| Foto: Miguel Nicolau/Especial para a Gazeta do Povo

Se tem uma coisa que conhecemos nesta temporada em Portugal foi igreja. Há anos penso em escrever um romance policial com o título: “O homem que visitava igrejas”. Se este é um vício velho, aqui me superei. A família já me olha torto quando paro diante de uma capela e de um prédio imponente. Sabem que vou tentar entrar ou no mínimo perder uns minutos olhando detalhes da fachada.

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Braga é a cidade mais religiosa do país e tem um conjunto monumental de igrejas e capelas barrocas. É daqui o famoso arquiteto do período, com obras pelo Norte de Portugal: André Soares (1720-1769), considerado um dos mestres europeus do rococó. Então, ando pela cidade em estado de deslumbramento, namorando os prédios deste arquiteto e de outros, como Carlos Amarante (1748-1815).

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Não contei as igrejas visitadas em várias cidades, mas foram bem uma centena. Em algumas estive várias vezes, revendo sempre os mesmos elementos. E como ando a pé por ruas periféricas, descubro capelas particulares coladas às casas, incrustadas em paredões residenciais. Virou um jogo mental achar estes lugares de devoção incorporados à área habitada.

E há também cruzeiros e altares espalhados pelas cidades e pelas estradas. De repente, sob um sol feroz, uma pessoa se persigna diante de uma parede, de um muro, onde há flores e velas acesas. Comecei então a reparar à distância em umas microcapelinhas, com uma imagem mais ou menos na altura de nosso rosto. A maioria com grades ou eventualmente com vidros para proteger a imagem gravada em azulejo ou a pequena escultura.

Foi lendo uma informação turística na ponte medieval de Vilela, em Arcos de Valdevez, que descobri esta particularidade da cultura religiosa local. As minúsculas capelas pertencem a uma tradição da Idade Média e são conhecidas como Alminhas, só sendo encontradas em Portugal. Nesta ponte, há uma Alminha de Santa Luzia, mencionada em documentos desde 1258.

Depois disso, comecei a prestar mais atenção nestas recorrências.

Elas são dedicadas às almas do Purgatório e estão sob a proteção de um santo e mesmo de alguma figura civil. Fazem parte da tradição popular e eram muito comuns nas pontes, nos cruzamentos, nas esquinas e nos caminhos rurais. Vi várias nos passeios pelas aldeias da região, algumas de construção mais recente. Podem ter um cofre para as oferendas, trazem velas e flores naturais ou artificiais. Há geralmente uma pessoa da região que “trata delas”. Reza-se ali e se fazem ofertas para ajudar as almas que querem deixar o Purgatório. Diz uma inscrição:

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“Oh vós, que ides ­passando,

Lembrai-vos de nós,

Que estamos penando”

No nicho, alminhas com mãos para o alto suplicam oferendas e orações. E o povo não deixa de atender.

No bairro de São Vicente, onde moro, há várias. Uma ao lado da igreja de mesmo nome, embutida no muro. Vamos agora parando nelas, muitas já bastante deterioradas, para ver as pinturas geralmente de natureza naïf, e contemplar estes “templozinhos” humildes, que rivalizam com os prédios monumentais.

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Miguel Sanches Neto tem 35 livros publicados. Ele vive em Braga e escreve a série “Cartas de Portugal” para a Gazeta.