Faixa a faixa
Zélia Duncan comenta cada uma das canções do disco. Leia abaixo:
"Tua Boca"
"Sempre achei a letra incrível e adoro a levada que o Kassin inventou, porque é totalmente "Califórnia", uma delícia de ouvir."
"Cabelo Duro"
"Do disco genial de Itamar com Naná Vasconcellos, Isso Vai Dar Repercussão (2004), que é um disco muito importante para mim, que fui convidada para fazer o lançamento póstumo."
"Isso Não Vai Ficar Assim"
"Está no Sampa Midnight (1986), um disco ao vivo emblemático, bem cabeção. E ficou muito solar. Você sente Ney Matogrosso cantando muito feliz."
"Mal Menor"
"Acho a gravação uma porrada. Está tão linda que parece do Roberto Carlos não fosse a letra tão rascante."
"A Gruta da Solidão"
"É inédita. Como Cabelo Duro, fala muito intimamente dele, como uma apresentação."
"Tudo Esclarecido"
"É uma das faixas mais emblemáticas da qualidade dele de compor como baixista. É inédita, mas o baixo é criação do Itamar."
"Quem Mandou"
"Assim como Não É Por Aí, tem uma comunicação muito imediata. E é muito a minha cara tanto que toco violão nelas."
"Noite Torta"
"Foi gravada originalmente por Tetê Espíndola, em uma versão alegre. Botamos a música onde a letra, muito densa, sugere."
"Enquanto Penso Nela"
"Uma das vinhetas. Tem uma letra muito visual. Vejo o Itamar nela com um estandarte, como se fosse alguém empunhando trabalho de maneira original."
"Vê Se Me Esquece"
"É muito feminina. A letra é da Alice. Itamar tinha uma ligação imensa com as mulheres. Ele dá voz a um lado feminino muito interessante."
"É de Estarrecer"
"Itamar usando um samba para uma letra tão inteligente da Alice fica mais divertido ainda. E Martinho da Vila cantando em inglês ficou muito carismático. Ele veio na maior alegria, cantando daquele jeito dele, rindo, como se fosse um samba já conhecido."
"Zélia Mãe Joana"
"Quando Itamar me mostrou, levei o maior susto. Ela fecha o álbum, porque é meio que uma proteção. É uma brincadeira em que ele me protege, fingindo que sou uma feiticeira."
Tudo Esclarecido homenageia Itamar Assumpção (1949-2003) com um contraponto reverente: em oposição ao preto de PretoBrás (1998), o novo disco de Zélia Duncan, inteiramente dedicado ao repertório do músico paulista, mas criado em Arapongas, no Norte do Paraná, tem a capa branca.
Não é à toa. A cantora vem gravando canções de Itamar desde 1996, tentando mostrar que o hermetismo e a densidade comumente vinculados ao compositor da Vanguarda Paulista não dão conta de sua faceta pop.
"Ele ficou com esse rótulo. Mas dizer que isso define toda a obra dele é pouco", diz Zélia Duncan, em entrevista por telefone para a Gazeta do Povo. "As 11 músicas dele que gravei antes desse disco já vinham mostrando que elas são coisas palatáveis, para a gente consumir, no melhor sentido."
Daí o branco: Zélia e a diretora de arte do CD, Simone Mina, querem Itamar à luz do dia "solar".
"Não um Itamar bobo ou superficial, porque isso seria impossível. Mas um Itamar que está ali ao nosso lado, para a gente ouvir. Não precisa ser cabeção da USP para ouvi-lo", explica a cantora. "Você pode ouvi-lo indo para a praia."
Gravação
Esta foi a orientação de Zélia ao produtor e baixista Kassin, contratado por sugestão de Marcelo Jeneci outro dos músicos responsáveis pelo resultado palatável do disco, que traz seis parcerias inéditas de Itamar com Alice Ruiz e participações especiais de Ney Matogrosso e Martinho da Vila.
Completam a banda Christiaan Oyens, Pedro Sá, Thiago Silva e Stephane Sanjuan. "O bacana é que eles são músicos criadores", conta Zélia. "Todo mundo trocou de instrumentos. Teve muita liberdade. E eu estava muito segura do que ia fazer. Então, toquei com eles o dia inteiro. Estava na banda", diz a cantora.
As gravações, feitas ao vivo, em estúdio, duraram em torno de cinco dias entre o fim de maio e o início de junho. "Fluiu de um jeito inacreditável", afirma Zélia. "Fiquei muito feliz com a sonoridade, que ficou com uma cara vintage. Gravar junto também dá uma liga diferente."
Canções
O repertório resultou num leque de ritmos: xote, forró, samba, balada folk. Mas o resultado não foi mais que um reflexo da pluralidade intrínseca a Itamar, já que o único critério para selecionar as faixas do CD foi a vontade de gravá-las, de acordo com Zélia.
"Foi o único pré-requisito. Porque, infelizmente, falar em música inédita do Itamar é quase um pleonasmo, porque quase tudo parece inédito, já que é pouco divulgado. Mas a gente está correndo atrás desse abismo", explica a cantora.
Ney e Martinho, dois artistas deliberadamente convidados por conta de sua popularidade, endossariam esta campanha pela difusão da obra do compositor paulista ele mesmo, um entusiasta do pop, que acabou tendo sua ressonância limitada pela complexidade de sua figura pública, conforme explica Zélia.
"Itamar era muito crítico, tinha um lado revoltado", diz. "Como a gente não tem a história dele, não é ele, a gente consegue se libertar de muitas coisas para chutar mais para o mundo essas canções. Ele ficou muito apegado a um discurso que foi importante para ele. Mas, para mim, o importante é mostrar a sua música."
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