Quem não leu o ótimo romance Uma Vida Interrompida: Memórias de um Anjo Assassinado, de Alice Sebold, vai acabar gostando bem mais de Um Olhar no Paraíso, do que quem teve acesso ao best seller da autora norte-americana. O filme do neozelandês Peter Jackson (de O Senhor dos Anéis) não chega a trair a obra, mas comete um erro quase inevitável: entrega pronta ao espectador uma trama que o leitor, na prosa criativa da escritora, tem a chance de imaginar em sua própria cabeça.
O livro é narrado em primeira pessoa por Susie Salmon (no filme vivida pela promissora Saoirse Ronan, de Desejo e Reparação), uma adolescente estuprada e assassinada em 1973 que, mesmo depois de morta, vê a família, os amigos e até mesmo seu assassino seguindo com suas vidas. Assiste tudo como a um filme. Detalhe: o crime, cometido por um vizinho, não foi desvendado, pois o corpo de Susie nunca é encontrado.
Se, no romance, compartilhamos com Susie um ponto de vista muito particular (e privilegiado), que nos coloca a par de tudo que ocorre através dos olhos da protagonista, o filme encurta demais esse caminho. Oferece tudo muito pronto, da trama, que acaba perdendo em detalhes e sutilezas, se tornando mais maniqueísta do que no livro, à visão do paraíso. Esse céu, de onde a menina vê tudo sem poder de interferência, é representado como uma explosão de cores e de efeitos especiais que se torna cansativa aos olhos.
Entre os deslizes cometidos por Jackson na adaptação, outro que compromete a apreensão da história é a simplificação das consequências do desaparecimento de Susie na vida dos seus pais, vividos por Mark Wahlberg (de Os Infiltrados) e Rachel Weisz (vencedora do Oscar por O Jardineiro Fiel). No romance, a relação entre eles vai desmoronando pouco a pouco, em um processo que causa imensa angústia em Susie e no leitor, já que compartilhamos da mesma perspectiva. No filme, esse conflito é simplificado ao ponto de duvidarmos do que os personagens estão de fato sentindo.
Ótimos mesmo são os desempenho de Saoirse Ronan, como Susie, e, sobretudo, de Stanley Tucci (de Julie & Julia), indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante por sua atuação no papel do vizinho psicopata dos Salmon. Ele, sim, está à altura da obra desconcertante de Alice Sebold. GG1/2
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