Marin (Bégaudeau) enfrenta o desafio de convencer um grupo eclético de alunos de que vale a pena ler e estudar| Foto: Divulgação

Prêmios

Confira abaixo a trajetória vitoriosa de Entre os Muros da Escola.

- Palma de Ouro (melhor filme) do Festival de Cannes 2008.

- César de melhor roteiro adaptado para Laurent Cantet, Robin Campillo e François Bégaudeau (autor do livro em que o filme se baseia).

- Independent Spirit Awards de melhor filme estrangeiro.

- Indicado ao Oscar 2009 de melhor filme estrangeiro.

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Há algo muito interessante acontecendo no cinema europeu. A produção do continente parece ter se dado conta da importância de se autoanalisar, de discutir suas mazelas. Um indicador foi a última edição do Festival de Cannes. Os jurados, presididos pelo ator e diretor norte-americano Sean Penn (Milk – A Voz da Igualdade), há anos não concedia prêmios tão justos. O desconcertante mosaico sobre a máfia calabresa Gamorra deu ao diretor italiano Matteo Garrone o Grande Prêmio do Júri. Os irmãos belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne tiveram reconhecido o ótimo roteiro de O Silêncio de Lorna, poderoso drama sobre a imigração ilegal. E a Palma de Ouro foi concedida a Entre os Muros da Escola, excepcional longa-metragem do francês Laurent Cantet (de Recursos Humanos), que estreia nesta sexta-feira no Brasil.

Também indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, Entre os Muros da Escola é um achado. Na melhor tradição do neorrealismo italiano, e sobretudo do cinema de seu conterrâneo Robert Bresson (1901-1999), Cantet não recorre a atores profissionais para retratar o dia-a-dia em um colégio público frequentado, principalmente, por filhos de imigrantes das mais diversas parte do mundo. Da China ao Mali, das Antilhas à Tunísia. Professores, funcionários, alunos e até os pais dos estudantes são vividos por eles mesmos, em situações muito similares às do cotidiano da instituição onde têm aulas e trabalham.

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Embora boa parte dos professores se empenhe na missão de ajudar os jovens a superar barreiras como idioma, preconceito racial e os inevitáveis choques culturais, a realidade da escola é crítica. Muitos alunos não se dedicam aos estudos e encaram a obrigação de frequentar o colégio como um fardo e não como uma oportunidade. Além disso, o convívio num ambiente multiétnico é um eterno barril de pólvora, prestes a explodir. E o corpo docente, formado basicamente por franceses brancos, por vezes questiona sua capacidade de penetrar nesse microcosmo tão complexo. É o caso de François Marin (François Bégaudeau), o protagonista de Entre os Muros da Escola.

Professor de Francês dentro e fora da tela, François enfrenta o desafio de convencer um grupo eclético de alunos de que vale a pena ler e estudar. Para isso, recorre em suas aulas às experiências de cada um da turma, na tentativa de aproximar seus integrantes e fazê-los compreender a importância da língua como meio de expressão e de conquista de espaço na socidade. A empreitada é quase impossível. Poucos realmente demonstram interesse e disposição em participar do projeto, às vezes chegando a agredir o professor, que, por sua vez, erra por não compreender que os valores que defende não correspondem, necessariamente, aos de seus pupilos.

Rodado com equipamento digital, o que reforça a urgência da proposta de "cinema da vida real" de Cantet, Entre os Muros da Escola assume um tom quase documental, o que o aproxima de Gamorra e O Silêncio de Lorna. O diretor abre mão de trilha sonora e de recursos narrativos ou técnicos, que poderiam potencializar a dramaticidade da história, mas também roubar-lhe a verdade.

O cineasta e roteirista consegue tirar de Bégaudeau e do elenco jovem desempenhos memoráveis e muito tocantes. E, sequência a sequência, constrói uma obra de enorme relevância e contemporaneidade. Entre os Muros da Escola é obrigatório para quem trabalha com educação e/ou pretende compreender a globalização do lado de dentro. GGGGG