Avô herói| Foto: Reprodução Rede Globo

Pecados Íntimos é um grande filme. Mas perturba, incomoda e faz pensar. Tenha isso em mente antes de sair de casa para assisti-lo. Não é cinema-espetáculo, tampouco entretenimento leve, sem compromisso. Feitos esses avisos, vamos à crítica.

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Baseado no best seller americano Criancinhas, de Tom Perrotta, Pecados Íntimos tem parentesco com dois outros longas-metragens dos anos 90: Beleza Americana, de Sam Mendes, e Felicidade, de Todd Solondz. Em comum com esses filmes, o olhar crítico, quase cruel, em direção à vida suburbana nos Estados Unidos, onde segredos e mentiras se escondem em lares aparentemente felizes que parecem saídos de um comercial de margarina.

Mais realista do que o oscarizado trabalho de estréia de Sam Mendes e menos cáustico e mais humano do que a contrapartida de Solondz, o brilhante filme de Todd Field tem início em um playground, onde um grupo de mães fala de suas vidas, frustrações e desejos, enquanto seus rebentos brincam, alheios a tudo. Uma dessas donas de casa, porém, destoa do restante: Sarah (Kate Winslet, indicada ao Oscar de melhor atriz por sua atuação), uma doutoranda em Literatura Inglesa que parece desconfortável diante da possibilidade de ser confundida com aquelas mulheres fúteis e vazias.

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Também freqüenta o tal parquinho, sempre acompanhado do filho, um cidadão chamado Brad (Patrick Wilson, de O Fantasma da Ópera), que rapidamente se torna objeto de desejo da mulherada. Bonito, alto e atlético, ele é apelidado de "rei do baile de formatura" por suas fãs, que não ousam dirigir-lhe a palavra. Sarah, provocada pelas outras com uma aposta, resolve abordar o rapaz, um bacharel de Direito que há anos tenta passar no Exame da Ordem sem sucesso. Casado com uma bem-sucedida documentarista (Jennifer Connelly), cabe a ele o papel de "senhor do lar", encarregado de cuidar da casa e do filho.

Frustrados com a imobilidade de suas existências, Sarah e Brad acabam se envolvendo em um romance extraconjugal tórrido e clandestino.

Paralelamente a tudo isso, a pequena comunidade onde vivem passa por um momento singular, com a libertação de Ronnie (Jackie Earle Haley), um pedófilo que esteve sob tratamento psiquiátrico depois de expor seus genitais para uma criança. Em pânico, a vizinhança reage com hostilidade à presença do infrator.

Field, diretor do consagrado Entre Quatro Paredes, demonstra ter amadurecido ainda mais como autor em Pecados Íntimos. Confirma seu talento ímpar na condução da narrativa, muito fluida e sem costuras visíveis, e no comando do elenco, muito afiado, sobretudo Kate Winslet e Jackie Earle Haley. O ponto alto do filme, contudo, é mesmo a forma como o brilhante roteiro, assinado pelo cineasta e pelo autor do livro, constrói, sem pressa, os personagens, todos falhos, complexos e fascinantes. No desfecho da trama, quando os destinos de Sarah, Brad e Ronnie se entrecruzam tragicamente, fica claro que as tais criancinhas do título original em inglês do filme (Little Children) são os adultos e não seus filhos. Um soco no estômago, enfim. GGGG