A fé do povo levada à tela grande

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Em 2005, logo depois que Gil Baroni e Monica Rischbieter criaram a produtora WG7BR, escreveram o roteiro de uma ficção chamada Brasil de Todos os Santos, que os levou a conversar longamente sobre a influência da religião na vida do brasileiro. "É uma gente muito humilde, que passa fome e não se revolta", diz Monica. Das discussões nasceu a ideia de produzir um documentário sobre a relação das pessoas com os santos. "Mas, saindo às ruas, vimos que o importante era a fé que elas têm", diz ela. O resultado é o documentário Brasil Santo – Retratos da Fé,, que será exibido pela primeira vez hoje, às 19 horas, na mostra competitiva de longas-metragens do 4º Festival do Paraná de Cinema Brasileiro Latino. A dupla finalizou o filme, viabilizado pela Lei Rouanet e patrocinado pela Petrobras, em dezembro do ano passado, após um ano de montagem, que teve a participação de cinco pessoas: os próprios diretores, Guilherme Paciornik, Fernando Severo e Nelson Settanni. A força-tarefa tornou possível transformar mais de 200 horas de material em um filme com uma versão de 70 minutos para cinema e 56 minutos para tevê.

Com uma equipe de nove pessoas, Monica e Gil partiram para uma viagem pelos interiores do Paraná, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo, em busca de histórias de vida que envolvessem religiosidade. "Não nos interessava perguntar qual a religião da pessoas", diz Monica. Os cerca de cem personagens que participam do filme são, em sua maioria, católicos, mas há também uma mãe-de-santo, espíritas e evangélicos, entre outras religiões.

Já na primeira entrevista, o filme tomou um rumo novo. "A gente saiu de Curitiba e encontrou a Dona Erna (dos Santos, de Turvo), em uma casinha linda à beira da estrada. Ela começou a contar a vida dela e vimos que, a partir dali, encontraríamos gente que tem uma prática da fé muito grande", diz a diretora.

Com todas as história emocionantes em mãos, ela e Gil selecionaram sete ou oito como âncoras do documentário que usa o mote dos santos como desculpa para falar da vida, da fé e da cultura de um povo humilde, enquanto a fotografia, de Beto Carminatti, revela o interior das casas, as cidadezinhas e as paisagens brasileiras.

"A gente perguntava qual o sonho dessa gente: 80% das pessoas diziam que era ter casa própria. Perguntávamos o que achavam de ser brasileiros: todos adoravam, tinham orgulho. Eram todos muito felizes", diz Monica, lembrando da história de um casal recém-casado que foi entrevistado, ela com 30 e ele 70. "Ele tirou ela da rua, deu-lhe uma casa."

Ao conhecer estas pessoas, Monica e Gil perceberam que a religiosidade está no cerne do seu modo de encarar a vida. "Eles acham que seu destino é a vontade de Deus, então, aceitam. É claro que há muito de omissão, por que um povo tão injustiçado não se revolta? Mas essas pessoas aceitam porque ‘se não, você sofre duas ve­­zes’", diz a diretora, citando uma frase de um dos entrevistados.

Personagens de todas as idades contam suas histórias de inúmeros sofrimentos, mas Monica diz que buscou, principalmente, idosos pela sua sabedoria. "É uma variedade de pessoas que se complementam, dá pra ter uma ideia do que é o brasileiro. Mas as pessoas mais velhas têm a prática do exercício da fé mais desenvolvida", conta.

Ao pé de cada entrevista, um desenho ilustra o santo de devoção do entrevistado. A campeã absoluta é Nossa Senhora e, em segundo lugar, Seu Jorge. Mas também há Santo Antonio, São Francisco, Santo Espedito.., e por aí vai. "É um caminho para Deus, que está ocupado e não pode falar, então, se fala com o santo", diz Monica. A impagável dona Erna não tinha relação com nenhum santo, "só a Santa Ceia", pendurada na parede da sala. "Deixamos fluir, as pessoas estão muito autênticas e não se assustaram com uma equipe de nove pessoas, com equipamentos de luz, som, rebatedores." A trilha sonora, de Jean Gabriell, "superbrasileira", conta Monica, foi feita em parceria com músicos da Orquestra Sinfônica do Paraná.

Serviço: Brasil Santo – Retratos da Fé, de Gil Baroni e Monica Rischbieter. Hoje, às 19 horas, no Auditório Poty Lazarotto do Museu Oscar Niemeyer (R. Mal. Hermes, 999).