O comerciante judeu polonês radicado em Curitiba David Lorber Rolnik viveu o terror da Segunda Guerra Mundial dos dois lados. Aos 19 anos, sobreviveu a uma "marcha da morte" realizada pelas tropas nazistas em sua cidade natal, Chelm, de onde foi conduzido sob a mira das metralhadoras até a fronteira com a Ucrânia. Do país soviético foi para a Rússia, obrigado a trabalhar nos gulags siberianos (campos de trabalho forçado) sob condições adversas até conseguir voltar para seu país de origem no pós-guerra, e emigrar de vez para o Brasil, em 1953. "Vivi o inferno e não sei como escapei", relatou tempos depois. Passou por tantos perigos de morte que podia-se dizer que tinha catorze vidas a última, expirada em 2008, enquanto lutava contra uma pneumonia aos 88 anos.
A vida e a saga tortuosa de David Rolnik foram relatadas na forma de livro por dois de seus filhos, os jornalistas Szyja e Blima Lorber. As Catorze Vidas de David O Menino Que Tinha Nome de Rei, que será lançado no próximo dia 9 de agosto, às 19 horas, na Livraria Cultura, é o resultado de pesquisas e, obviamente, da própria convivência com o pai. "Durante todos os anos em que vivemos juntos, sempre pesquisei a história da nossa família em museus e arquivos diversos, que ele me ajudava a ler, em polonês e alemão, e tentei montar as peças do quebra-cabeça que foi a história dele", conta Blima, que viajou com o David para Chelm, no interior da Polônia, para reconstituir a memória da cidade.
Um dos únicos sobreviventes do holocausto em Curitiba, David também contou sua história para o cineasta Steven Spielberg, responsável pelo Museu Visual do Holocausto. "Esse depoimento foi essencial para nós, para dar um fio condutor para nossas pesquisas", afirma Szyja, diretor do jornal curitibano Visão Judaica. Ele completa que a história da Segunda Guerra Mundial relativa à Polônia e à Rússia passa ao largo da saga de David, explicando os mecanismos que levaram os judeus a sofrer nas mãos tanto de Hitler quanto de Stalin. "A nossa pesquisa também passou pela história de como meu pai encontrou minha mãe. Eles se conheciam desde criança, mas foram separados no período em que estavam na Rússia, e só depois, quando a guerra já tinha acabado, se reencontraram no processo de redocumentação na Polônia e se casaram", conta.
As Catorze Vidas de David O Menino Que Tinha Nome de Rei tem apresentação da jornalista espanhola Pilar Rahola e prefácio da professora Maria Luiza Tucci Carneiro, coordenadora do Arquivo Virtual sobre Holocausto e Antissemitismo da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de Saõ Paulo (USP). Para Blima, a obra valida-se pela mensagem. "Os homens precisam saber que a intolerância e o preconceito podem causar males que a gente jamais imagina, e impedir que coisas como essa voltem a acontecer. O mundo não pode esquecer", acredita.