante a noite, quando acabavam as atividades da penitenciária era a fuga do capoeirista junto com a leitura: ele conta que leu todos os títulos que existiam na biblioteca da penitenciária, além dos livros do norte-americano Sidney Sheldon. "Não tem como virar escritor sem ser leitor. A leitura abre a mente de gente", acredita.

Casamento

A história entre Silveira e Sônia aliás, renderia um outro livro entre os 15 já escritos por ele, que ainda não foram publicados. Se conheceram jovens, antes de Gideoni ser preso, e estão legalmente casados desde 1992. "Como ele vivia aprontando e tinha uma boa condição financeira, minha família acabou achando que ele era um bom partido (risos). Até que tudo veio à tona e foi uma confusão", conta Sônia, que cursou Direito e virou advogada para auxiliá-lo. "O pai dele, na sua simplicidade, estava vendendo tudo o que tinha para pagar a defesa. Em 1984 comecei o curso e um ano depois consegui um estágio na penitenciária onde ele estava, e comecei os pedidos de redução de pena." Em 1988, Silveira saiu, porém se envolveu em outro delito, logo quando a esposa ficou grávida. Durante a gestação, a família dela proibiu as visitas, e ele conheceu o filho, Diego, aos três meses. "Depois que tivemos nosso filho ele percebeu a situação difícil que eu passava, e viu que era capaz de fazer outra coisa. Aí deu tudo certo." Sônia era sempre a primeira esposa a chegar na PCE nos dias de visita, o que rendia brincadeiras por parte dos agentes." Diziam que eu tinha mais poli position que o Ayrton Senna."

Além de continuar escrevendo – há propostas para que ele retrate os aspectos positivos dentro do sistema penitenciário – Silveira continuará suas palestras país afora, além de proferir sem medo as suas polêmicas ideias sobre política, sistema carcerário e outros mil assuntos. O crime? Passado distante. "Não vejo mais necessidade de fazer o que eu fazia. A pessoa só sai do crime quando tem condições."

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