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Música

A subversão dos Racionais MC’s

Considerado o nome mais importante do rap brasileiro, grupo paulistano lança disco depois de 12 anos sem um álbum de inéditas

 | Felipe Lima
(Foto: Felipe Lima)
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O recém-lançado Cores & Valores, sexto disco de estúdio do Racionais MC’s, veio à luz na semana passada já cercado por uma expectativa pesada .

O quarteto paulistano se tornou o mais emblemático grupo de rap brasileiro ao ganhar uma projeção enorme nos anos 1990, se valendo de métodos independentes e músicas com denúncias fortes da desigualdade e do racismo, dotadas de uma lucidez que não apenas elevou os rappers a porta-vozes da juventude pobre e negra brasileira, mas que também foi legitimada e investigada por críticos e acadêmicos.

Depois do álbum Nada Como Um Dia Após O Outro Dia (2002), no entanto, Mano Brown, Ice Blue, Edi Rock e o DJ KL Jay entraram em um hiato de novas criações.

Foram 12 anos em que o grupo se absteve de fazer novos comentários sobre a realidade que havia retratado com tanta contundência desde o fim da década de 1980.

Isso em pleno período de mudanças na arena política e na sociedade brasileira – em especial, nas periferias das grandes cidades que sempre foram o objeto de sua obra.

A curiosidade sobre o que os Racionais teria a dizer depois de tanto tempo ultrapassou os círculos do rap.

A resposta, um disco fugidio, fragmentado e ambíguo, subverte as expectativas por um trabalho mais concreto e de leitura fácil.

Em pouco mais de meia hora, os Racionais, envoltos por uma sonoridade pesada e francamente aberta a tendências mais recentes do rap norte-americano, dão recados em faixas que chegam a ter menos de um minuto (um choque para fãs apegados a narrativas e crônicas de discos anteriores que chegavam a durar em torno de dez minutos). E se permitem dedicar faixas de pegada pop para falar, por exemplo, de amor ("Eu Te Proponho"), citando Gilberto Gil e Cassiano.

Mas essa é a impressão superficial. Acontece que Brown, Blue, Edi Rock e parceiros como Negreta (do também paulistano Rosana Bronks) estão dizendo mais com menos palavras, em sintonia com a urgência dos tempos digitais.

Os temas (e Ice Blue já disse que, apesar da chegada da tevê, do computador e do micro-ondas, a periferia continua sofrendo com os mesmos problemas) seguem orbitando o universo de denúncia do grupo, que ainda fala sobre racismo e desigualdade – "a fábrica que exporta criminalidade" ("Mal e Bem").

Os Racionais seguem provocando, de forma parecida com o não menos legítimo funk ostentação, ao lembrar que os bens de luxo nas vitrines dos shoppings, embora destinados a outro segmento da sociedade, podem ser fortemente desejados pelos moleques "de pé no chão, mal vestidos, sem comer" que os cercam do lado de fora ("Eu Compro"); retratam a mentalidade do crime com uma verossimilhança sempre inquietante ("A Escolha que Eu Fiz"); e denunciam a criminalização do rap e da população pobre ao contar, de seu ponto de vista, o que aconteceu na Virada Cultural de São Paulo em 2007, quando o público de seu show entrou em choque com a polícia na Praça da Sé ("A Praça"). São os mesmos Racionais, 12 anos depois. Mais maduros, talvez.

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