No ano de 1846, o médico francês Jean-Maurice Faivre (1795 -1858), que já vivia no Brasil imperial há vinte anos, vendeu todas suas posses e usou os 20 contos de réis que juntou para viajar à França.
O objetivo era convocar seus compatriotas para com ele vir ao Brasil e construir uma “nova sociedade”.
Surpreendentemente Dr. Faivre conseguiu convencer 63 franceses a atravessarem o Atlântico até o porto de Antonina, no Paraná.
Durante dois meses, esse mesmo grupo caminhou até uma região do sertão do Paraná, às margens do Rio Ivaí (área onde ficam as atuais cidades de Prudentópolis e Cândido de Abreu), e ali fundou a Colônia Thereza.
A vila era uma experiência de vida comunitária inspirada nos ideais socialistas utópicos de Charles Fourier (1772-1837), que pregava o malefício do uso do dinheiro e a degeneração moral que ele causava, e em seu lugar propunha uma forma de trabalho cooperativo.
O Retrato no Entardecer de Agosto
Luiz Manfredini
Editora Ipê Amarelo
Romance
134 páginas
R$ 35
A saga da utopia de Faivre, do começo ao fim, está contada no romance “Retrato no Entardecer de Agosto”, do jornalista Luiz Manfredini.
O livro usa a ficção para contar a história que o autor pesquisa há quase trinta anos, desde 1988.
O sonho de Faivre
“Escrevo sobre fatos que efetivamente aconteceram, mas eu criei personagens que os investigassem e refletissem sobre eles. A ficção não te limita como o jornalismo, o ensaio ou a biografia”.
No livro, Manfredini mostra tanto a formação da ideia da colônia, quanto o cotidiano de seus habitantes.
O território foi transformado num “falanstério”, conceito criado pelo fourierismo para definir a comunitária campestre, norteada por princípios socialistas como a propriedade coletiva dos meios de produção e regras comportamentais.
63 franceses
compraram ideia do médico Jean Maurice Faivre de criar uma comunidade baseada no socialismo utópico nos Campos Gerais do Paraná em 1847.
A maior parte deles desistiu no primeiros anos, assustada com a dureza da vida campestre e ataques dos índios botocudos.
A narrativa é centrada em Faivre, que veio ao Brasil para atuar no Hospital Militar da Corte, e logo se tornou o médico de confiança da imperatriz Leopoldina, esposa de Dom Pedro I. Faivre fez o parto da princesa Thereza Cristina (depois usou o nome dela para batizar sua utopia).
Manfredini estudou as cartas pessoais do médico, o regulamento que ele criou para a colônia e textos com os ideários que o moveram até sua morte em 1858, aos 63 anos de idade.
“Faivre era um homem de seu tempo em um momento de grande crise na Europa, quando a busca por alternativas se impunha. Pessoalmente, era um sujeito muito generoso, que abriu mão de tudo por este sonho de uma sociedade mais justa”.
Ao contrário do que informamos anteriormente, a imperatriz Leopoldina (1797- 1826) era esposa do imperador Dom Pedro I, e não de seu filho Dom Pedro II.
Colônia aboliu escravidão antes da Lei Áurea
Experiência comunitária foi pioneira do cooperativismo, mas falhou ao tentar impor modelo de “sociedade perfeita”
- Sandro Moser
Quatro décadas antes da Lei Áurea ser publicada, em 1888, o “Dr. Faivre” conseguiu que a escravidão não vigorasse dentro da Colônia Thereza.
A vila foi também o primeiro modelo de cooperativismo agrícola.
Faivre era o líder político e criou regras sociais e para o uso da terra. A ideia era criar um modelo de sociedade que fosse depois exportada para outras regiões do Brasil.
“Os moradores usavam uniformes, um avental que era abotoado nas costas para que ninguém conseguisse se vestir sem a ajuda de outro”, afirma Manfredini.
A maior parte dos franceses, porém, não se adaptou à vida no campo e ao cerco dos índios botocudos da região, que hostilizavam a colônia .
“Por mais generosos que fossem os ideais, os colonos idealizaram um tipo de sociedade que lhes parecia justa e tentavam enquadrar os outros dentro daquela forma. Como não era uma construção histórica, sempre chegava um ponto em a ideia não se sustentava.”
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