Contista premiado, o escritor Marcelino Freire se aventura em seu primeiro romance, Nossos Ossos, lançado nesta semana, e mostra a evolução de sua prosa poética e musical.
Em um texto mais longo, mas não muito, a ficção de Freire consegue manter o fôlego e o ritmo de seus textos mais curtos.
No ano passado, o autor se entocou em Buenos Aires para finalizar o romance. O argumento da trama é muito interessante.
Um dramaturgo gay, chamado Heleno, resgata no necrotério o corpo de um garoto de programa que costumava visitar. Sua missão passa a ser entregar o cadáver à família, na cidade de Poço do Boi, no sertão de Pernambuco.
Enquanto a missão autoimposta se desenrola, o narrador relembra a sua própria vida de retirante ele mesmo, um menino "lascado" do interior pernambucano, que teve mais sorte e sucesso que seu jovem amigo morto. Segundo o próprio autor, seu texto é um "romance autopornográfico".
A trama, em verdade, serve de base para ilustrar o mergulho na noite e na malandragem paulistanas. Há personagens como um porteiro malandro, bancários viciados, michês, policiais e funcionários do IML, que compõem um retrato sordidamente interessante do submundo paulista, que sempre amanhece bebendo em uma padaria de esquina.
Outro universo que é retratado de forma crua, com um lirismo marginal, é o teatro. Em alguns momentos, o romance rende verdadeiras homenagens à arte de seu protagonista. "O teatro para mim era besteira dalma, eram as brincadeiras vespertinas de criança, a cruz da interpretação, era a lembrança de minha mãe (todas as personagens que eu inventei são ela)", diz em um trecho do livro.
Marcelino Freire brinca e joga com um pouco da própria trajetória, ele também é pernambucano e tem uma história como criador da Balada Literária, evento que reúne escritores, nacionais e internacionais, pelo bairro paulistano Vila Madalena.
Como contista, Freire foi publicado em países como Estados Unidos, México e Argentina e é vencedor do Prêmio Jabuti de 2006 com Contos Negreiros (Record).
Deixe sua opinião