São Paulo (AE) – A primeira conversa aconteceu em março de 1991 e a última, em abril do ano seguinte. Foram, ao todo, 21 encontros de trabalho do jornalista e escritor José Castello com o poeta João Cabral de Melo Neto. Apesar das restrições impostas pela idade (ele estava então com 71 anos), pela saúde frágil e por uma depressão leve, porém contínua, João Cabral rememorou momentos importantes de sua carreira não apenas literária como também diplomática.

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Ao todo, Castello gravou 28 fitas cassetes com conversas, que resultaram no livro João Cabral de Melo Neto: O Homem sem Alma, lançado em 1996 pela editora Rocco e cuja nova edição sai agora pela Bertrand Brasil (272 págs., R$ 39).

Engana-se, porém, quem espera folhear apenas uma edição revista – o livro recém-lançado vem acrescido, além do texto original, de um complemento que Castello intitulou Diário de Tudo.

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Acordo

"Fazia tempo que eu desejava escrever um livro sobre o João e sua poesia", conta Castello. "Só pedi a autorização para gravar nossas conversas e ele, em contrapartida, solicitou que não tratássemos de sua vida pessoal", conta o escritor. "Assim, não só aceitei sua condição como me enchi de pudores, me censurei tanto, que fui levado a tomar outra decisão, de caráter mais sigiloso: a de escrever um diário que contasse os bastidores de nossa conversa "

A decisão tornou-se ainda mais importante quando, durante os longos diálogos, João Cabral, contrariando as próprias regras, pedia para desligar o gravador e, abalado por suas amarguras, revelava desabafos e rompantes. Muitas vezes eram momentos breves, mas carregados de intensidade. "Era apenas a exposição em relance de uma alma", observa Castello.

Até o momento em que tomou a decisão de publicar o diário, fazia dez anos que Castello não relia as próprias anotações. Ao fazer isso agora, percebeu que algumas lembranças se confirmaram. "O que me veio foi a imagem de um homem muito triste, com uma incrível fragilidade pessoal", conta o jornalista.